O sistema judiciário brasileiro evoluiu nos últimos anos em relação ao tratamento dado à propriedade intelectual, estruturando-se melhor para julgar as ações sobre o tema, mas ainda apresenta obstáculos a serem superados. Essa foi a síntese do painel “A Visão da Propriedade Intelectual em Âmbito Judicial” que reuniu, na mesma mesa, a Juíza Federal Titular da 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro, Márcia Maria Nunes de Barros, o jurista e consultor jurídico da ABIFINA, Pedro Marcos Barbosa, e o procurador-chefe do INPI, Loris Baena Cunha Neto. O painel integrou a programação da nona edição do Seminário Internacional Patentes, Inovação e Desenvolvimento – IX SIPID, que aconteceu no último dia 18, terça, no Rio de Janeiro.
Abrindo o painel, a juíza Márcia Maria Nunes de Barro trouxe um retrato da Justiça Federal do Rio de Janeiro, que corresponde à 2ª Região e onde se concentram as Varas especializadas em Propriedade Intelectual, criadas a partir de 2000 na 1ª instância e de 2005, na 2ª instância. Segundo dados apresentados pela juíza, enquanto o número de processos previdenciários caiu drasticamente na 1ª instância desde 2006, o total de processos relativos a PI manteve-se igual no mesmo período. Em 2017, foram 620 sentenças proferidas. Esse ano, até meados de setembro, o tribunal contabilizava quase 440 sentenças.
Mostrando otimismo, a juíza apontou alguns avanços do judiciário nos últimos anos. Para ela, apesar de o sistema brasileiro não prever a necessidade de magistrados especializados em PI, como em outros países, a adoção de peritos judiciais, profissionais especializados que examinam as ações do ponto de vista técnico e dão suporte à análise e à decisão do juiz, tem começado a se mostrar efetivo. Ela reconheceu, entretanto, que houve um longo percurso até se chegar ao atual modelo e que ainda há confusão das partes em relação à função desse especialista.
Outro aspecto importante, segundo Márcia Maria Nunes de Barros, é a compreensão do conceito técnico de obviedade. De acordo com a juíza, é necessário ter claro quais são os critérios para se identificar a existência ou não de atividade inventiva, e isso só pode ocorrer a partir de um teste de obviedade previamente definido. “A atividade inventiva não é critério subjetivo que possa ficar submetido à descrição do examinador, do perito ou do juiz. Tenho que explicar motivadamente por que estou chegando naquele resultado. Tem que ser uma decisão completamente objetiva”, frisou.
Até 2015, o Brasil não possuía parâmetros bem definidos para o teste de obviedade, como é prática em lugares como os EUA ou a União Europeia, o que causava confusão na análise de processos de patentes. Foi só a partir de uma iniciativa da 13ª Vara federal do Rio de Janeiro que se propôs uma sistematização do teste de obviedade, resultando na criação do Teste de Motivação Criativa (TMC). O TMC consiste em uma sequência de critérios objetivos a serem cumpridos para se determinar a presença ou não de atividade inventiva. Segundo a juíza, o TMC tem sido bem aceito pelos tribunais.
O advogado Pedro Barbosa falou na sequência e ressaltou que, apesar da dificuldade inicial na definição dos peritos assim que a prática passou a ser adotada, o resultado do trabalho dos especialistas é positivo. “Hoje temos uma história feliz, pelo menos no Rio de Janeiro, tanto que há ações que são movidas fora do estado para fugir dos peritos”, afirmou.
Barbosa destacou, entretanto, três questões que considera preocupantes: o excesso de judicialização na área de PI, incluindo ações contra processos administrativos do INPI, e uma profusão de tutelas de urgência, que dificultam a celeridade das decisões do escritório de patentes, e a extensão dos prazos de patentes para além do previsto em lei, em parte resultado de uma demora de manifestação do Supremo Tribunal Federal a respeito de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIn), como a referente ao parágrafo único do artigo 40 da Lei de PI.
O último a falar foi o procurador-chefe do INPI, Loris Baena Cunha Neto. Baena elencou aspectos positivos e negativos do sistema judiciário que afetam os trabalhos do escritório de patentes. Um dos problemas citados é a adoção, em processos judiciais, de quadros reivindicatórios alternativos, que inclusive violam a legislação vigente. O procurador propôs, então, o esforço coletivo para se mudar o cenário.
Entre os aspectos positivos destacados por Baena está a Portaria n° JFRJ-POR-2018/00110, de 24 de abril de 2018, que determinou que nas ações em que é citado como co-reú, o INPI só passa a ser intimado após a juntada da contestação do autor. Antes da Portaria, o INPI era intimado previamente a essa etapa, impossibilitando que apresentasse uma manifestação técnica bem fundamentada e robusta. Outro aspecto positivo foi a redução do número de mandados de segurança motivados pelo backlog e, mesmo com o aumento do número de ações em face da autarquia, devido ao aumento de produtividade, a taxa de judicialização dos processos não aumentou.
Acesse as apresentações:
Apresentação da Juíza Federal, Márcia Maria Nunes de Barros
Apresentação do procurador-chefe do INPI, Loris Baena