REVISTA FACTO
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Jun-Ago 2024 • ANO XVIII • ISSN 2623-1177
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Avança a cooperação com foco na Química Fina brasileira
//Matéria Política

Avança a cooperação com foco na Química Fina brasileira

Nova Indústria Brasil (NIB) ganha força para dinamizar o segmento industrial. Conheça as ações, recursos e impactos observados

Lançada em janeiro e atualizada em agosto, a Nova Indústria Brasil (NIB) retomou o conceito de política industrial no País, com o objetivo de impulsionar o setor produtivo, destacando os segmentos de química fina, biotecnologia e suas especialidades. Tanto é que, durante o lançamento da nova etapa da NIB, cujo foco principal foi a saúde, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ressaltou o compromisso do Governo Federal em fortalecer o setor e transformar o Brasil em potência global nessa área. 

Estruturada em seis missões, a NIB conta com R$ 342,7 bilhões em recursos até 2026 e diversas ações em implementação, o que representa um passo adiante para o desenvolvimento da indústria brasileira, como destaca o presidente da ABIFINA, Odilon Costa.

“Precisamos de políticas de Estado para dar previsibilidade aos investidores e àqueles que colocam o crescimento do Brasil em primeiro lugar”, afirmou Costa durante evento em junho no Rio de Janeiro, que marcou os 38 anos da ABIFINA (confira a cobertura completa na página 18).

Odilon Costa, Presidente da ABIFINA

No âmbito da NIB, que ganhou mais recursos, parceiros, ações e metas na revisão de agosto, agentes públicos e privados avançaram num ambiente de cooperação para fomentar a indústria. Tal articulação já está gerando resultados, que podem ser observados em atividades e números. 

“Vivemos uma situação institucional ímpar, marcada por um alinhamento muito forte. Temos uma política industrial muito bem estabelecida e recursos financeiros para fazer frente às demandas”, disse o superintendente de Inovação da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), Rodrigo Secioso. 

Os recursos são, de fato, expressivos e contemplam diversas áreas. Exercendo a função de secretaria-executiva do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), a Finep é responsável por R$ 40 bilhões do total de R$ 61 bilhões do Programa Mais Inovação Brasil, cujo objetivo é estimular as atividades inovativas e fortalecer as cadeias produtivas no País, conferindo maior autonomia tecnológica ao Brasil. Com taxas de juros diferenciadas, o programa envolve temáticas como a saúde, a agroquímica e a bioeconomia.

A Finep atua em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) neste programa e, de modo mais amplo, no Plano Mais Produção, que é a principal ferramenta de financiamento da NIB e terá R$ 250 bilhões somente do banco até 2026. Compondo a articulação pela indústria, a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) também é gestora do Plano. 

De acordo com informações do BNDES, referentes ao fim de julho deste ano, já foram aprovados R$  30,9 bilhões em 101,5 mil projetos entre 2023 e 2024, vinculados aos quatro eixos de atuação do Plano: produtividade, exportação, inovação e verde. 

Focando no Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS), os valores aprovados pelo banco chegam a R$ 4 bilhões – que, somados aos investimentos do PAC Saúde e da Finep, totalizam R$ 16,4 bilhões. O BNDES pretende realizar novas operações no valor de R$ 1,5 bilhão para o setor, incluindo a estruturação de um Fundo de Investimento de R$ 250 milhões em biotecnologia para startups de saúde, junto com a Finep e instituições privadas.

Ao todo, com os investimentos privados que foram anunciados para o período até 2026, o volume de recursos previstos para o CEIS é de R$ 57,4 bilhões, o maior nas últimas décadas. 

Além dos números elevados, a chefe do Departamento do Complexo Industrial e de Serviços da Saúde do BNDES, Carla Reis, ressalta o papel de coordenação exercido pelo banco.  

“O BNDES está sempre disponível para discutir não só o papel do financiamento, mas também o apoio que nós podemos dar na articulação entre o governo e o setor privado em prol da ampliação do acesso da população à saúde de qualidade”, destacou Reis. 

Prioridades e revisões da NIB

Nesse contexto, o secretário de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (SDIC/MDIC), Uallace Moreira Lima, defende o Mais Produção como elemento estratégico para a NIB, exercendo papel semelhante ao do Plano Safra para o agronegócio.

“O Plano oferece previsibilidade de oferta de crédito para financiar o desenvolvimento industrial”, apontou o secretário, ressaltando a importância do financiamento com taxas de juros adequadas para o processo de inovação, que é marcado pelos riscos e pela maturação em longo prazo.

Moreira Lima acrescenta que tal modalidade de crédito diferenciado é essencial para os setores de química fina, biotecnologia e suas especialidades, pois representam um segmento estratégico contemplado na missão 2 da NIB, que visa alcançar um Complexo Econômico-Industrial da Saúde resiliente para reduzir as vulnerabilidades do SUS e ampliar o acesso à saúde. A meta é aumentar de 42% para 70% até 2033 a produção no País das necessidades nacionais em termos de medicamentos, vacinas, insumos, materiais e outras tecnologias nessa área.

