A indústria química brasileira conta em seu currículo com algumas realizações de grande vulto, que revelam capacidade e competência. Nosso parque petroquímico é impressionante.
Já o restante de nossa indústria química, em particular a indústria de química fina e especialidades, tem menos do que se orgulhar: desde o início dos anos 90 que vem sofrendo perdas, que são bem expressas pela redução de 42% do número de produtos da indústria de química fina ocorrida entre 1989 e 1991.* Essa queda é resultado da perda de competitividade decorrente da queda súbita das barreiras alfandegárias. Atualmente, depois de muitos anos de desempenho pífio, a química fina apresenta resultados razoáveis. No entanto, tais resultados não escondem que nossa indústria não apresenta boa tendência de desempenho, fora o fato de estar aquém das necessidades do país, conforme denota o balanço de pagamentos muito negativo, que só tem feito aumentar ao longo dos anos. Um outro indício de como andam as coisas é dado pelos preços médios pagos pelas nossas importações de produtos de química fina, comparados aos preços médios de nossas exportações: em 2005 as importações de fármacos apresentaram um preço médio 5 vezes superior ao das exportações, enquanto que no segmento de defensivos as importações foram 30% mais caras. Nossa indústria agrega pouco valor.
Embora estejam previstos grandes investimentos em petroquímica, tudo indica que estejamos esgotando as últimas possibilidades de aumento de capacidade baseadas em matérias-primas disponíveis localmente. A indústria de química fina ainda não apresentou os resultados concretos da política industrial do atual governo. Outros segmentos não apresentam avanços. Desta forma, torna-se difícil formar um quadro otimista do futuro do setor químico brasileiro. O que se pode antecipar é que haja, sobrevindo uma fase de crescimento mais acentuado da economia, aumentos significativos da demanda, com dificuldades de acompanhamento da oferta. A questão que se apresenta prioritariamente, nesse contexto, não é a do balanço de pagamentos, mas sim a de o que fazer para encarar o desafio apresentado por futuros desbalanceamentos entre oferta e demanda, em época de investimentos módicos na indústria química nacional e até mesmo internacional. A química fina poderia ser o desaguadouro de investimentos, principalmente se for considerado que nesse segmento podem apresentar-se oportunidades economicamente atraentes. Aí estão as experiências de China, Índia, Israel e Irlanda para demonstrar essa atratividade, e a importância do conhecimento como fator primordial de agregação de valor.
Na busca da competitividade, que é a chave do sucesso, uma comparação entre a química fina e outros segmentos, aponta para a maior importância relativa do input intelectual, especialmente a proficiência em química. Se nossas matérias-primas petroquímicas não são abundantes e nossa mão-de-obra não é barata, equacionamentos dessa situação terão que passar pelo emprego de rotas químicas competitivas em custo e de matérias-primas disponíveis, cuja utilização também passa pela sofisticação química, na medida em que implica no desenvolvimento de novos processos, produtos e aplicações. Antes de qualquer outra coisa, é preciso, caso se deseje que nossa indústria possa avançar significativamente, que exista uma competência em química muito acentuada. Se não se pode por um lado negar a existência de talentos e de bolsões de competência em núcleos de P&D estabelecidos em empresas, centros de pesquisas e universidades, por outro lado também não se pode negar que a competência disponível está muito aquém das necessidades do país, se for considerado um cenário de evolução radical de nossa indústria. E a mesma constatação é válida quando se considera o estabelecimento de indústrias estrangeiras no país. É difícil imaginar o referido cenário sem que haja uma melhoria radical do ensino universitário de química (a ciência e as práticas que dela derivam) e uma intensificação de pesquisa e desenvolvimento em todas as esferas em que estes possam ser praticados. É preciso também que haja uma compreensão profunda de que a pesquisa deve, de forma predominante, ter missões definidas – não castrar a pesquisa científica, mas buscar a obtenção de conhecimentos que possam ter utilidade.
É preciso desenvolver uma visão clara da importância econômica do conhecimento e agir no sentido de: (a) formar uma elite de pesquisadores em Sínteses Orgânicas e em Produtos Naturais, visando ao aproveitamento químico de nossas fontes renováveis (campo em que deveremos possuir um forte diferencial competitivo), e (b) destinar um papel focal a P,D&I nas Universidades e Centros de Pesquisas, em estreita colaboração com o setor produtivo.