O Dia | 31/05/15
Pedido de redução do prazo de patentes foi aceito e vai permitir produção de genéricos para vários remédios
Adriana Cruz
Rio – Uma reviravolta na produção de medicamentos no país — que permite baratear o preço com a fabricação de genéricos — começa a ser provocada graças a decisões da Justiça. Por maioria de votos, desembargadores federais da 2ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal 2 aceitaram o pedido de redução do prazo de patentes feito pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).
De cara, os julgamentos fizeram a patente do Cialis, um dos remédios mais vendidos do país, perder proteção. Assim, o medicamento para disfunção erétil, com preço unitário de R$ 43, terá um genérico 35% mais em conta, o equivalente a R$ 15,05. Em 2014, o governo federal gastou R$ 229 milhões na compra do Cialis.
A disputa entre laboratórios, centros de pesquisas multinacionais e o Inpi envolve 37 processos na Justiça Federal, com 240 patentes de 53 medicamentos. Destes,seis ações foram julgadas e ainda cabem recurso às cortes superiores.
A última decisão aconteceu na terça-feira, quando o TRF-2 decidiu reduzir o prazo de validade do Tamiflu de 2018 para o ano que vem. O remédio, produzido pelo laboratório Roche, é usado no tratamento das gripes suína, A e B. Nas farmácias, uma caixa com dez cápsulas, de 75 mg, sai em média por R$ 190. O DIA fez contato com a Roche, mas não obteve resposta.
Em jogo está a proteção de medicamentos importantes como o Mycamine, nome conhecido no mercado, usado em transplante de medula. Para atender os pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), o Ministério da Saúde gasta anualmente R$ 73 milhões com este item. O Inpi quer que seja reduzido em 1.826 dias a entrada em domínio público da produção do remédio.
Outro medicamento no alvo é o Coreg CR, que serve para o tratamento de cardíacos. O governo gasta mais de R$ 345 milhões na compra do produto, que tem grande demanda no Brasil. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a cada dois minutos, uma pessoa morre por problemas de coração no país. A tendência é de que esse número aumente para 1,5 morte ocorrida em um minuto, até 2050.
A batalha judicial começou em 2013. As ações tratam dos pedidos de liberação de patentes de janeiro de 1995 a maio de 1997, depositados em caixa batizada de mailbox. Isso porque só em 1994 o Brasil aderiu ao acordo sobre Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao comércio, que permitiu o direito à patente de produtos farmacêuticos e agroquímicos.
“O que houve é que erramos na hora de aplicar a legislação. Estávamos autorizando dez anos a partir da concessão, quando deveria ser 20 anos do pedido. Estamos corrigindo com as ações judiciais. Afinal, não podemos permitir o monopólio indevido de medicamentos diante do enorme interesse público na questão”, justificou o procurador Mauro Maia, do Inpi.
Para o advogado Gabriel Francisco Leonardos, presidente da Comissão de Propriedade Industrial, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), o maior equívoco foi o Inpi não ter cumprido o prazo de análise da concessão das patentes até dezembro de 2004. “As empresas não podem ser prejudicadas”, analisou Leonardos.
Especialista em propriedade industrial, o advogado Eduardo Câmara critica a decisão do Inpi. “Essa mudança é absurda. As empresas investiram porque acreditavam em um prazo que foi reduzido. Há patentes que sequer foram liberas ainda”, protestou Câmara.
Procurado, o advogado Luiz Paulino, do escritório Dannemann Siemsen — que defende os interesses do laboratório Eli Lilly fabricante do Cialis — informou que não se pronuncia sobre processos ainda em tramitação.
INTERESSE SOCIAL
No julgamento das cinco ações no final do mês passado, o desembargador federal André Fontes destacou o interesse social, lembrando que o término da validade das patentes possibilitará a redução dos preços dos medicamentos, com a permissão para empresas concorrentes poderem produzir.
O advogado Pedro Marcos Barbosa, da Associação Brasileira das Indústrias de Química Fina, defende a redução do prazo. “ Os consumidores não podem esperar 15 ou 20 anos. O que as empresas podem fazer é pedir indenização na Justiça”, avaliou Barbosa.