REVISTA FACTO
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Jan-Fev 2008 • ANO II • ISSN 2623-1177
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//Matérias

Avaliação do setor produtivo farmoquímico nacional - capacitação tecnológica e produtiva

Jorge Carlos S. da Costa (PhD), Mario Celso Pagotto (MSc), Leonardo Cesar Macahodo Coutada, Tereza Cristina dos Santos (PhD)

A divulgação de estatísticas e informações técnicas sobre a operação de plantas industriais deve-se basear em auditorias técnicas conduzidas por equipes profissionais altamente especializadas, fato que não se tem verificado nas publicações disponíveis sobre essa matéria no Brasil. Nesse cenário cabe ser destacada uma louvável iniciativa de Farmanguinhos destinada a avaliar a capacidade produtiva de fármacos instalada no país, trabalho sério feito por uma competente equipe, a seguir apresentado.

Uma das principais atividades industriais ligadas ao complexo industrial da saúde, capaz de garantir o acesso da população brasileira ao arsenal terapêutico, necessário à manutenção da saúde, está representado pela produção industrial de fármacos e medicamentos. Esta atividade é indispensável para viabilizar a política de Assistência Farmacêutica desenvolvida pelo Ministério da Saúde.

A produção de medicamentos é considerada uma atividade estratégica para o país. O domínio da tecnologia de produção de fármacos e medicamentos garante ao país o acesso aos medicamentos necessários para a implementação da Política de Assistência Farmacêutica destinada a ampliar o acesso da população aos medicamentos, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

Dados recentes indicaram que o mercado farmacêutico mundial movimentou cerca de US$ 600 bilhões. No Brasil os números são bem mais modestos. Embora tenha sido apurado um crescimento no setor de cerca de 10% em 2007, o Brasil movimentou no período cerca de US$ 9,9 bilhões. Este desempenho manteve o Brasil como principal mercado latino-americano e ocupando o oitavo lugar no ranking internacional.

Não obstante a posição do Brasil entre os principais mercados farmacêuticos mundiais, ainda registra-se um déficit na balança comercial da cadeia farmacêutica nacional estimada em 2006 em cerca de US$ 2,8 bilhões.

Um dado interessante diz respeito à produção de fármacos e medicamentos no Brasil. Enquanto cerca de 80% dos medicamentos consumidos no país são fabricados em território nacional, por laboratórios farmacêuticos públicos ou privadas, denotando a existência de um parque industrial bem consolidado, menos de 20% dos mesmos são fabricados com Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs) produzidos no Brasil. Este fato indica claramente a fragilidade do parque industrial farmoquímico local.

O atual déficit na cadeia farmacêutica brasileira foi também observado na Índia até a década de 80. Contudo, atualmente, este país vem se destacando como um importante pólo produtivo do referido setor, onde até 1988 sua balança comercial apresentava-se deficitária. Este quadro começou a se inverter a partir de 1989 e um vertiginoso crescimento superavitário foi observado a partir de 1997. O sucesso desta atividade industrial na Índia contou com a participação dos seguintes setores:

I) governo: através do estabelecimento de políticas industriais abrangentes;

II) centros de tecnologia e universidades: responsáveis pela forte base científico-tecnológica e;

III) iniciativa privada: através de investimento em suas unidades fabris para absorção de novas tecnologias.

Vale ressaltar, que a forte dependência à importação de IFAs, além de contribuir de forma decisiva para o déficit comercial do setor, dificultar a consolidação de uma forte base tecnológica endógena, também pode comprometer a qualidade do medicamento produzido no país. A rastreabilidade do IFA utilizado na fabricação do medicamento é importante para a garantia da qualidade do mesmo. Por outro lado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), através da RDC 210/03, determina que os laboratórios farmacêuticos estabeleçam um programa de qualificação de seus fornecedores de IFAs, exigência que pode ser mais efetiva quando o parque industrial está estabelecido em território nacional.

Farmanguinhos há alguns anos iniciou um programa de visitas às instalações da indústria farmoquímica brasileira e, a partir de 2006, teve impulso com forte estímulo da direção, que em parceria estratégica com a ABIFINA para estabelecer uma política de estímulo à produção nacional através de seu poder de compra, logo apoiado pelo Programa de Inovação em Saúde instituído pela Presidência da Fiocruz em 2003.

