REVISTA FACTO
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Jan-Mai 2024 • ANO XVIII • ISSN 2623-1177
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Extinção dos subsídios fiscais e impacto da reforma na indústria farmoquímica
//Artigo

Extinção dos subsídios fiscais e impacto da reforma na indústria farmoquímica

A Emenda Constitucional nº 132 (EC 132), de 22 de dezembro de 2023, encerra uma discussão nacional de mais de 30 anos, revolucionando a tributação do consumo no Brasil e alinhando o nosso Sistema Tributário às dinâmicas internacionais na medida em que unifica incidências sob um IVA Dual (substitutivos de PIS/COFINS, ISS, ICMS e IPI), ajusta políticas de creditamento (não cumulatividade ampla), inova no modo de recolhimento de tributos (split payment), altera o vetor de arrecadação (princípio do destino) e concentra tratamentos diferenciados (rol constitucional taxativo). Promulgada a nova redação constitucional e encaminhadas as Leis Complementares de sua regulamentação, faz-se imprescindível compreender os impactos dessa medida na indústria farmoquímica brasileira e avaliar a necessidade de contrapartidas estaduais para reequilíbrio desse setor importantíssimo à saúde pública e privada.

Inicialmente, em termos de unificação, teremos o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), tributos “irmãos” que incidirão sobre as operações nacionais e de importação com bens, serviços e direitos, e prometem alíquotas somadas por volta de 27,5% (CBS da União + IBS dos Estados + IBS dos Municípios); Imposto Seletivo (IS), que tomará o lugar do IPI como maior referência de extrafiscalidade e seletividade ao taxar os produtos e serviços “prejudiciais à saúde e ao meio ambiente”; e uma Contribuição sobre Produtos Primários e Semielaborados, em substituição aos fundos estaduais financiados por contribuições sobre benefícios de ICMS.

No que toca às políticas de creditamento, temos a definição de uma “não cumulatividade ampla” que promete reduzir discussões a respeito dos conceitos de “insumo”, “produtos intermediários”, “secundários” e de “uso e consumo” no creditamento de PIS/COFINS e ICMS. A restrição que se faz é a de que as despesas que contem com o recolhimento dos tributos do IVA não sejam de natureza de “uso e consumo”, conceito não explicitado na redação constitucional e que pode representar a exclusão dos gastos que não se incorporem aos produtos fornecidos ou aos serviços prestados pelo contribuinte no exercício de suas atividades precípuas, ou seja, que não são repassados a título de “custo” das utilidades oferecidas.

O split payment representa um importantíssimo avanço tecnológico e redutor do custo de conformidade das empresas. Isso porque tem por fulcro a separação, no momento do pagamento das obrigações, da monta referente ao custo do bem ou serviço contratado e aquela relativa ao custo tributário, destinando valores diretamente às contas públicas. Esse mecanismo pode ter o condão de sulinhar as guias de arrecadação e reduzir o tempo de apuração dos recolhimentos realizados em cada competência. Destaca-se que a não cumulatividade mencionada somente será possível com o recolhimento nas etapas anteriores, o que, a nosso ver, parece incumbir o adquirente da fiscalização tributária e demandar uma maior análise de liquidez e compliance de toda a cadeia, sob pena de atravancar seu equilíbrio fiscal e elevar os custos fixos de investimento e a carga efetiva das operações.

A alteração do vetor de arrecadação para o destino das operações ocorre em virtude da previsão de que as alíquotas do IBS aplicáveis em cada etapa sejam aquelas dos estados e municípios em que estão localizados os consumidores. Essa medida promete encerrar a guerra fiscal, ajustar a aplicação de recursos a medidas de near shoring (aproximação dos fornecedores), power shoring (aproximação aos estados e municípios mais fortes política e economicamente) e friend shoring (busca por estados e municípios mais amigáveis e com maior fit cultural), e promover o deslocamento das organizações para regiões de melhor infraestrutura produtiva e logística.

