Um biofármaco que acaba de ser desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – e que já teve seu pedido de patente depositado no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) – pode representar um novo caminho para tornar o tratamento do diabetes mais eficaz. O medicamento, produzido no Laboratório de Biotecnologia Farmacêutica da universidade (BiotecFar), é baseado em um sistema de liberação prolongada de amilina humana e tem como objetivo oferecer aos diabéticos um melhor controle da glicemia.


Foto: Wendell Girard



Nanopartícula de amilina humana no microscópio eletrônico:
hormônio é a base do novo medicamento para diabetes


Trocando em miúdos, a amilina é um hormônio produzido naturalmente no pâncreas (pelas células beta), que desempenha um papel fundamental em diversos órgãos, inclusive para equilibrar os níveis de glicose. Este hormônio é cosecretado com a insulina, exercendo conjuntamente papéis importantes na regulação metabólica. “Mesmo pacientes diabéticos que fazem uso da insulina possuem dificuldades de controle dos níveis de glicose no sangue”, explica o professor da UFRJ Luís Maurício Lima, coordenador do projeto que teve início em 2009.


Atualmente, o tratamento para diabetes leva em conta apenas a reposição de insulina, deixando de lado a reposição da amilina. Isso ocorre devido à dificuldade de desenvolver medicamentos a base de amilina humana, que é bastante insolúvel. “Ao contrário da insulina, que é livremente solúvel, a amilina humana tem um problema de agregação protéica, que inclusive é causa de diabetes amiloidogênica e ainda a razão da dificuldade de usar o hormônio natural terapeuticamente”, afirma o farmacêutico.


Para contornar esse obstáculo e desenvolver o novo medicamento, os pesquisadores do BiotecFar/UFRJ recorreram a um minucioso trabalho de nanobiotecnologia farmacêutica. No laboratório, eles encapsularam nanopartículas de amilina humana em partículas poliméricas biocompatíveis. Por serem tão pequenas, elas podem ser facilmente administradas por injeção subcutânea ou intramuscular e por terem como base polímeros biocompatíveis são naturalmente degradadas e eliminadas pelo organismos. Apesar de continuarem insolúveis, formam um depósito que vai se degradando aos poucos no local de aplicação. “Produzimos nanopartículas contendo amilina humana de 200 nanômetros, que é uma medida equivalente a cerca de um milionésimo de metro”, conta Lima.


Foto: Bruno Melo Ferreira



O farmacêutico Luís Maurício Lima (esq.) e o doutorando Luiz Henrique Guerreiro, no BiotecFar/UFRJ: trabalho minucioso


Uma vantagem do uso de nanopartículas é a liberação contínua e lenta da amilina humana. Esta característica permite que as aplicações de amilina humana, sejam por injeções intramuscular ou subcutânea, não precisem ser diárias. “Esse detalhe é importante para manter a qualidade de vida do paciente diabético que já recebe doses diárias de insulina. Assim, o paciente não precisaria receber mais injeções diárias, de análogos solúveis de amilina, o que tornaria o tratamento mais desconfortável e menos próximo ao fisiológico por não se tratar da amilina humana. Podemos programar aplicações semanais ou até mensais”, destaca o professor. “A ideia é que a reposição de amilina humana seja um tratamento complementar à reposição de insulina, para potencializar o controle da glicemia”, completa.


O medicamento desenvolvido pelo projeto, que contou com apoio da FAPERJ por meio dos editais Jovem Cientista do Nosso Estado e Apoio às Instituições de Ensino e Pesquisa Sediadas no Estado do Rio de Janeiro, é uma alternativa ao uso de outro medicamento disponível no mercado americano para reposição da amilina: o pramlintide. “A diferença é que o pramlintide não é encontrado naturalmente no corpo e, por isso, pode causar alguns efeitos colaterais indesejados. Ele é uma substância análoga da amilina humana com alguns aminoácidos modificados para se tornar solúvel. Já a proposta da nossa equipe é oferecer um medicamento totalmente biocompatível”, pondera Lima.


Apesar do sucesso dos testes de controle de glicemia em camundongos, realizados no Laboratório de Biotecnologia Farmacêutica da universidade, ainda não há previsão de quando será possível viabilizar a chegada da amilina humana ao mercado. “Estamos em busca de parcerias com indústrias farmacêuticas e agências de fomento para realizar testes clínicos em humanos e, posteriormente, inserir o novo medicamento no mercado”, conclui. Além do professor Luís Maurício Lima, fazem parte da equipe o doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas Luiz Henrique Guerreiro e os professores da Faculdade de Farmácia Eduardo Ricci e Mauro Sola Penna.


Sobre o diabetes


O diabetes é uma doença metabólica caracterizada pela redução da quantidade de insulina secretada pelo pâncreas ou pela diminuição da sensibilidade do organismo à ação da insulina, o que eleva a quantidade de açúcar no sangue (hiperglicemia). Ele já é considerado uma epidemia associada à obesidade. De acordo com estatística divulgada pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), um novo caso surge a cada cinco segundos no mundo. Cerca de 250 milhões de pessoas em todos os países tem diabetes e a projeção feita pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para o ano de 2030 é que esse número dobre. No Brasil, segundo a SBD, pelo menos 10 milhões de pessoas têm a doença – o equivalente a 5,9% da população brasileira.


Fonte: © FAPERJ / Débora Motta

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