REVISTA FACTO
...
Mar-Abr 2007 • ANO I • ISSN 2623-1177
2023
73 72 71
2022
70 69 68
2021
67 66 65
2020
64 63 62
2019
61 60 59
2018
58 57 56 55
2017
54 53 52 51
2016
50 49 48 47
2015
46 45 44 43
2014
42 41 40 39
2013
38 37 36 35
2012
34 33 32
2011
31 30 29 28
2010
27 26 25 24 23
2009
22 21 20 19 18 17
2008
16 15 14 13 12 11
2007
10 9 8 7 6 5
2006
4 3 2 1 217 216 215 214
2005
213 212 211
//Artigo

PAC: um bom começo

O anúncio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) pelo presidente Lula soa como uma promissora disposição do governo de retomar políticas públicas desenvolvimentistas. No entanto, para que isto se traduza em maior crescimento, serão necessárias medidas de apoio às indústrias de maior valor agregado.

O segundo mandato do presidente Lula começou com uma estimulante declaração de intenções sobre a retomada do desenvolvimento econômico. No lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento, em poucas palavras o presidente reconheceu que a estabilidade monetária do País foi consolidada, que o equilíbrio financeiro foi restaurado e que, agora, será necessário romper o ciclo de crescimento econômico baixo que já se arrasta por duas décadas.

Num pacote de medidas voltadas para o estímulo ao investimento, desoneração de produtos, incentivo ao setor de infra-estrutura e desenvolvimento tecnológico, o PAC prorroga a vigência do uso do crédito na apuração da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), amplia os incentivos fiscais para aquisição de microcomputadores, desonera a produção de materiais para construção civil, estimula investimentos financeiros na área de infra-estrutura e cria programas de apoio à inovação tecnológica na indústria eletro-eletrônica (semicondutores, displays e equipamentos de transmissão de TV digital).

No que tange a investimentos públicos e sob forma de parcerias público-privadas, o Programa está organizado em três eixos: Infra-Estrutura Logística, que envolve a construção e ampliação de rodovias, ferrovias, portos, aeroportos e hidrovias; Infra-estrutura Energética, voltado para a geração e transmissão de energia elétrica, produção, exploração e transporte de petróleo, gás natural e combustíveis renováveis; e Infra-estrutura Social Urbana, contemplando o programa Luz Para Todos e investimentos em saneamento, habitação, metrôs, trens urbanos e infra-estrutura hídrica.

A meta central do PAC é elevar o crescimento do PIB brasileiro para 5% ao ano no próximo triênio. Para alcançá-la o governo admite reduzir o superávit primário em 0,5% – de 4,25% para 3,75% – liberando para investimentos públicos um volume de recursos bastante significativo em relação aos últimos anos: 0,5% do PIB por ano, durante o período de 2007-2010. Em apresentação feita pelo ministro Guido Mantega à Comissão de Assuntos Econômicos e de Infra-Estrutura do Senado Federal, foi também explicitado como compromisso do PAC “continuar o desenvolvimento do mercado de crédito e de capitais, aumentando a oferta e diminuindo os juros”, mas até o momento não há metas definidas quanto a este tópico.

A tônica do Programa é, portanto, uma louvável tentativa de acelerar o desenvolvimento por meio da recuperação e expansão da infra-estrutura – construção civil, energia, logística, teleinformática. Efetivamente, não se faz desenvolvimento sem o suporte de uma infra-estrutura sólida. Por outro lado, embora esta seja uma condição sine qua non, ela não é suficiente para tirar a economia da inércia, e muito menos para elevar o PIB ao patamar desejado. Será preciso mudar a matriz exportadora do País, ampliando substancialmente a participação de indústrias e serviços de maior valor agregado.

O mundo é pródigo em exemplos dessa receita de crescimento. Todas as nações desenvolvidas expandiram suas economias via industrialização e serviços, e nunca com base no setor primário. Entre os países emergentes, vemos que a China ingressou fortemente num processo de industrialização, inclusive no setor químico, melhorando a cada ano que passa os seus processos produtivos e conseqüentemente a qualidade dos seus produtos. A Índia, por sua vez, além de também se destacar na indústria química, implementou uma ousada e bem sucedida estratégia de crescimento assentada em serviços qualificados, com ênfase na produção de software. Foi apostando nos setores secundário e terciário que a China e a Índia elevaram o crescimento dos seus respectivos PIBs na última década para 9%, em média, sendo que na China a indústria siderúrgica cresce 15% e na Índia os serviços de tecnologia da informação crescem 35% ao ano.

