REVISTA FACTO
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Informando ABIFINA • Janeiro 2006 • ISSN 2623-1177
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//Editorial

2006, mudar para desenvolver

A estabilidade macroeconômica, representada pelo rígido controle do processo inflacionário, é de importância inquestionável, mas em seu nome não podem deixar de ser implantadas medidas desenvolvimentistas pelo simples temor da mudança. Mudar regras e sistemas que não demonstrem impacto no equilíbrio macroeconômico, não somente é possível como também desejável.
O segmento de fármacos da química fina no ano de 2004 foi classificado como prioritário no contexto da política industrial, tecnológica e de comércio exterior criada pelo governo Lula, sendo em decorrência definidas as medidas que deveriam ser implantadas para se obter os efeitos desejados. Nesse cenário, no entanto, 2005 foi um ano extremamente frustrante pela resistência às mudanças apresentadas pelo ente público que as deveria implantar.
Assim, o uso do poder de compra do Estado como instrumento para promover o desenvolvimento industrial do país, conforme demonstra o magnífico exemplo do Buy American Act nos Estados Unidos, foi déia aceita por todos no Brasil, mas não saiu do papel na área da saúde pública como proposta para promover a fabricação local de estratégicos fármacos.
A utilização do sistema de preços de referência nas relações entre subsidiária e matriz estrangeira como instrumento destinado a fomentar a agregação de valor nos processos produtivos instalados no Brasil, a despeito dos alertas, continua a ser aplicado no sentido inverso, tributando-se mais as matérias-primas do que os produtos delas decorrentes – claro incentivo às importações de produtos fabricados no exterior, num viés de anti-política industrial.
A Lei da Inovação introduziu conceitos de excepcional importância mundial, com destaque para a subvenção econômica ser feita diretamente pelo Estado às empresas produtivas com linhas de financiamento a juros subsidiados para a inovação e o desenvolvimento tecnológico. De forma expressiva, porém, apenas o BNDES atua nesse sentido valendo-se de seus lucros, amplas disponibilidades de caixa e persistência de dirigentes, pois o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) foi quase integralmente contingenciado pelo Tesouro Nacional.
A Lei de Incentivos Fiscais para a Inovação Tecnológica, ainda por pressão do Tesouro Nacional, restringiu seus efeitos às grandes empresas, aquelas que já realizam P&D, ao limitar sua aplicação para aquelas que usam o sistema de lucro real – mais de 90% das empresas operando no país valem-se do sistema do lucro presumido por permitir a redução de despesas administrativas para o controle fiscal. Ainda assim teme-se pela regulamentação dessa lei que será feita pela Receita Federal, pois este órgão já regulamentou dispositivo legal contido na MP 66 no sentido oposto à vontade do legislador.
O Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), órgão de fundamental importância para o soberano desenvolvimento tecnológico e industrial do país, continua impedido de se valer dos recursos provenientes de taxas cobradas pela prestação de serviços para contratar e capacitar novos efetivos humanos requeridos para o atendimento de seus estratégicos objetivos. Mesmo tendo captado recursos via prestação de serviços, a burocracia do Estado impede o INPI de atender suas atribuições – e ainda desvia recursos do contribuinte para finalidades outras para as quais foi tributado.
O sistema tarifário de produtos importados no mundo inteiro é usado para proteger o produtor doméstico, no máximo sendo usado como instrumento de barganha em negociações internacionais – visando concessões recíprocas. No Brasil de 2005 as alíquotas de importação de defensivos agrícolas fabricados no país foram unilateralmente reduzidas pela CAMEX para atender visão maniqueísta da área econômica – incentivando-se, assim, a importação de produtos fabricados no exterior, criando-se empregos e renda lá fora.
O registro sanitário de produtos destina-se a proteger o cidadão contra a eventual comercialização de medicamentos ou agroquímicos sem a qualidade requerida para consumo humano ou agressão ao meio ambiente. No final de 2005 o Congresso Nacional, sob forte lobby dos representantes da agricultura, pretende aprovar medida que permita o reconhecimento do registro sanitário de agroquímicos no Paraguai e Uruguai, países revendedores de produtos chineses sem atender minimamente ao padrão técnico requerido do produto fabricado no Brasil, sob controle do IBAMA, da ANVISA e do Ministério da Agricultura. E nas licitações públicas realizadas pelos laboratórios oficiais do Brasil, a despeito das denúncias do setor produtivo de fármacos aqui instalado, feitas ao longo de 2005, a certificação das boas práticas de fabricação através das auditorias e fiscalizações a que são submetidos, não é requerida para os produtos e fabricantes do exterior – são aceitas simples declarações, sem auditoria da empresa apresentada como fabricante.   
Os problemas acima relatados não decorrem de ações, inações ou de simples falta de visão estratégica dos atuais governantes. Derivam, essencialmente, da cultura processualística ibérica, implantada durante o período da colonização brasileira, sem compromisso com resultados pois os processos administrativos ou jurídicos eram montados aqui, mas as decisões eram tomadas pela coroa portuguesa. Com a independência do Brasil – herdada, a coroa foi substituída pela elite local conservadoramente resistente a mudar. Infelizmente nossa independência não se constituiu numa efetiva ruptura com o passado colonial, como ocorreu com os Estados Unidos no final do Século XVIII, ao criar um Estado Nacional com responsabilidades individuais para com a nova nação, assumidas por todos .
Quem sabe poderíamos iniciar 2006 buscando um viés de mudança em nossos hábitos e procedimentos, cada um assumindo seu papel no processo de desenvolvimento nacional, partindo de uma sólida base ética, de solidariedade humana e de compromisso com os supremos interesses nacionais – num pleno exercício de efetiva cidadania.

Nelson Brasil de Oliveira
Nelson Brasil de Oliveira
Vice-presidente de Planejamento Estratégico da ABIFINA.
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