REVISTA FACTO
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Set-Dez 2024 • ANO XVIII • ISSN 2623-1177
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A taxonomia verde ajudando o Brasil no financiamento sustentável: o Projeto de Lei 5209/2023
//Artigo

A taxonomia verde ajudando o Brasil no financiamento sustentável: o Projeto de Lei 5209/2023

A taxonomia verde é uma iniciativa de padronização, dentro do contexto do desenvolvimento sustentável, que possibilita o mapeamento de ativos e projetos sustentáveis. Ou seja, uma atividade praticada por uma empresa, que ela considera sustentável, poderá ser validada como “verde”, baseada em indicadores científicos pré-determinados pela padronização. É uma resolução que permite aos investidores financeiros públicos e privados mapear ações sustentáveis, inclusive, em diferentes jurisdições.

A primeira taxonomia verde oficial foi criada em 2020, em virtude da adesão da União Europeia (UE) ao Acordo de Paris. Considerada pioneira, a Taxonomia da UE não só definiu padrões voltados para o meio ambiente, como a exclusão de combustíveis fósseis, mas também ponderou indicadores sociais, como análise de ciclo de vida, considerando a dimensão social da atividade. Estas características fizeram (e fazem) a Taxonomia da UE ser usada como modelo em todo o mundo.

Nesse sentido, outras práticas se destacam, como a Climate Bonds Iniciative (CBI), organização internacional sem fins lucrativos que emite às empresas a certificação de títulos verdes que se enquadrem na sua taxonomia. Lançada em 2013 e atualmente na sua terceira versão, a Taxonomia da CBI foca principalmente a mitigação e a adaptação às mudanças climáticas para produtos financeiros, facilitando a transferência de recursos para investimentos resilientes e de baixo custo de carbono (CBI, 2024; Pfaff; Altun; Jia, 2021).

Nos últimos cincos anos, diversos países e jurisdições têm se debruçado sobre a criação e implementação das suas próprias taxonomias verdes.

Seguindo o exemplo da UE e da China (países pioneiros no estabelecimento dessa padronização), jurisdições como Malásia, África do Sul, Colômbia e México já contam com seus documentos direcionando seus ativos verdes. O Brasil também caminha nessa direção.

Iniciativas para a criação da taxonomia verde no Brasil

No Brasil, a primeira iniciativa de alocação de recursos financeiros sustentáveis foi da Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN), em 2015. A Taxonomia da FEBRABAN viabilizou relatórios anuais que demonstram, por meio de índices, as atividades econômicas verdes e possibilitam a destinação de ativos bancários sustentáveis. Em 2019, esse documento foi atualizado, classificando as atividades do setor financeiro de acordo com sua contribuição ao meio ambiente em economia verde, exposição às mudanças climáticas e exposição ao risco ambiental. Com isso, a FEBRABAN, além de se destacar como precursora, abriu o debate nacional para o direcionamento dos investimentos financeiros sustentáveis, bem como o gerenciamento da mitigação dos riscos socioambientais (FEBRABAN, 2021).

Seguindo nessa linha, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) apresentou dois documentos importantes, em 2020 e 2021, voltados ao agronegócio nacional, setor que mais gera gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera (CWD, 2022). Em 2020, o Mapa publicou um relatório detalhando os ativos da agroindústria, para incentivar os

investidores no financiamento dos títulos que poderiam ser rotulados como “verdes” (CBI, 2020). No ano seguinte, em 2021, o Ministério também publicou um Plano Setorial para Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária, o Plano ABC+, para reduzir as emissões de GEE e manter a resiliência às mudanças climáticas no setor da agricultura (Brasil, 2023b).

Outro ponto de avanço foi a proposição do Projeto de Lei (PL) 5209/2023 que estabeleceu leis e diretrizes para o desenvolvimento da Taxonomia Verde Nacional. Atualmente, o PL está na Comissão de Meio Ambiente do Senado, aguardando relatoria. Com a intenção de padronizar os critérios de seleção, tornar as negociações transparentes e atrair capital, o PL foi um dos primeiros movimentos do governo para a criação de uma taxonomia nacional. O projeto definiu ainda sete indicadores ambientais: 1) quantidade, composição e qualidade dos resíduos sólidos efluentes líquidos e emissões atmosféricas poluentes; 2) origem e eficiência da energia utilizada; 3) uso eficiente da água e forma de tratamento de efluentes; 4) rastreabilidade na seleção e eficiência no uso de matéria- prima ou insumos; 5) impactos relacionados ao desmatamento ilegal e à biodiversidade local e regional; 6) emissão, redução e sequestro de gases de efeito estufa; 7) outros definidos em regulamento (Brasil, 2023a).