Nenhum desses dois países tem expressão no “agronegócio”. Na verdade, a não ser na área de defensivos agrícolas, as indústrias brasileiras que atuam nesse segmento apresentam baixo valor agregado, como os setores extrativo-mineral, de alimentos e têxtil. São indústrias que produzem basicamente commodities – vulneráveis, portanto, a quaisquer oscilações de preços no mercado internacional.

Este é o paradigma que precisa ser quebrado. Somente através de um forte empenho em setores industriais e de serviços com alto valor agregado – incluindo o turismo, sem dúvida, desde que profissionalizado – se conseguirá uma efetiva aceleração do crescimento econômico. Mas, para isso, fazem-se necessária algumas medidas que não implicariam nenhum comprometimento do controle inflacionário. São elas:

1) Uso do poder de compra do Estado em favor do produto fabricado no País. Hoje, nas compras públicas leilões eletrônicos privilegiam o produto importado e corroem a competitividade da indústria nacional, inviabilizando inclusive perspectivas de exportação. É o caso dos laboratórios oficiais que não conseguem registrar medicamentos genéricos para os quais teriam mercado inclusive no exterior porque a atual política de compras governamentais impossibilita a formação de uma base estável e idônea de fornecedores de suas matérias-primas (princípios ativos farmoquímicos).

2) Registro sanitário e fitossanitário de produtos. É imprescindível que o Estado encontre um equilíbrio na regulamentação do registro, que, ao mesmo tempo, assegure a qualidade e a segurança dos produtos com impacto na saúde humana e/ou no meio ambiente e assegure completa isonomia de tratamento entre o produto fabricado no Brasil e o importado. Ao contrário do que fazem os países do Primeiro Mundo, hoje estamos usando o conceito de “barreira sanitária” em detrimento da indústria nacional, criando dificuldades e ônus que não pesam sobre os produtos que vêm de fora.

3) Câmbio e juros. Mantendo-se a atual política cambial e monetária o PAC não dará resultados positivos na indústria. Com a altíssima taxa de juros oferecida pelo Brasil, o afluxo de dólar especulativo para o País é inevitável, e com ele o real se mantém apreciado, enfraquecendo o ímpeto das exportações e gerando uma pressão incontrolável por importações.

Esta opinião não é somente da ABIFINA, mas de todas as entidades empresariais efetivamente comprometidas com a indústria nacional. Para Rodrigo Loures, diretor da CNI, o PAC precisa ser complementado por medidas coerentes de política macroeconômica: “Sabemos que a exorbitante taxa de juros real e o câmbio valorizado se constituem em verdadeiros exterminadores dos empregos e dos empreendedores”, ele afirma, lembrando que os países vencedores no jogo global conjugaram investimentos com mecanismos macroeconômicos para valorizar a sua produção industrial e dinamizar o crescimento. “Acredito que o acompanhamento dessas experiências pode nos ser muito útil durante a implementação do PAC”, recomenda.

Loures cita estudos do economista Luciano Coutinho indicando que, para o Brasil competir com a China no mercado externo, o dólar teria de custar hoje algo em torno de R$ 4. Deixando-se a China de lado, um câmbio globalmente competitivo para nossas exportações seria de R$ 3,5, mas a partir de R$ 2,6 muitos setores industriais brasileiros poderiam começar a respirar, sem causar um impacto significativo na inflação e contribuindo para maior crescimento e diversificação industrial da economia.

Na opinião do economista e ex-ministro Delfim Netto, o mérito do Programa é recuperar o espírito de crescimento que abandonamos nos últimos doze anos. “Temos de entender o PAC como uma construção para recriar o espírito animal dos empresários e melhorar a eficácia do governo”. Quanto à concretização dos investimentos diretos ele se mostra cético. “Acho que esta listagem que foi feita agora é, no fundo, muito parecida com o que foi feito no Mãos à Obra e no Avança Brasil. Não dá em nada.”

O ex-ministro considera que nos últimos governos houve excessiva ênfase na estabilização monetária, embora um esforço nesse sentido fosse realmente indispensável. O problema é que “demos à estabilização peso 100 e ao crescimento, zero”. Nesse processo, segundo ele, foram criadas enormes distorções, como o aumento dramático da carga tributária e o endividamento público, que tornaram a retomada do crescimento muito difícil.

   Mas é hora de enfrentar este desafio e o PAC, por si só, não terá o poder de superá-lo. Se este governo não tiver ousadia para destravar o crescimento industrial por temer riscos de desestabilização monetária, daqui a alguns anos o Programa de Aceleração de Crescimento será lembrado como apenas mais um, entre tantos, nomes ambiciosos para planos frustrados.

Anterior

O exame de mérito das patentes

Próxima

ABIFINA comenta a notícia