REVISTA FACTO
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Informando ABIFINA • Fevereiro 2006 • ISSN 2623-1177
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//Editorial

Ainda sobre o encontro da OMC em Hong Kong

A 6ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), realizada no período compreendido entre 13 e 18 de dezembro de 2005, em Hong Kong, na China, é mais um evento componente da Rodada de Doha, organizada pela instituição. Esta rodada foi iniciada em 2001 destinando-se a definir mudanças nos acordos firmados no âmbito do GATT pela Rodada  Uruguai, concluída em Marraqueche no ano de 1994, mas cujos resultados se mostraram extremamente desequilibrados quanto aos direitos e obrigações das partes, ao promover a prosperidade de poucos países desenvolvidos em detrimento da maioria em desenvolvimento. A Conferência de Hong Kong, a despeito da descrença de muitos analistas, se constituiu num proveitoso encontro envolvendo representantes de mais alto nível dentre os 149 países membros da OMC.
A Declaração Ministerial, emitida no dia 18 de dezembro, enfatiza tópicos de extrema relevância para os países em desenvolvimento, numa demonstração clara de que negociações internacionais requerem competência e organização, como apresentados pelo Grupo dos 20 países coordenados pelo Brasil, e não passam pela simples subserviência às nações de primeiro mundo, como ocorreu no passado. Dentre os tópicos constantes da Declaração emitida pela 6ª Conferência da Rodada de Doha devem ser destacados:
• Pela primeira vez é fixada uma data definida para a eliminação de todas as formas de subsídios às exportações de produtos agrícolas, a ser implantada gradativamente até 2013 – data limite, mas com substancial corte a ser efetuado antes de 2010.
• Deve ser ressaltado, também, que pela primeira vez foi acordado que haverá uma efetiva abertura no mercado agrícola dos países de primeiro mundo como pré-requisito para maiores concessões no mercado de produtos industrializados e de serviços, localizados nos países em desenvolvimento.
• Todas as formas de subsídios para o algodão deverão ser eliminadas pelos países desenvolvidos até o final de 2006, coincidindo com o término da Rodada de Doha.
• Plena convergência no que concerne ao tratamento diferenciado entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, matéria que pode parecer requinte técnico, mas que efetivamente terá uma ampla repercussão favorável aos menos desenvolvidos, ao longo das futuras negociações internacionais no âmbito da OMC.
• Preservação de espaços que permitam a adoção de políticas públicas visando promover o desenvolvimento econômico, industrial e social dos países menos desenvolvidos em áreas do seu interesse estratégico.
• Redução das tarifas de importação, que protegem indústrias domésticas, através do mecanismo conhecido como “fórmula suíça” com mais de um coeficiente, significando tratamento diferenciado para países mais e menos desenvolvidos. Esse instrumento permitirá a realização de uma abertura comercial do mercado interno de produtos industrializados, localizados nos países em desenvolvimento, por estes monitorada de forma mais ou menos ampla, em função da abertura real que vier a ocorrer no mercado agrícola dos países desenvolvidos.
Como uma síntese da 6ª Conferência da Rodada de Doha pode-se afirmar que o Brasil, contando com forte suporte da China e da Índia, conseguiu consolidar uma posição de liderança no Grupo dos 20, além de alcançar uma expressiva conciliação de interesses de todos os países em desenvolvimento que, no âmbito da OMC, excedem ao número de cem nações independentes. Trata-se de um esforço hercúleo, competentemente desenvolvido em low profile pelo Itamaraty, que terá amplas e favoráveis repercussões em futuras negociações nesse nível, e que foi iniciado na 4ª Conferência da Rodada de Doha, realizada em Cancun em 2003 e, igualmente, considerada de resultados frustrantes por muitos analistas pouco afeitos a tais atividades.
Nesse cenário é oportuno lembrar que em agosto/2005 vazaram informações contidas em documento elaborado por economistas do Ministério da Fazenda, onde era sugerida a redução drástica das tarifas aduaneiras consolidadas pelo Brasil na OMC, de 35% (máximo) para algo em torno de 10%. O objetivo perseguido nessa proposta repetia equivocada estratégia usada nos anos 90, quando se acreditou que uma generosa e unilateral concessão feita pelo Brasil resultaria num amplo reconhecimento ao seu gesto e, em decorrência, haveria também uma generosa retribuição pelo mundo desenvolvido. Essa simplória e ineficaz linha de pensamento levou ao sucateamento de expressivo parque produtivo nacional nos anos 90, sem qualquer ganho de mercado externo.
Nesse cenário foi dito que o Brasil deveria abrir sua economia ao mesmo nível alcançado pelos demais países emergentes no mundo. No entanto, competente estudo realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostrou que o Brasil, ao contrário de crença muito difundida, é uma economia mais aberta, menos protetora do mercado interno do que China, África do Sul, Índia, México, Rússia, Tailândia, Venezuela e Vietnã, perdendo somente para a Coréia, para ficar apenas no rol dos países emergentes.
O Brasil na Rodada de Doha, em especial a partir da Conferência de Cancun, passou a agir maduramente no tabuleiro de negociações internacionais, fazendo concessões de seu mercado interno – SIM, mas em retribuição às simultâneas aberturas em mercado internacional e com preservação de espaços para políticas públicas visando o desenvolvimento. Esse é o aspecto mais importante das negociações internacionais que vem sendo competentemente conduzidas pelo Itamaraty desde 2001 no contexto da Rodada de Doha, que, esperamos, sinalize a forma de atuação futura desse ministério.

Nelson Brasil de Oliveira
Nelson Brasil de Oliveira
Vice-presidente de Planejamento Estratégico da ABIFINA.
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