Embora seja extremamente positivo a proposição do PL, vale relembrar que este carece de algumas melhorias. Faltam mais detalhes dos indicadores, bem como melhor padronização, de forma a não abrir margens para múltiplas interpretações. É necessário que esse PL esteja articulado ao Plano de Transformação Ecológica do Governo Federal, de modo que se exponham de maneira bem clara as definições dos índices ambientais e sociais (Coalizão Brasil, 2024).

O Plano de Transformação Ecológica foi uma iniciativa do Governo Federal para fomentar as relações e o crescimento sustentável do Brasil. Em vigência e lançado em 2023, o Plano pretende estimular investimentos verdes e reduzir as desigualdades sociais, com foco em seis eixos: I – finanças sustentáveis; II – adensamento tecnológico; III – bioeconomia; IV – transição energética; V- economia circular; e VI – nova infraestrutura. Nessa conjuntura, o primeiro eixo é um dos propósitos atuais do Ministério da Fazenda, objetivando a regulação do mercado de carbono e de títulos soberanos sustentáveis, além da criação da Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB), de modo a regulamentar e padronizar os ativos verdes nacionais (Brasil, 2023b; Maximo, 2023).

Plano de Ação para a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB)

Em 2023, o Governo Federal lançou para consulta pública o Plano de Ação para a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB). A ideia do lançamento era discutir, entre os diversos atores da sociedade, as metas para o desenvolvimento socioambiental e de finanças sustentáveis. Baseado nas taxonomias da UE, da Colômbia e do México, o Plano visou definir e descrever a implementação e monitoramento dos indicadores socioambientais e debater o Plano entre grupos técnicos, temáticos e setores da sociedade (Brasil, 2023b).

O Plano apresentou onze objetivos específicos, dos quais sete eram voltados para a temática ambiental e quatro, para a social. Os objetivos específicos ambientais eram: mitigação da mudança do clima; adaptação às mudanças climáticas; proteção e restauração da biodiversidade e ecossistemas; uso sustentável do solo e conservação, manejo e uso sustentável das florestas; uso sustentável e proteção de recursos hídricos e marinhos; transição para economia circular; e prevenção e controle de contaminação. Já os objetivos específicos sociais eram: geração de trabalho decente

e elevação da renda; redução das desigualdades socioeconômicas; redução das desigualdades regionais e territoriais do País; e promoção da qualidade de vida, com ampliação do acesso a serviços sociais básicos (Brasil, 2023b).

Para o sucesso da conquista desses objetivos específicos é extremamente necessário o processo de conscientização dos atores envolvidos, além da construção dos índices técnicos e científicos em conjunto com os diversos setores do mercado e sociedade. Essa dificuldade não é um fato novo: muitos desafios foram encontrados na implementação de taxonomias de outras jurisdições. Sabendo disso, o Governo Federal buscou incentivar o diálogo entre o Grupo de Trabalho (GT) responsável pela TSB e os atores mais variados e relevantes para a discussão (Brasil, 2023b).

Partindo da premissa de que a TSB será um documento vivo, sempre disponível para revisão e atualização, o Ministério da Fazenda realizou uma série de debates que englobavam os objetivos gerais. De modo a ouvir opiniões de órgãos do Governo Federal, bem como os grupos técnicos e setoriais, o GT buscou definir estratégias para garantir a implementação da TSB, prevista para 1º de Janeiro de 2026. Dentre os últimos debates, o assunto de destaque foi a coibição da técnica de lavagem verde, ou greenwashing (quando uma empresa obtém vantagens se passando por sustentável, quando, na verdade, não o é) (Brasil, 2023b, 2024).

Levando em conta os debates e o Plano para TSB, além do Plano de Transformação Ecológica, é muito positivo ver a ação do Governo Federal para movimentar a economia na direção de ações mais sustentáveis, incentivando investimentos verdes, além de reduzir as desigualdades sociais.