“Não existe proteção à vida sem um Complexo Econômico-Industrial da Saúde bem formado e articulado. Por isso, é o único setor que possui uma missão específica”, destacou o secretário, apontando a relevância de incluir outras instituições públicas no Plano, como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco da Amazônia e o Banco do Nordeste. Os dois últimos entraram como parceiros na revisão de agosto, com R$ 31,1 bilhões em linhas de crédito, reforçando a capilaridade da NIB.

Para o secretário do MDIC, a articulação entre governo, instituições de pesquisa, universidades e empresas é essencial para fomentar a inovação e o desenvolvimento industrial. O objetivo é a geração de emprego e renda, com foco na sustentabilidade e na transformação digital, aspectos que vêm sendo salientados pelo vice-presidente da República e ministro do MDIC, Geraldo Alckmin. Nesse sentido, Moreira Lima afirma que tem ouvido as demandas do setor produtivo para o aperfeiçoamento contínuo da NIB. 

Nesta nova fase, a política terá um sistema de monitoramento criado pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), com indicadores e metas para avaliar a qualidade do investimento público, e contará com cadeias de adensamento produtivo para cada missão. Na área de saúde, as prioridades são: medicamentos e princípios ativos biológicos; vacinas, hemoderivados e terapias avançadas; e dispositivos médicos.

Volta do Reiq e das PDPs

O volume crescente de recursos é um elemento-chave para o êxito das ações que estão sendo executadas – e não apenas como financiamento. No ano passado, o Governo Federal publicou decreto que permitiu a retomada das isenções fiscais previstas no Regime Especial da Indústria Química (Reiq), que incidem sobre a compra de insumos básicos petroquímicos usados no setor farmacêutico e na agroindústria, entre outras áreas, ampliando sua competitividade ao reduzir a diferença de custos entre as empresas nacionais e suas concorrentes estrangeiras. De acordo com estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) publicado em 2021, o Reiq garante contribuição de até R$ 5,5 bilhões para o PIB.

Mais recentemente, em junho, o Senado Federal aprovou o projeto de lei que cria a Letra de Crédito do Desenvolvimento (LCD), que é uma nova modalidade de aplicação voltada para a captação de recursos a serem investidos em projetos destinados à indústria, inovação, infraestrutura e micro, pequenas e médias empresas. A proposta foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e se tornou lei no mês seguinte.

Ainda em junho, o Governo Federal publicou as portarias com os novos marcos legais dos programas de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) e de Desenvolvimento e Inovação Local (PDIL), no âmbito da Estratégia Nacional para o Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. As PDPs devem atrair em torno de R$ 23 bilhões em investimentos privados até 2026, segundo previsão do governo.

O intuito dos programas é permitir a atuação conjunta entre o governo e o setor privado para estimular a indústria nacional, buscando reduzir as vulnerabilidades do SUS e ampliar o acesso da população à saúde. A expectativa é que ainda em 2024 os primeiros projetos sejam lançados. 

“O objetivo da política industrial e de inovação é atender à missão social das empresas privadas e do Estado e contribuir com a qualidade de vida das pessoas”, resumiu o  secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde, do Ministério da Saúde (SECTICS/MS), Carlos Augusto Grabois Gadelha, ressaltando que o modelo de parceria das PDPs permitiu, durante a pandemia da Covid-19, que a Fiocruz e o Instituto Butantan produzissem, com o setor privado, vacinas em tempo recorde: “Na conta das PDPs, temos 200 mil vidas salvas”. 

De acordo com o secretário, as novas parcerias no segmento farmoquímico deverão envolver a produção dos Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs), por meio de inovação ou transferência de tecnologia, reduzindo a dependência brasileira neste aspecto. 

“Temos que reverter esse déficit comercial, essa dependência que temos dos IFAs no mercado mundial. E o momento histórico da produção de insumos farmacêuticos ativos no Brasil é agora”, afirmou Gadelha.

IFAs nacionais

Do ponto de vista regulatório, a diretora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) Meiruze Freitas destaca o alinhamento da agência com a política industrial e a coordenação com os demais agentes envolvidos no processo. Com foco na otimização dos serviços da Anvisa, em especial o registro dos IFAs, o objetivo é fomentar a indústria nacional:

“Temos uma junção de atores que mostra quais são os anseios da indústria para que tenhamos uma cadeia produtiva mais forte, com a produção nacional em destaque e o cidadão brasileiro como centro do processo”, comentou Freitas.

Nesse sentido, para os IFAs nacionais, a diretora da Anvisa indica a possibilidade de contar com instituições públicas que possam fazer a pré-qualificação do insumo antes de chegar à agência, garantindo um processo de avaliação mais rápido.

