REVISTA FACTO
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Mai-Ago 2023 • ANO XVII • ISSN 2623-1177
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A falta de mão de obra qualificada e o desafio do aprendizado contínuo
//Artigo

A falta de mão de obra qualificada e o desafio do aprendizado contínuo

O mercado de trabalho está em constante transformação e traz cada vez mais desafios para a formação profissional. Não por acaso, quatro em cada cinco empresários relatam dificuldade para encontrar profissionais talentosos para as vagas que são abertas, segundo pesquisa do MangroupPower1 (ver gráfico).

O cenário é ainda mais desafiador ao se levar em consideração a constante e acelerada transformação dos perfis profissionais demandados pelo mercado de trabalho devido à expansão da tecnologia, da digitalização e de políticas de ESG (sigla em inglês para o tripé ambiental, social e de governança). O World Economic Forum (WEF) aponta que 44% das competências requeridas atualmente pelo mercado de trabalho deverão ser modificadas até 2027. Diante desse cenário, a falta de mão de obra qualificada tem sido apontada como um dos grandes desafios da indústria brasileira.

No entanto, compreender e sanar o problema de falta de mão de obra qualificada no Brasil requer um olhar mais amplo. A dificuldade em encontrar profissionais com as habilidades requeridas para preencher as vagas abertas abrange desde as lacunas de aprendizado da educação básica até a necessidade de que os trabalhadores desenvolvam competências novas continuamente.

O percentual da população com pelo menos o ensino médio completo passou de 49,2% para 65,2% entre 2012 e 2023, segundo dados do IBGE. Esse resultado reflete a expansão e a consolidação das políticas de ampliação do acesso e permanência nas escolas. Embora o País tenha evoluído em termos de acesso à educação, o Brasil ainda precisa avançar em termos de qualidade.  A última edição do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) evidenciou que 12% da população com ensino médio completo eram analfabetos funcionais. Uma educação básica frágil limita o potencial da formação profissional.

Para além da educação básica, é preciso reconhecer que muitos jovens recém-formados desempenharão ocupações que ainda nem existem. A busca por inserção, reinserção e melhor posicionamento no mercado de trabalho perpassa pela necessidade, cada vez maior, de aprendizado contínuo. Estudos acadêmicos têm evidenciado que a pressão por requalificação é consideravelmente maior entre ocupações com menores níveis de educação e habilidades. Isso é especialmente relevante para o caso brasileiro, no qual cerca de 80% dos trabalhadores formais estavam alocados em ocupações que requerem formação até o ensino médio, em 2021.

Percentual de empresários que reportam dificuldade para encontrar talentos

Diante desse contexto, o aprendizado contínuo é crucial para a indústria brasileira. De acordo com dados do Mapa do Trabalho Industrial (MTI), quase 8 milhões de profissionais alocados em ocupações industriais deverão ser requalificados ou aperfeiçoados em quatro anos. A requalificação abrange profissionais em atividades que estão se tornando obsoletas e por isso precisam se requalificar para outras funções no setor produtivo, enquanto o aperfeiçoamento engloba trabalhadores cuja ocupação está incorporando novas competências, complementares às atuais, que precisam ser desenvolvidas para acompanhar as transformações do setor industrial. Além disso, o Mapa também mostra o alto potencial de crescimento de profissões transversais, como áreas de segurança do trabalho, controle de qualidade e logística, reforçando a tendência de que o emprego do futuro estará cada vez mais ligado à capacidade adaptativa dos trabalhadores a diferentes contextos.

Por fim, qualificar a mão de obra exige atenção às reais necessidades do setor produtivo. Isso implica traçar um plano de oferta educacional em carreiras convergentes à demanda existente no mercado de trabalho e desenvolver competências complementares críticas para aqueles que já estão empregados. O relatório do WEF mostra que as competências mais demandadas por empresários em todo o mundo hoje são voltadas para habilidades analíticas, criativas e ligadas à autoeficiência, como resiliência, agilidade e motivação. Olhando para competências almejadas no futuro, ganham relevância significativa habilidades de manipulação e uso de inteligência artificial e big data, e as voltadas à liderança e à influência social.

As mudanças organizacionais e tecnológicas transformam a indústria e requerem dos trabalhadores o desenvolvimento de novas competências nas mais diversas dimensões. Somado a isso, ainda é preciso encarar os gargalos da formação profissional e a necessidade de formar trabalhadores que, muitas vezes, carecem de proficiência em conhecimentos de educação básica e isso, por sua vez, impacta negativamente o desempenho das atividades laborais. Vale notar que o aprendizado contínuo depende de uma educação básica capaz de emancipar os trabalhadores em suas atividades laborais e de aprendizado voltadas a atender às demandas dinâmicas do mercado de trabalho. 

Em suma, a estratégia para suprir a demanda por profissionais qualificados deve estar pautada em três pilares fundamentais: uma educação básica ampla e de qualidade, uma formação profissional aderente à demanda dos empregadores e o aprendizado contínuo.  Ou seja, a educação para a inserção no mercado de trabalho é apenas o primeiro passo da formação profissional, que deverá ser seguida por sucessivas iniciativas de atualização e aperfeiçoamento da força de trabalho até o fim de sua trajetória laboral.

Notas:

  1. Ver resultados da Pesquisa de Escassez de Talentos no Brasil, que abrangeu 1020 empregadores entrevistados no Brasil. Disponível em: https://blog.manpowergroup.com.br/pesquisa-escassez-de-talentos-2023.
  2. Dados do estudo Future of Jobs, disponível em: https://www.weforum.org/reports/the-future-of-jobs-report-2023/.
  3. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua. O indicador considera somente a população de 14 anos ou mais.
  4. Indicador é fruto da parceria entre a ONG Ação Educativa e o Instituto Paulo Montenegro.  Ele é obtido a partir de pesquisa amostral com representatividade em nível nacional. O Inaf tem série histórica de 2001 a 2018. Disponível em: https://alfabetismofuncional.org.br/
  5. Segundo dados administrativos da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2021.
  6. Dados do estudo do Observatório Nacional da Indústria da CNI. Resultados gerais para o período de 2022-2025 estão disponíveis em: https://noticias.portaldaindustria.com.br/noticias/trabalho/mapa-do-trabalho-2022-2025/.
Acsa Guimarães
Acsa Guimarães
Especialista de desenvolvimento industrial do Observatório Nacional da Indústria da CNI, com foco em pesquisas primárias.
Anaely Machado
Anaely Machado
Especialista em mercado de trabalho no Observatório Nacional da Indústria da CNI.
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