REVISTA FACTO
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Mar-Abr 2009 • ANO III • ISSN 2623-1177
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O que vem a ser a parceria público-privada?
//Editorial

O que vem a ser a parceria público-privada?

Normalmente as parcerias público-privadas são apresentadas pelos meios de comunicação no Brasil como sendo somente um esforço econômico-financeiro conjunto, feito pelo Estado e pelo setor privado, em investimentos voltados para interesses comunitários, especialmente em obras de infraestrutura.

Em realidade, porém, e à semelhança do que ocorre no primeiro mundo, a parceria público-privada deveria expressar um elenco de ações em paralelo, e das mais diversas naturezas, onde o agente privado e o ente Estado pensam e agem como um conjunto harmonioso para atender relevantes interesses nacionais. Isso traduz, antes de tudo, uma atitude próativa e convergente entre atores públicos e privados da mesma forma como é encontrada nas nações desenvolvidas, em oposição às atitudes preconceituosas que hoje se constatam generalizadamente em nosso país, onde até mesmo o encontro direto entre as partes que representam o ente público e o setor privado para o trato de matérias administrativas constitui iniciativa em princípio colocada sob suspeição, em especial no âmbito das agências regulatórias.

Algumas mudanças nesse cenário começam a surgir em nosso país e assim faz-se mister divulgá-las, na expectativa de que os exemplos frutifiquem e se multipliquem, tornando-se uma prática corriqueira nas relações do Estado com o setor privado, normalmente atropeladas pela ineficiente burocracia estatal e pelo temor da pecha de corrupção.

Inicialmente desejamos nos referir à atuação da ABIFINA perante o Poder Judiciário, sob a forma de amicus curiae. O “amigo da Corte”, como a própria nomenclatura já indica, é terceiro portador de conhecimento técnico acerca da matéria discutida em dado processo judicial em que pretende intervir, que visa auxiliar o magistrado no julgamento da causa, explicando e esclarecendo conceitos que possam ser por este desconhecidos, mas que são de extrema relevância para o conhecimento da realidade e, assim, para uma melhor e mais adequada prestação da tutela jurisdicional.

Como não se desconhece, sendo os limites processuais instaurados pelo Autor é muito comum a omissão e a descaracterização de fatos e atos.

A natureza jurídica do amicus curiae ainda é uma questão controvertida em âmbito doutrinário e jurisprudencial, havendo quem o entenda de forma preconceituosa como uma espécie de intervenção atípica, de assistência, ou mesmo como uma nova modalidade de intervenção de terceiros. Em sede pretoriana, no entanto, já entendeu o Supremo Tribunal Federal, por meio do voto do Ministro Celso de Melo, que o amicus curiae é simplesmente um “colaborador informal da Corte”, não configurando a hipótese de intervenção de terceiros.

De fato, também não há como serem confundidas as figuras da assistência e do “amigo da corte”, uma vez que aquela se caracteriza pela parcialidade de suas condutas, visando a um provimento final favorável a uma das partes, enquanto que esta última possui interesse na própria questão jurídica em debate entre os litigantes, não importando em que sentido será prolatada a sentença, o que não impede, entretanto, que, em cada caso concreto, tenha o amicus interesse por determinado resultado.

Seria extremamente contraditório e antidemocrático aceitar a oponibilidade de uma decisão judicial perante toda sociedade, se a última não puder participar de sua discussão.

Temos hoje um princípio do contraditório que abriga muito além da vetusta noção de “partes”, de “interesse”, dos efeitos de uma sentença envolvendo direitos erga omnes.

amicus curiae, na verdade, constitui um instrumento de grande valia para os debates insertos no Judiciário, como vem sendo reconhecido em inúmeras decisões havidas no Tribunal Regional Federal da 2ª Região onde a ABIFINA tem sido ouvida, uma vez que, por meio de densos argumentos tecnicamente corretos, visando proteger os reais interesses da sociedade brasileira convergentes com os da classe produtiva, ajuda a enriquecer a discussão jurídica chamando a atenção do julgador para detalhes fáticos ou circunstanciais de cada caso concreto.

Por sua vez, não há qualquer prejuízo em exigir da instituição que pretende auxiliar a corte alguns requisitos. O primeiro deles é uma longínqua atuação em âmbito nacional. Tal requisito visa evitar a constituição de entidades locais, sem tradição na área “exercida”, para o específico propósito de intervir levianamente em juízo.

Outro requisito que se deve provar é que a causa versa sobre interesses que ultrapassam o patrimônio jurídico dos litigantes. Tal exigência pode ser comprovada com uma resposta afirmativa à seguinte pergunta: o resultado da lide Impactará sensivelmente a sociedade?

Por último, exige-se que o “informante da Corte” tenha expertise no setor pertinente ao debate judicial. É o que tecnicamente se denomina de pertinência temática, tendo o escopo de que o exercício do interesse institucional seja acurado.

