Conceitualmente, farmacovigilância veterinária trata-se de um conjunto de medidas de monitoramento pós-comercialização relativas à detecção, avaliação, compreensão e prevenção de eventos adversos ou quaisquer outros problemas relacionados ao emprego de produtos de uso veterinário.
São procedimentos complexos que, de forma geral, visam à segurança e eficácia nos animais, e à segurança dos usuários durante o emprego de produtos de uso veterinário. Ou seja, processos que têm o intuito de monitorar continuamente o uso desses produtos e avaliar se o risco inerente à sua utilização é aceitável em comparação com seus benefícios.
A farmacovigilância veterinária envolve mecanismos legais, científicos, fiscais e, principalmente, educativos, pois o trabalho de conscientização dos médicos veterinários e demais técnicos envolvidos, bem como da população em geral, sobre a importância e a necessidade da notificação de eventos adversos é a base para o seu sucesso.
Em relação às políticas públicas nacionais para o tema, o histórico ainda é recente, tendo alcançado maior destaque somente a partir da publicação do Decreto 8.448, de 6 de maio de 2015, o qual “altera o regulamento de fiscalização de produtos de uso veterinário e dos estabelecimentos que os fabriquem ou comercializem, aprovado pelo Decreto nº 5.053, de 22 de abril de 2004”. Esse decreto estabelece definições e responsabilidades dos envolvidos. Dessa maneira, tornou-se obrigatória a realização, pelas empresas titulares do registro do produto de uso veterinário, de investigação completa de eventos adversos, a fim de identificar a causalidade entre esses eventos e os produtos suspeitos, bem como dispor de serviço de farmacovigilância, na forma disposta em ato do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).
Destaca-se que a regulamentação do tema por meio de uma legislação nacional específica é um fator de extrema importância para a implementação e consolidação dos procedimentos de farmacovigilância veterinária no País. Tal ato normativo encontra-se em fase final de elaboração, atendendo a todos os ritos das boas práticas de regulamentação estabelecidas pela Secretaria de Defesa Agropecuária (SDA/MAPA), como a realização de avaliação de impacto regulatório e a promoção de consulta pública, por exemplo.
O usuário de produto de uso veterinário (qualquer pessoa que administre o produto de uso veterinário a animais ou que seja exposta ao seu conteúdo), ao observar um evento adverso, deverá realizar contato com a empresa por meio do canal de atendimento constante do rótulo, ou bula, e relatar o ocorrido. Deverá informar sobre a descrição do evento, os dados dos animais, minimamente a espécie, ou seres humanos envolvidos, e dados que permitam identificar o produto de uso veterinário suspeito pelas empresas. As empresas, por sua vez, deverão realizar a investigação completa de evento adverso, a fim de identificar a causalidade entre o evento e o produto suspeito.
As responsabilidades previstas para as empresas titulares dos registros de produtos de uso veterinário incluem dispor de um Serviço de Farmacovigilância Veterinária composto por técnico responsável, canal de atendimento ao usuário, banco de dados auditável, procedimentos de farmacovigilância veterinária estabelecidos e descritos, e registro de treinamentos dos funcionários envolvidos nas atividades. Além disso, as empresas deverão cumprir com uma série de outras exigências, descritas na norma mencionada.
Ao MAPA igualmente competem responsabilidades, porém mais direcionadas à formação de um banco de dados e monitoramento das ações pertinentes, bem como estabelecer um canal de comunicação entre o setor privado e a sociedade.
Como já destacado, o êxito de qualquer sistema de farmacovigilância depende das notificações espontâneas dos usuários. Sendo assim, a responsabilidade pela maior conscientização dos usuários em relação à farmacovigilância veterinária deve ser compartilhada entre indústria farmacêutica, órgãos públicos, instituições de ensino superior e pesquisadores.
A garantia da confidencialidade dos relatos de eventos adversos feitos pelos usuários, a disponibilização de informações técnicas e treinamentos, bem como a publicação de guias e divulgação permanente dos resultados obtidos na farmacovigilância de produtos de uso veterinário são algumas das maneiras de motivar não somente os médicos veterinários, como também todos os demais envolvidos.
Por fim, é objetivo da farmacovigilância garantir a segurança, qualidade e eficácia dos produtos de uso veterinário, de forma a promover o desenvolvimento sustentável das cadeias produtivas agropecuárias, em benefício da sociedade brasileira.
REFERÊNCIAS
Brasil. Decreto nº 5.053, de 22 de abril de 2004, que “Aprova o Regulamento de fiscalização de produtos de uso veterinário e dos estabelecimentos que os fabriquem ou comerciem, e dá outras providências”. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/insumos -agropecuarios/insumos-pecuarios/produtos-veterinarios/legislacao-1/decreto-lei-e-lei/decreto-federal-no-5053-de-22-04-2004.pdf/view. Acesso em 15/08/2022.
Xavier, F.G. Farmacovigilância veterinária: aspectos gerais e aplicados. In: Spinosa, H.S.; Palermo-Neto, J.; Górniak, S.L. Medicamentos em animais de produção. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2014. p. 413-426.
Organização Mundial da Saúde/Organização Pan-Americana da Saúde/Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A importância da farmacovigilância. Monitorização da segurança dos medicamentos. 2005. 48p. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/importancia.pdf. Acesso em 15/08/2022.
Organização Pan-Americana da Saúde. Rede Pan-Americana de Harmonização da Regulamentação Farmacêutica. Boas práticas de farmacovigilância para as Américas. 2011. 75p. Disponível em: https://www.paho.org/hq/dmdocuments/2011/Red-PARF-5-Port.pdf. Acesso em 15/08/2022.