Perspectivas

A necessidade de se regulamentarem os investimentos para uma economia que busca um maior desenvolvimento sustentável, assim como a redução das desigualdades sociais, tem gerado ações e movimentos que buscam maior efetividade e decisões mais assertivas. A implementação da TSB é uma oportunidade importante de crescimento sustentável, com grandes chances de impulsionar o País a ser um modelo em finanças sustentáveis.

No entanto, embora seja extremamente essencial e apresente metas para o desenvolvimento sustentável, o Plano para a TSB deve enfrentar alguns ajustes até seu lançamento.

Ao mesmo tempo, o lançamento da TSB está sendo aguardado com muita atenção pelos especialistas da área e os principais investidores. Com os devidos ajustes e revisões, será um dos grandes passos rumo ao desenvolvimento econômico sustentável, demonstrando o potencial para investimentos nacionais, além da demonstração do compromisso do Brasil com a qualidade de vida da sua população e com a emergência climática.

Referências

BRASIL. Ministério da Fazenda. Aplicabilidade na indústria e Índice de Equidade de Gênero e Raça são temas de GTs da Taxonomia Sustentável. Brasília, 2024. Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2024/outubro/aplicabilidade-na-industria-e-indice-de-equidade-de-genero-e-raca-sao-temas-de-gts-da-taxonomia-sustentavel. Acesso em: 1 nov. 2024.

BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei N° 5209, de 2023. Estabelece normas e diretrizes para o desenvolvimento e aplicação da Taxonomia Verde Nacional. Brasil, 2023a. Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9490421. Acesso em: 14 ago. 2024.

BRASIL. Taxonomia Sustentável Brasileira: plano de ação para consulta pública. Brasília: Ministério da Fazenda, 2023b. Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/orgaos/spe/taxonomia-sustentavel-brasileira/taxonomia-sustentavel-brasileira.pdf. Acesso em: 10 ago. 2024.

CBI. Destravando o potencial de investimentos verdes para agricultura no Brasil. Brasil: Climate Bonds Iniciative, 2020. Disponível em: https://www.climatebonds.net/files/reports/brazil_agri_sumario_executivo.pdf. Acesso em: 14 ago. 2024.

CBI. What we do. United Kingdom: Climate Bonds Iniciative, 2024. Disponível em: https://www.climatebonds.net/about/what-we-do. Acesso em: 18 ago. 2024.

COALIZÃO BRASIL. Coalizão. Coalizão monitora temas agroambientais prioritários no Congresso. São Paulo, SP, 2024. Disponível em: https://coalizaobr.com.br/coalizao-monitora-temas-agroambientais-prioritarios-no-congresso/. Acesso em: 4 nov. 2024.

CWD. Brazil: what are Brazil’s greenhouse gas emissions and emissions targets? Washington, DC: Climate Watch Data, 2022. Disponível em: https://www.climatewatchdata.org/countries/BRA?end_year=2021&start_year=1990. Acesso em: 18 ago. 2024.

FEBRABAN. Guia explicativo da taxonomia verde da FEBRABAN. São Paulo, SP: [s. n.], 2021. Disponível em: https://cmsarquivos.febraban.org.br/Arquivos/documentos/PDF/Guia_Explicativo_da_Taxonomia_Verde_da_FEBRABAN.pdf. Acesso em: 12 ago. 2024.

MAXIMO, W. Agência Brasil. Entenda o Plano de Transformação Ecológica lançado na COP28. Brasília, 2023. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2023-12/entenda-o-plano-de-transformacao-ecologica-lancado-na-cop28. Acesso em: 4 nov. 2024.

PFAFF, N.; ALTUN, O.; JIA, Y. Overview and recommendations for sustainable finance taxonomies. Zurich: International Capital Market Association (ICMA), 2021. Disponível em: https://www.icmagroup.org/assets/documents/Sustainable-finance/ICMA-Overview-and-Recommendations-for-Sustainable-Finance-Taxonomies-May-2021-180521.pdf. Acesso em: 10 ago. 2024.

Suzana Borschiver
Suzana Borschiver
Professora titular da Escola de Química da UFRJ e coordenadora do Núcleo de Estudos Industriais e Tecnológicos (NEITEC).
Thais Lima de Paiva
Thais Lima de Paiva
Pesquisadora do NEITEC.
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