É inegável a pujança do mercado brasileiro, seja pela nossa expressiva participação como consumidores de produtos e serviços, seja pelas inúmeras oportunidades geradas pela nossa diversificada economia: agronegócio, indústria, comércio e serviços. Não é sem razão que somos a nona maior economia do mundo com um PIB de US$ 1,8 trilhão. Essa grandeza atrai investimentos e aponta para um potencial de crescimento. Entretanto, é certo que poderíamos ser muito mais atrativos se conseguíssemos superar alguns gargalos: custos de produção, logística, burocracia, sistema tributário, fatores que causam insegurança jurídica. E, ao lado desses entraves, temos cada vez mais a expressiva participação de criminosos movimentando bilhões de reais com práticas ilegais: sonegação, fraudes, contrabando, falsificação, contrafação, pirataria, recursos financeiros que geram a lavagem de dinheiro e corrupção e financiam organizações criminosas e milícias que se fortalecem enfrentando o poder do Estado, acarretando violência e abalando a nossa segurança pública.
Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP) coleta dados junto aos setores produtivos que apresentam suas estimativas de perdas causadas pelo mercado ilegal nas suas diversas formas de atuação.
No primeiro levantamento, de 2014, as perdas diretas causadas pela ilegalidade, em quinze setores produtivos, mais uma estimativa conservadora de tributos que foram sonegados, alcançou a cifra de R$ 100 bilhões. No ano passado, com quatorze setores, chegamos a R$ 410 bilhões.
Essa é a dimensão da participação do mercado ilegal em nosso País, sendo certo que esse montante é maior, pois não estão registradas, por exemplo, perdas com medicamentos, produtos veterinários, software e o crescimento das ofertas de produtos de origem ilegal feita pela internet.
Só o setor de defensivos agrícolas apontou, nesse último levantamento do FNCP, perdas de R$ 20,8 bilhões, que representam 20% desse mercado na ilegalidade. Esse espaço perdido para o crime afeta nossas indústrias e comércio e provoca danos à nossa saúde, desde os trabalhadores que manipulam esses produtos, que muitas vezes são proibidos de serem comercializados, até os consumidores, pelos efeitos nocivos que podem ocasionar nos alimentos. Essa também é a realidade para os produtos veterinários. Além desses males, nossos produtores têm que enfrentar questionamentos no âmbito do comércio exterior, fomentando, inclusive, iniciativas promovidas por concorrentes internacionais, que se aproveitam dessas possíveis brechas para atacar a nossa relevante participação no mercado internacional.
Em verdade, toda a economia brasileira e o erário são duramente afetados, mas também perde o consumidor com a aquisição de produtos de baixa qualidade, que não atendem as normas e regulamentos técnicos, com evidentes danos para a saúde e segurança. Ganham os criminosos e inescrupulosos, que se fortalecem e afastam investimentos e empregos.
Esse panorama deve ser enfrentado com determinação, integrando todos os esforços do poder público com a importante cooperação do setor privado.
Temos defendido há anos a intensiva cooperação e a integração das diversas áreas governamentais na estruturação de políticas públicas eficazes. O Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos Contra a Propriedade Intelectual (CNCP), colegiado do Ministério da Justiça e Segurança Pública, congrega como titulares ministérios, Polícias Federal e Rodoviária, Receita Federal, e cinco representantes dos setores produtivos e tem sido um espaço importante para o aperfeiçoamento dessa coordenação.
A elaboração de guias de boas práticas estimulando a autorregulação; cartilhas com informações práticas; incentivo para a ação dos Estados e Municípios; aperfeiçoamento legislativo; aproximação com o Poder Judiciário e Ministério Público; apoio aos investimentos em recursos humanos e tecnológicos nas forças policiais e nos órgãos reguladores, especialmente nas fronteiras; concursos públicos para contratação de novos funcionários que atuam na defesa do mercado legal (o exemplo da Receita Federal é ilustrativo, há anos sem novas contratações com um número crescente de aposentadorias afetando o enfretamento do crescente movimento aduaneiro e de fiscalização) são temas que temos apresentado e apoiado fortemente no âmbito do CNCP.
Não obstante essas propostas e a intensa dedicação dos agentes públicos, é importante ressaltar que os governos que acabam de completar 100 dias precisam encarar a defesa do mercado legal como uma ação absolutamente necessária. Nesse sentido, urge que haja cada vez mais o direto engajamento dos ministros e secretários apoiando decisivamente suas respectivas áreas de competência, fortalecendo o trabalho que tem sido realizado pelas áreas operacionais e que merecem toda a atenção.
Sabemos que não faltam prioridades diante do enorme desafio que temos na administração de um país tão complexo como o nosso, mas a defesa do nosso mercado legal converge com as iniciativas de estímulo à economia, defesa do consumidor, aprimoramento da arrecadação sem aumento de impostos e combate às organizações criminosas e milícias. Portanto, defendemos que tenhamos uma contínua ação que represente essa convergência de propósitos em defesa do interesse nacional.