REVISTA FACTO
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Informando ABIFINA • Abril 2006 • ISSN 2623-1177
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//Editorial

Estado e Cidadania para desenvolver a América Latina

Recentes estimativas para o crescimento do produto interno bruto (PIB) de países da América Latina (AL) em 2005, feitas pela CEPAL, demonstraram com bastante clareza a fragilidade de tais economias face às demais nações emergentes no mundo.

O crescimento da AL teve um valor médio de 4,3%, cerca da metade da-quele experimentado pelas grandes nações emergentes no mundo. E, o que é pior, em termos numéricos destaca-se o pífio desempenho da economia brasileira que ficou em 2,3%, somente superando o conflagrado Haiti. O Chile, economia latino-americana muito louvada pelos analistas econô-micos, atingiu crescimento de 6% no PIB, mas é importante destacar que a estabilidade monetária e posterior crescimento sustentado foram alcança-dos pelo uso de taxas de câmbio reais (enquanto o Brasil apreciava artifi-cialmente sua moeda), reduzida taxa de juros e controle do fluxo de capitais externos. Essa situação foi mantida até a assinatura de acordo do Chile com os Estados Unidos – situação bem diversa daquela que ocorreu no Brasil.

Índia e China crescem há 25 anos a taxas entre 7 e 10% ao ano, mas nesses países a mão invisível do mercado é suportada pela mão visível do Estado, expressão usada para caracterizar o uso de uma política desenvolvimentista que é execrada pelo neoliberalismo dominante na área econômica brasileira. Conforme há anos vem sendo denunciado pelo setor produtivo nacional o Ministério da Fazenda desenvolve – com uma fundamentação puramente ideológica já que contraria cristalinos exemplos da China e Índia, um modelo econômico que contém um nítido viés de desindustrialização local, pois que induz a substituição da fabricação doméstica pela importação de produtos alienígenas, justamente o oposto daquilo que interessa ao País. O grande e persistente erro dessa política econômica é usar a abertura do mercado interno aos produtos fabricados no exterior como um instrumento para manter, a qualquer preço, a tão desejada estabilidade de preços. A redução das tarifas de importação visando conter a elevação de preços internos, mesmo que tenha algum sucesso no curto prazo, constitui um tiro no pé, paralisante da atividade produtiva local e, com o câmbio apreciado, inviabiliza indústrias domésticas, gera o desemprego e a queda na renda interna, além de comprometer a autonomia decisória do País.

Na última reunião da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Hong Kong, queixava-se o representante dos Estados Unidos da postura agressiva de alguns países emergentes na disputa por mercados internacionais, protegendo e subsidiando o produtor doméstico. Segundo ele, a China quer ser a fábrica do mundo, a Índia o escritório, o México a maquiladora, numa alusão à febre industrial chinesa, à força indiana no mercado de serviços e à estratégia mexicana de montar e embalar para venda produtos fabricados por outros países.

Nesse cenário, parece que o Brasil não quer nada fora da maniqueísta política monetária praticada por sua área econômica, sem espaços para compensação em políticas desenvolvimentistas. Conforme há anos vem sendo denunciado pelo setor produtivo nacional, o Ministério da Fazenda desenvolve um modelo econômico que contém um nítido viés para a desindustrialização local. O grande e persistente erro dessa política é usar a abertura do mercado interno aos produtos fabricados no exterior como um instrumento para manter, a qualquer preço, a tão desejada estabilidade de preços.

Evidentemente não se trata de um problema criado pelo atual governo federal posto que – e justiça seja feita – fora do renitente grotão existente na área econômica encontram-se briosos e competentes defensores de uma clara política pública, com viés industrial e tecnológico, situação inexistente nos governos surgidos pós – Consenso de Washington, em 1989. Também merecem ser lembradas medidas conduzidas pelo atual governo visando diminuir as injustas assimetrias sociais que separam brasileiros, como divulgados pelo IBGE.

Mas políticas públicas para o desenvolvimento econômico e social têm que passar, necessariamente, pela defesa e apoio ao produtor interno, e não pela sua inviabilização através da prática de juros extorsivos, da manutenção da taxa de câmbio irreal e de exercer pressões para reduzir alíquotas de importação.

Ao longo destes três anos e meio de governo Lula, importantes estudos foram feitos sobre política industrial, tecnológica e de comércio exterior, resultando em diagnósticos que foram apreciados em fóruns construídos em parcerias entre o setor público e o privado, e no envio de sugestões aí aprovadas para execução pelos órgãos competentes. Mas muito pouco dessas sugestões foram implantadas. Positivamente pode-se destacar apenas o BNDES pela ousadia na parceria com a empresa nacional para a inovação tecnológica, o Itamaraty pela firmeza com que impede, em negociações externas, concessões inibidoras do desenvolvimento (propriedade intelectual e investimentos), e os Ministérios do Desenvolvimento e de Ciência e Tecnologia pela introdução do conceito de inovação tecnológica focada na empresa. Imprescindíveis medidas sugeridas na área de poder de compra do Estado, em preços de transferência, para a isonomia no tratamento tributário e sanitário de produtos importados com os fabricados localmente, permanecem insolúveis, com graves prejuízos ao produtor local e à própria sociedade, pois a produção local é que cria os indispensáveis empregos para os brasileiros.

O que falta, então, para se tornar realidade o que já foi claramente definido? Uns dizem que a burocracia é lenta por natureza, que o timing administrativo adotado pelo setor público é bem diferente daquele da área privada. Outros dizem que novas leis precisam ser elaboradas, regulamentos atualizados, recursos humanos formados. Sempre é apresentado um forte e imbatível argumento impeditivo da implementação das medidas definidas nesse cenário – normalmente fora da área de decisão daquele que enuncia a restrição.

Na realidade, depende de todos nós que as coisas aconteçam. Depende de um compromisso de cidadania, que precisa envolver desde o cidadão comum até o empresário, o político e o administrador público. Parece claro que o País precisa de mobilização em torno de um projeto de desenvolvimento que mantenha a estabilidade da moeda, mas que também induza a geração de empregos e renda. É preciso, ainda, muita empolgação e compromisso, como se vê na atitude e no rosto dos milhares de integrantes das Escolas de Samba na Marquês do Sapucaí. Sem nunca terem treinado em conjunto naquela passarela, fazem um harmonioso desfile em exatos 80 minutos. Alcançar esse compromisso de cidadania é o nosso grande desafio.

Nelson Brasil de Oliveira
Nelson Brasil de Oliveira
Vice-presidente de Planejamento Estratégico da ABIFINA.
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