Quanto aos benefícios fiscais, muitos são os setores privilegiados com regras específicas de creditamento, recolhimento e apuração. No entanto, a indústria farmacêutica não foi agraciada com igual vantagem. A contrapartida adotada foi o incentivo a “medicamentos e produtos de cuidados básicos à saúde menstrual”, com reduções de 60 ou 100% nas alíquotas do IVA, e aos “produtos de higiene pessoal”, com redução de 60% desses tributos. Ainda, importante frisar que os bens e serviços que contam com redução de 60% serão imunes ao Imposto Seletivo.

Paralelamente, criou-se o Fundo de Compensação dos Benefícios de ICMS, o qual compensará financeiramente, de janeiro de 2029 a dezembro de 2032, as pessoas jurídicas beneficiárias de isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiros-fiscais de ICMS concedidos por prazo e condições certos até 31 de maio de 2023 (sem prejuízo de suas prorrogações ou renovações até 2029).

Em termos de regulamentação, atualmente, tramitam na Câmara seis Projetos de Lei, quais sejam: 29 (Imposto Seletivo); 33 (Ajustes de Contratos Administrativos); 35 (Cesta Básica Nacional); 37 (Integração do Contencioso Administrativo do IVA); e 39 (Comitê Gestor); além do PLP 68, projeto do Executivo para a instituição do IBS, CBS e IS, formalizado no dia 25 de abril, e que deve ditar os novos termos da tributação do consumo no Brasil.

Antes, o setor contava com benefícios setoriais como as Listas de Medicamentos, em que a tínhamos o rol positivo (medicamentos essenciais e isentos de PIS/COFINS), neutro (tributação normal daquelas contribuições) e negativo (monofasia); a isenção de ICMS para fármacos de tratamento de doenças graves e para as vendas a órgãos públicos; a redução de base de cálculo para ICMS; e as alíquotas zero de PIS/COFINS nas importações.

Sopesando ambos os cenários e a redação do PLP 68, cremos que a Reforma será mais prejudicial à saúde financeira das empresas do que o antigo Regime, em virtude do provável aumento de carga tributária, dilema de sua regulamentação e da redução dos medicamentos que contarão com benefícios fiscais em comparação com o que se tinha na lista positiva. As contrapartidas que poderiam vir em sede de subsídios, por sua vez, deverão ser afetos a outros tributos nacionais, haja vista que a nova redação veda a concessão de novos benefícios, senão em virtude de nova Emenda Constitucional.

A pesquisa Tax do Amanhã, realizada pela Deloitte com 172 companhias de seis setores e divulgada pelo Estadão em sua edição do dia 15 de abril, aponta que 46% delas elaboraram estudos ou buscaram aconselhamento a respeito dos impactos financeiros da EC 132 e que 45% da outra parcela aguardam a sua regulamentação. Nesse sentido, ressaltamos a imprescindibilidade de os contribuintes buscarem apoio jurídico para a compreensão e acompanhamento de todas as nuances da Reforma para que: 1) prevejam ajustes internos e se planejem mais adequadamente; 2) via associações – por exemplo, a Associação Brasileira Liberdade Econômica (ABLE) –, contribuam ativamente para a definição de conceitos centrais, promovendo eventos/reuniões com seus associados ou sendo voz ativa nos debates públicos promovidos pelas Comissões Parlamentares; 3) não sejam percebidas distorções econômicas que prejudiquem sua relevância econômica; e 4) sejam estudadas alternativas para redução da oneração total de suas atividades, seja em função da tributação do consumo, da renda ou do patrimônio.

Notas:

Cristiano Rosa de Carvalho
Cristiano Rosa de Carvalho
Livre-docente em Direito Tributário (USP) e sócio do CMT Advogados.
Eduardo Pires Santana
Eduardo Pires Santana
Bacharelado em direito pela Mackenzie e advogado tributarista no CMT Advogados.
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