REVISTA FACTO
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Out-Dez 2016 • ANO X • ISSN 2623-1177
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//Artigo

As bases para a retomada do desenvolvimento econômico brasileiro: desenvolvimentismo ou neoliberalismo?

A crise econômica que vive hoje a nação brasileira é entendida, pela maioria dos economistas brasileiros, como a pior desde 1930.

A referência feita àquele ano decorre do fato de o Brasil, à semelhança de outros tantos países, já naquela época ser bastante dependente de suas relações comerciais com os Estados Unidos e, subitamente, estar diante da condição de ter de enfrentar os reflexos da crise decorrente da quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 24 de outubro de 1929.

Na época, a economia brasileira, que desde a independência do País era essencialmente agrária, tinha suas exportações ancoradas na produção agrícola, tendo o café como seu principal produto de exportação.

Por essa razão, a ordem para a queima dos estoques de café foi importante episódio na história da economia brasileira, uma das primeiras consequências das medidas tomadas pelo governo da época – Getúlio Vargas – na tentativa de controlar, o mais rapidamente possível, as consequências da crise. A queima de um total estimado de 80 milhões de sacas objetivou, através de uma manobra de rápida diminuição da oferta do produto ao mercado externo, recuperar os preços que vinham sendo praticados até antes da crise americana.

É importante lembrar que a crise de 1929 integra a lista das seis mais importantes crises ocorridas nos Estados Unidos. Afetou dramaticamente a vida de milhões de americanos e é conhecida como a Grande Depressão. Durou por toda a década de 30, só terminando no iní- cio da II Guerra Mundial.

Essa breve introdução tem o intuito de mostrar que esse foi um marcante episódio que contribuiu para que algumas importantes lideranças nacionais – empresariais e políticas – viessem a ter reforço em suas teses de que o País precisava acelerar seu processo de industrialização, já bastante atrasado. Uma decisão quanto a isso deveria ser urgente, tomada de forma rápida, para que conseguíssemos superar a situação de dependermos basicamente da receita de exportação de produtos agrícolas, incapaz de cobrir os custos das importações necessárias para atender a já complexa demanda nacional por produtos industrializados e, portanto, de maior valor.

Importante também mencionar que, mesmo que naquela época já tivéssemos importantes empresas estrangeiras atuando no País, era pequeno, e não economicamente significante em sua maioria, o número de empresas de capital nacional atuando tanto como prestadoras de serviços, como na produção de bens.

Era importante surgirem alternativas para que o País conseguisse superar “seu complexo de colônia” e pudesse alçar voos mais altos, para melhor se posicionar no cenário internacional.

Em decorrência dos esforços das já mencionadas lideranças nacionais – empresariais e políticas –, foi desencadeado o processo que iria resultar na formulação das bases de um ambicioso – para época – programa de desenvolvimento econômico, marco inicial dos nossos Ciclos Desenvolvimentistas.

E eis aqui, buscando na história do desenvolvimento econômico brasileiro, um dos primeiros ensinamentos que nos remete ao título do artigo: as lideranças de 1930 deram o passo para tentar romper a perigosa situação de termos ficado presos ao “complexo de colônia”, fator que não tinha a menor importância, sendo até bastante confortável para uma pequena elite dominante que, à época, conduzia os “negócios” brasileiros.

Seria importante que o governo não se deixasse perder no roldão da atual crise, que é bastante séria e terá uma duração mais longa do que se vem divulgando. Deixando-se levar ao sabor dos acontecimentos, pode estar deixando de tomar decisões importantes para um momento que seja somente politicamente mais adequado. Pode estar correndo o risco de tomá-las fora do tempo ideal. O exemplo que pode ser dado é o de não tomar uma decisão quanto à definição de possíveis diretrizes para a retomada do desenvolvimento econômico, questão que entendemos ser imprescindível para o resguardo de muitos interesses nacionais.

Acredito que o governo esteja devidamente consciente – e informado – das consequências que esta crise já está gerando para as atividades de um complexo sistema de fomento e financiamento de atividades relacionadas à inovação. Essas consequências estão causando fortes impactos nos projetos destinados à criação e/ou fortalecimento da capacitação tecnológica nacional das companhias brasileiras. As empresas que estão atingidas por esses efeitos têm necessidade de se tornarem inovadoras e, por conseguinte, mais competitivas, inclusive para poderem responder mais rapidamente aos possíveis esforços relacionados a uma desejada e rápida retomada do desenvolvimento econômico.

