Em meio a um cenário de transformação para a indústria nacional, o empresário Pedro Wongtschowski, doutor em Engenharia, conselheiro de diversas instituições e membro do Conselho Consultivo da ABIFINA, vê com otimismo o futuro da indústria brasileira. Ele analisa as recentes iniciativas governamentais e elogia o retorno da preocupação com o setor por meio da Nova Indústria Brasil, mas sublinha a necessidade de maior clareza nas ações propostas para que se traduzam em resultados concretos.
Wongtschowski também ressalta o novo dinamismo do BNDES, que tem atuado com maior agilidade e foco na inovação e na descarbonização, além do papel fundamental do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) no financiamento de projetos inovadores.
Qual é a sua avaliação sobre a Nova Indústria Brasil?
Julgo muito positivo que o governo brasileiro volte a se preocupar com a indústria brasileira. É notória a importância da indústria na criação de empregos de qualidade, como grande contribuidora de impostos, como geradora de atividades de pesquisa e desenvolvimento e como grande exportadora. A Nova Indústria Brasil é uma iniciativa importante, mas acredito que ela ainda carece de um detalhamento maior, tornando as ideias lá lançadas realmente geradoras de ação.
Quais ações recentes do governo favorecem a indústria?
Em primeiro lugar é importante ressaltar a mudança de escala da ação do BNDES. Há um novo dinamismo na instituição, com maiores recursos, redução de custos, rapidez de julgamento e um grande e positivo impulso em favor da inovação e da descarbonização da indústria brasileira. Adicionalmente, é importante citar o impacto positivo da depreciação acelerada para bens de capital – o governo lançou o programa no fim de maio para incentivar a modernização do parque industrial. Finalmente, há a expectativa de um volume maior de recursos para a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), excelente forma de alavancar recursos privados e incentivar a inovação industrial.
O momento do Brasil é do agronegócio e de serviços?
O agronegócio tem uma enorme importância para o País, assim como o setor de serviços. Mas ambos são inviáveis ou não-competitivos sem um grande conjunto de bens industriais. Assim, não há agricultura moderna sem irrigação, drones, sensores, computadores, equipamentos de plantio, colheita, beneficiamento, transporte. Não há agricultura competitiva sem defensivos agrícolas e fertilizantes. São todos produtos industriais. O mesmo ocorre no setor de serviços, inviável sem computadores, sem eletrônica e sem equipamentos de diversas naturezas.
Há futuro para a indústria no Brasil?
Certamente. Primeiro por existirem setores em que o Brasil é o “low cost producer”, como etanol, açúcar, celulose, minério de ferro, suco de laranja, nióbio e, provavelmente, soja e milho. Segundo, por existirem setores em que os produtos devem atender a demandas específicas de um país grande e complexo como o Brasil: nosso solo é distinto, nossas pragas são outras, nosso clima é peculiar e, especialmente, nosso consumidor tem características únicas. Terceiro, por termos uma tradição industrial forte, uma população criativa, inovadora e trabalhadora, e uma base científica e tecnológica sólida. Finalmente, há setores em que nossa indústria já se internacionalizou, como a aeronáutica, a eletromecânica, a farmacêutica e a química.
O FNDCT está cumprindo o seu papel?
O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico transformou-se na principal fonte de financiamento para as atividades de ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Graças a uma aliança histórica da comunidade empresarial com a científica, conseguiu-se aprovar uma lei complementar que veta o contingenciamento de seus recursos. Hoje são cerca de R$ 12 bilhões anuais de recursos. Metade é destinada a financiar a inovação (via Finep). A outra metade é de recursos não-reembolsáveis para projetos inovadores da indústria e para apoiar a academia e as Instituições de Ciência e Tecnologia (ICTs) nacionais. Há ainda certa dispersão de recursos em projetos de baixo impacto, situação a ser corrigida no futuro.
O Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável do governo, o Conselhão, encaminhou uma proposta de “Polos Tecnológicos de Alto Impacto”. O assunto progrediu?
Sim. Houve a edição de um decreto presidencial (Decreto 12.081 de 27/06/24) criando a Iniciativa Nacional de Projetos Tecnológicos de Alto Impacto, com a finalidade de apoiar projetos de porte que gerem produção local de itens de conteúdo tecnológico relevante. O objetivo final é fortalecer a indústria, gerar empregos, produção e exportação de produtos diferenciados. Espera-se brevemente a publicação de uma Portaria Interministerial que defina a governança do programa.
Quais são os principais desafios para o setor de química fina no Brasil?
Julgo o setor essencial para garantir o atendimento de um grande conjunto de mercados como os de especialidades químicas, de defensivos agrícolas e de fármacos para uso humano e animal. O papel do governo é central para garantir recursos a custos adequados para investimentos e para ajudar no desenvolvimento de tecnologia e na inovação. Na área de fármacos e medicamentos, o governo deve usar o poder de compra do Estado para favorecer a indústria instalada no País. Escala adequada, apoio para P&D, financiamento com custos adequados, legislação apropriada em propriedade intelectual e aplicação das regras internacionais de defesa comercial são as bases para a existência de uma indústria local competitiva.
A realização da 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP 30) no Pará pode contribuir para o desenvolvimento do Brasil?
Certamente é uma oportunidade única para o País afirmar-se como potência ambiental. Esperemos não perdê-la. Há preocupação com o ritmo de preparação para a COP 30, que muitos julgam lento demais. O “High Level Champion”, tradicionalmente uma figura respeitada do setor privado, ainda não foi definido pelo governo brasileiro.