Já está bastante claro através de diversas decisões do TRF 2ª Região que a participação da ABIFINA em processos que tratam matérias relacionadas ao setor industrial da química fina, na qualidade de “amiga do julgador”, somente apresenta pontos positivos para o processamento desses feitos, não havendo qualquer motivo que justifique sua não admissão no mesmo, especialmente se levando em consideração a credibilidade e a natureza de entidade classista de âmbito nacional, como é o caso da ABIFINA, detentora de informações fáticas extremamente importantes para o deslinde das lides.

Outra área onde a parceria públicoprivada tem-se mostrado bastante frutífera no Brasil é no trato de políticas públicas para a saúde. O Ministro Temporão, desde que assumiu o cargo, tem mostrado uma realística preocupação com a criação e a viabilização de uma cadeia produtiva farmacêutica verticalmente integrada e efetivamente nacional, única garantia de um soberano e equilibrado acesso da população aos medicamentos essenciais.

Nesse cenário, o Ministro tem buscado sistematicamente ouvir o setor privado nacional que atua nesse setor, levando em consideração suas propostas e recomendações concretas e, em decorrência, vem criando os instrumentos requeridos e há muito tempo reclamados, como é o caso de extrema relevância desempenhado pelo adequado uso do poder de compra do Estado, objetivando a fabricação local de insumos e produtos estratégicos para a saúde pública através de empreendimentos industriais construídos em parcerias público-privadas.

Desde 1933, os Estados Unidos, através do Buy American Act, nas compras públicas privilegiam o produto fabricado localmente, mesmo que ele seja mais caro que o similar importado em até doze per cento. E quando se trata de produtos considerados do “interesse para a segurança nacional” – conceito totalmente subjetivo que permite incluir, a despeito das reclamações chinesas, até mesmo quepes para as forças armadas 35% mais caros que similares importados da China – prevalece o interesse nacional ditado em lei, que não é alterado mesmo pela assinatura de acordos internacionais no âmbito da OMC.

Na contramão do correto e apropriado procedimento adotado pelos Estados Unidos, no Brasil as compras públicas, na prática, efetivamente dão preferência ao produto fabricado no exterior. Isso porque, a despeito da matéria constitucional e Lei de Licitações sinalizarem para o equilíbrio entre as partes cotejadas em licitações públicas e a preferência ser dada para a oferta que melhor convier ao país, tais aquisições privilegiam na realidade apenas o menor preço de face, por que são realizadas através de leilões eletrônicos internacionais, ou nacionais que permitem a participação de importadores, que se processam sem qualquer tratamento isonômico prévio entra as partes que ofertam os produtos, tanto no que diz respeito aos tributos embutidos nos preços, quanto na qualidade requerida.

Essa caótica situação, que vem sendo denunciada pela ABIFINA há quase vinte anos, somente passou a ser ouvida pelo governo federal através da atual administração do Ministro Temporão, ao instituir encontros periódicos com representantes do setor produtivo, que resultaram na constituição de um Grupo Executivo do governo federal com a participação do setor privado, destinado a avaliar e a implantar as sugestões que lhe forem encaminhadas, com destaque para alterar o procedimento das compras públicas como proposto pela ABIFINA e que veio a ser formalmente adotado através da Portaria n° 3.031, de 16 de dezembro de 2008. Pela nova diretriz estabelecida por essa normativa legal, os laboratórios oficiais em suas aquisições deverão dar preferência ao produto fabricado no país levando em conta, inclusive, o grau de verticalização da produção local. Essa Portaria é mais uma passo dado no marco regulatório para o complexo industrial da saúde, na forma da atribuição conferida pelo Presidente da República ao Ministério da Saúde, através de Decreto datado de 12 de maio de 2008. A gestão de Temporão no Ministério da Saúde tem sido amplamente renovadora em relação aos anteriores Ministros dessa pasta, posto que ele corretamente vê na parceria público-privada o grande e efetivo modelo produtivo a ser adotado pela cadeia produtiva farmacêutica nacional para permitir um soberano desenvolvimento do Brasil, à semelhança do que ocorre nos países avançados.

Esperamos que os dois exemplos ilustrativos do amplo conceito de parceria público-privada já em andamento nas áreas dos poderes judiciário e executivo sejam divulgados e possam servir como modelo para a construção de outras parcerias público-privadas, em outras áreas de atuação. Esse é o único caminho que nos levará ao desenvolvimento econômico e social tão desejado, especialmente no atual cenário de crise internacional.

Nelson Brasil de Oliveira
Nelson Brasil de Oliveira
Vice-presidente de Planejamento Estratégico da ABIFINA.
Pedro Marcos Nunes Barbosa
Pedro Marcos Nunes Barbosa
Sócio de Denis Borges Barbosa Advogados ([email protected]). Professor do Departamento de Direito da PUC-Rio. Doutor em Direito (USP), Mestre em Direito (UERJ) e Especialista em Propriedade Intelectual (PUC-Rio)
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