Preocupa-nos, também, as já nítidas possibilidades de estarmos caminhando – via completa liberalização de nossa economia – para uma situação em que deverão prevalecer diretrizes conhecidas e estabelecidas no período de 1995 a 2002, que se contrapuseram a qualquer tese de desenvolvimento econômico na qual pudesse ser defendida a necessidade de uma Política Industrial. Assim se manifestou o governo da época: a melhor política industrial é não ter política industrial.

Para os defensores do liberalismo econômico, o mercado é suficiente para colocar tudo em ordem, em perfeito equilíbrio. Sempre preconizam que – para alcançarmos o Nirvana da Globalização, que nos tirará da crise e permitirá o crescimento econômico brasileiro – devemos seguir agora – e talvez para sempre – os mágicos ditames contidos nos três pilares do Consenso de Washington: austeridade fiscal; privatização; e liberação do mercado.

Creio ser fácil perceber que os descompassos que a atual crise pode criar no cenário de nossa economia são capazes de não só ameaçarem algumas de suas bases já razoavelmente consolidadas, mas também comprometer a nossa soberania, na qual a questão do petróleo é hoje o tema mais importante, bem como há décadas tem sido as questões relacionadas com a produção de fármacos no País.

Parte das medidas atuais destinadas ao controle da inflação e oferecidas avidamente a interessados estrangeiros se enquadra total e principalmente no pilar Privatização do já mencionado Consenso de Washington. É realmente incrível como estão sendo rompidas rapidamente, e sem critérios que sejam plenamente justificados, as bases do pensamento econômico brasileiro estabelecido, conforme pode ser lido no excelente artigo de José Maria Dias Ferreira (“Uma breve história do desenvolvimentismo no Brasil”), publicado em Cadernos do Desenvolvimento e encontrado na íntegra neste endereço: http://www.centrocelsofurtado.org.br/arquivos/image/
201111011216170.CD9_artigo_5.pdf

A seguir, apenas um trecho do artigo:

“O pensamento econômico brasileiro, no pós-guerra, não se estruturou nos meios acadêmicos como havia ocorrido na formação econômica dos países desenvolvidos. Desde o início, formou-se uma visão econômica politicamente engajada na defesa da industrialização, o chamado desenvolvimentismo. As ideias-força do desenvolvimentismo eram: 1) a industrialização é a via da superação da pobreza e do subdesenvolvimento; 2) um país não consegue industrializar-se só através dos impulsos do mercado, sendo necessária a intervenção do Estado (intervencionismo); 3) O planejamento estatal é que deve definir a expansão desejada dos setores econômicos e os instrumentos necessários; 4) a participação do Estado na economia é benéfica, captando recursos e investindo onde o investimento privado for insuficiente”.

Ainda para contribuir para um melhor entendimento do tema e mostrar a situação em que se encontrava o Brasil em 1943, trinta anos depois do início da crise dos anos 30, recomendo, enfaticamente, a leitura, mesmo que restrita, de parte do conteúdo do livro “The Brazilian- -American Alliance, 1937-1945”, escrito por Frank D. McCann Jr., contida no Capítulo 13 (War and Development). Nela, podem ser encontradas informações de um relatório escrito por Morris Cooke, assessor do governo americano que esteve no País naquela época, avaliando as condições nacionais, com vistas à montagem de argumentos que poderiam ser usados em futuras negociações com o governo brasileiro, buscando o convencimento de que seria importante o Brasil definir logo com quem ficaria aliado na II Guerra Mundial. Parte do texto é suficiente para que os leitores consigam saber como era o nosso atraso tecnológico naquela época e a grave dependência de financiamentos externos, que eram atrelados a uma série de condições para seus usos.

Leiam e meditem, principalmente sobre o descrito na epígrafe do mencionado capítulo, disponível no endereço eletrônico: https://muse.jhu.edu/chapter/1482881

Ao finalizar este artigo, deixo claro que, em minha opinião, as melhores referências da história do desenvolvimento econômico brasileiro continuam sendo aquelas que se encontram identificadas nas quatro principais diretrizes norteadoras – ideias-força – das ações do 1º Ciclo Desenvolvimentista.

Gilberto Soares
Gilberto Soares
Diretor de Biotecnologia da ABIFINA.
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