Quatro desafios 

A NIB conta com o apoio do setor produtivo desde o seu lançamento, mas existem aspectos que precisam ser aperfeiçoados, como ressalta o superintendente de Política Industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Fabrício Silveira. Os desafios podem ser resumidos em quatro pontos principais: detalhamento, coordenação, monitoramento e comunicação – sem contar o problema histórico do Custo Brasil, entendido como o valor que a indústria gasta a mais do que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para produzir no Brasil, que chega a 20% do PIB e consome cerca de R$ 1,7 trilhão por ano.

Diante desse cenário, o primeiro tópico essencial é o detalhamento das ações e metas, que já está em andamento. Para que as atividades estejam plenamente alinhadas às necessidades do setor industrial, a CNI defende a formação de câmaras de diálogo público-privado.  

Com as ações definidas e sendo executadas, outro ponto fundamental para a CNI é o monitoramento, que está sendo aprimorado em parceria com a ABDI. Porém, para que este modelo de atuação funcione, o aspecto central é o da coordenação entre os agentes envolvidos, inclusive dentro do setor público. 

“A NIB tenta ser uma agenda coordenadora, mas ela precisa estar empoderada para isso, o que exige uma atuação muito forte por parte de quem está liderando esse processo”, disse Silveira, lembrando que os recursos existentes no Brasil para política industrial são escassos diante dos US$ 12 trilhões investidos nessa temática no exterior, com mais de 2.500 medidas para a indústria no mundo em 2023, sendo 71% delas em economias avançadas, segundo levantamento do Fundo Monetário Internacional (FMI). “Por isso, nossas decisões sobre onde investir esses recursos têm de ser muito acertadas”.

Para aprimorar a interação entre os participantes do processo, também é preciso superar o desafio da comunicação. Essa foi a constatação da CNI ao realizar consulta com a base industrial neste ano sobre a NIB, com 1.033 entrevistados, em que ficou evidente a necessidade de ampliar o nível de entendimento sobre a nova política.

“O empresário tem que conhecer e abraçar a política industrial. Ela é boa e vai num sentido interessante. O que precisamos discutir é como fazer uma política que consegue mais com menos. Esse é o nosso grande desafio”, definiu Silveira, ressaltando ainda a importância da comunicação para conscientizar a sociedade sobre a relevância dos investimentos na indústria.

Impactos empresariais

Nas empresas dos setores de química fina, biotecnologia e suas especialidades, a compreensão sobre a política industrial está em alta e os impactos já podem ser observados, embora permaneçam desafios à frente.

Para o CEO do Grupo Centroflora, Peter Andersen, o fortalecimento do Plano Mais Produção e do FNDCT está proporcionando um suporte financeiro às empresas que atuam com produtos da biodiversidade, fomentando a inovação e a competitividade no mercado. Além disso, a parceria entre agentes públicos e privados vem facilitando o acesso a recursos e  tecnologias avançadas, como a implementação de práticas sustentáveis e de ferramentas que promovem a extração e o uso mais eficiente dos recursos naturais. O apoio da NIB também tem contribuído para o desenvolvimento de novos produtos.

Peter Andersen

O apoio da NIB tem fomentado o desenvolvimento de novos produtos. No entanto, as empresas que trabalham com derivados da biodiversidade ainda enfrentam desafios.

Por outro lado, Andersen salienta que existem desafios para as empresas que atuam com produtos derivados da biodiversidade, tais como: garantir a sustentabilidade na extração e uso dos recursos naturais; obter as licenças e certificações de acordo com o marco regulatório, bem como mantê-las; e promover o investimento contínuo em pesquisa e desenvolvimento para gerar novas aplicações e aprimorar os processos existentes. 

No âmbito dos investimentos relacionados aos objetivos da NIB, o presidente da EMS, Carlos Sanchez, mencionou, durante evento em agosto, a ampliação da produção para três bilhões de pílulas por mês em Manaus (AM). Em expansão, a empresa também atua hoje em países como México e Sérvia.

Ao discutir as ações de fomento para o setor farmoquímico, é sempre importante lembrar que o Brasil possui uma relevante capacidade de produção instalada, ou seja, a chamada neoindustrialização não parte do zero, como destaca Odilon Costa. Mesmo no caso dos IFAs, em que a dependência de insumos importados chega a 90% do total consumido no País, existem empresas nacionais que respondem pelos outros 10% e que podem ampliar sua capacidade se receberem os incentivos necessários.

Para isso, no entanto, é preciso avançar mais do que já está proposto nas políticas públicas atuais, segundo o vice-presidente da Cadeia Química da ABIFINA e diretor de farmoquímica da Prati-Donaduzzi, Nelson Ferreira Claro Júnior. Ele propõe a articulação de atividades em diversas temáticas, como infraestrutura, financiamento, redução de custos e incentivos via compras públicas, para compor uma política de Estado que possa estimular a iniciativa privada a investir no desenvolvimento e produção de IFAs no Brasil. Saiba mais sobre a proposta em artigo publicado na página 6.    

Dessa forma, a prioridade da política industrial brasileira para os setores de química fina, biotecnologia e suas especialidades é fortalecer e dinamizar o segmento produtivo nacional. Tudo em prol do desenvolvimento econômico e social do País. 

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