Nesse cenário cabe ser destacada uma iniciativa de Farmanguinhos, realizada nesse sentido para avaliar, efetivamente, a capacidade produtiva de fármacos instalada no país, através de trabalho iniciado em 2006 e concluído no final de 2007. O trabalho foi conduzido por uma equipe multidisciplinar formada por dois doutores em química, um mestre e um graduado com especialização, todos com larga experiência profissional.

Assim realizou-se um levantamento do setor farmoquímico nacional com o principal objetivo de se fazer um diagnóstico sobre o mesmo. A partir deste trabalho foi possível:

I) mapear e identificar as empresas farmoquímicas atuantes no Brasil, caracterizando o tipo e a escala de produção e sua estrutura para o desenvolvimento tecnológico de produtos;

II) avaliar a capacidade instalada em termos de infra-estrutura, recursos humanos, recursos técnicos e financeiros e definição do seu grau de participação nos mercados nacional e internacional;

III) elaborar propostas para subsidiar uma política industrial para o setor.

Neste trabalho, um verdadeiro censo, o critério de inclusão foi indústrias do setor farmoquímico nacional que fabricam IFAs, através de processos orgânicos sintéticos. Os critérios de exclusão foram indústrias de fitofármacos e produtoras de IFAs de origem animal. Não foi estabelecido critério em função do tamanho das empresas, origem de seu capital acionário ou mesmo localização geográfica. Neste sentido, o levantamento e identificação das empresas foram realizados através de consulta às associações de classe, como a ABIFINA (Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, Biotecnologia e sua Especialidades) e Abiquif (Associação Brasileira da Indústria Farmoquímica) e Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química). Foi utilizado, também, o cadastro de fornecedores de IFAs de Farmanguinhos, além de pesquisa na internet.

Uma vez identificadas as empresas, encaminhou-se às mesmas uma carta formalizando o convite para participar do estudo e um questionário contendo perguntas específicas sobre o seu parque industrial.

A avaliação técnica sobre cada empresa selecionada foi feita, a partir de uma visita, realizada por uma equipe multidisciplinar composta por quatro funcionários de Farmanguinhos/Fiocruz. Após cada visita foi elaborado um relatório técnico, o qual contemplou os seguintes aspectos:

 capacidade produtiva: avaliação do volume reacional disponível, quantidade produzida (tonelada/ano), características dos equipamentos e linhas de produção;

 discriminação da produção: lista dos IFAs produzidos e classificação quanto à classe terapêutica;

 características do parque industrial: verificação se a unidade fabril é dedicada ou multipropósito e sua competência para realização dos diversos processos orgânicos utilizados na síntese de IFAs;

 número de funcionários: avaliação da capacidade da empresa na absorção de mão-de-obra (direta e indireta), verificação do perfil da mão-de-obra empregada em termos de qualificação;

 infra-estrutura de P&D: avaliação se a empresa possui estrutura própria destinada à P&D, avaliação se a empresa possui a cultura de estabelecimento de parcerias com universidades e/ou centros de pesquisa para desenvolvimento de produtos/processo;
 infra-estrutura analítica: avaliação se a empresa possui estrutura própria para fins analíticos e se esta é condizente com suas necessidades;

 garantia da qualidade: avaliação se a empresa possui uma política da qualidade condizente com a sua atividade industrial;

 certificações: verificação se a empresa possui certificação emitida por órgãos certificadores nacionais e/ou internacional;

 política ambiental: verificação se há uma política ambiental e se esta está sendo cumprida;

 participação no mercado: verificação dos mercados (nacional e internacional) em que a empresa atua e seus planos de expansão comercial.

O mapeamento do setor farmoquímico nacional realizado poderá evidenciar os pontos fortes e fracos do setor, a vocação tecnológica das empresas, a cultura em investimentos em P&D, capacidade produtiva atual e eventual ociosidade, investimento necessário para ampliação e/ou modernização do parque fabril, além de propostas do setor, no tocante a uma política industrial capaz de dinamizar este segmento produtivo.

A consolidação destas informações poderá servir de base para a elaboração de propostas para uma política governamental, além de identificar convergência entre linhas de produção, mercado e competitividade das empresas nos cenários nacional e internacional. Os resultados do censo realizado pela equipe de Farmanguinhos/Fiocruz será disponibilizado brevemente pela Fiocruz.

* Profissionais de Farmanguinhos

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