REVISTA FACTO
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Mai-Ago 2022 • ANO XVI • ISSN 2623-1177
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Incentivos para o Brasil ter uma indústria fortalecida
//Entrevista Pedro Wongtschowski

Incentivos para o Brasil ter uma indústria fortalecida

L iderança que acompanha há décadas o tema pesquisa, desenvolvimento e inovação no setor produtivo, Pedro Wongtschowski alerta que a sobrevivência da indústria brasileira depende de investimentos na área. A sustentabilidade e a digitalização são as novas fronteiras que precisam ser alcançadas pela tecnologia, atendendo a necessidades de preservação do planeta, diferenciação no mercado, atendimento às reais necessidades das pessoas, ganhos de escala, redução de custos, oferta de produtos melhores e mais acessíveis. A lista é grande. A indústria precisa estar preparada para encarar um novo patamar de competição em nível global.

Para Wongtschowski, assegurar recursos e fortalecer o sistema nacional de ciência e tecnologia, depauperado nos últimos anos, é essencial para que o Brasil chegue lá. Ele fala com sua larga experiência e visão de quem participa do Conselho Superior da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho Diretor do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

Mas antes – ou ao mesmo tempo – é preciso organizar as bases, ou seja, resolver os problemas que afetam a competitividade. Na opinião do presidente do Conselho de Administração da Ultrapar, o ponto de partida é a reforma tributária, seguida de uma reforma administrativa do Estado e da maior integração comercial do Brasil com o mundo. Um combo que poderá desonerar o empresário, com isso incentivando a retomada dos investimentos.

A indústria depende de políticas horizontais que possam contornar o Custo Brasil, porém sem apostar em uma “bala de prata”, uma solução única. É preciso pensamento sistêmico. Que agenda prioritária o senhor sugere?

O Brasil precisa melhorar o ambiente de negócios. E um ambiente de negócios melhor precisa de uma estrutura tributária diferente da atual. Então, sem qualquer dúvida, uma reforma tributária é essencial para simplificar a vida do empresário brasileiro e para reduzir a insegurança jurídica que decorre da complexidade do sistema atual. Essa é a primeira das reformas.

A segunda é a saúde financeira do Estado brasileiro, que precisa ter recursos suficientes para aplicar nas áreas prioritárias e, ao mesmo tempo, não aumentar seu endividamento indefinidamente. Isso exige uma redução das despesas do Estado, até para que sobrem recursos para investimentos.

Por sua vez, a redução do custeio depende de uma reforma administrativa, de uma nova revisão do sistema previdenciário e de tratar do subproduto da reforma tributária, que é a dramática sonegação, algo muito ruim para o ambiente de negócios porque cria situações em que não há isonomia competitiva, em que alguns pagam seus tributos e outros não. Isso gera uma competição desigual.

Essa talvez seja a principal agenda para descomplicar o Brasil e alavancar seu processo de crescimento.

Complementando, precisamos ainda de uma integração maior da indústria brasileira com o mundo.

A sustentabilidade está cada vez mais no cerne da competição global e o Brasil retrocedeu em seu papel de liderança no tema. O que pode ser feito para reconstruir a imagem e a confiança do País nos fóruns internacionais?

Precisamos restaurar o império da lei na Amazônia legal, coibindo o desmatamento, a mineração ilegal e o roubo de madeira. A Amazônia hoje não é mais propriedade dos brasileiros. Está sob controle de grupos ilegais organizados. Isso é uma coisa absolutamente inaceitável. A partir daí, o Brasil tem que incentivar a manutenção da floresta e o uso econômico inteligente da biodiversidade. A questão da indústria no Brasil é essa também. Segundo, precisamos resolver o problema fundiário da Amazônia, que está muito mal resolvido.

Quais incentivos são necessários para a indústria adotar mais práticas voltadas para uma economia sustentável?

As duas grandes iniciativas que a indústria brasileira precisa tomar nos próximos anos para sobreviver a longo prazo são a sustentabilidade e a digitalização. Isso precisa se dar no cenário de um mercado aberto e com ampla competição. Para isso, é necessário que o Estado simplifique a vida do empresário por meio de uma reforma tributária, do aumento do grau de integração da indústria brasileira com o mundo e da segurança jurídica. E, com instituições de ciência e tecnologia fortes, esse conjunto viabilizará o renascimento de uma indústria brasileira sustentável e competitiva.

As verbas federais para ciência e tecnologia – o chamado orçamento do conhecimento – sofreram uma drástica redução nos últimos sete anos. O senhor considera que reverter essa situação vai favorecer a retomada do crescimento?

Essa é uma pré-condição para a retomada do crescimento fortalecer a ciência e a tecnologia nacionais. Uma das coisas necessárias para isso é respeitar os orçamentos das instituições, não contingenciar o FNDCT e voltar ao Fundo Amazônia, patrocinado por países europeus. 

A ciência tem sido maltratada nos anos recentes. Eu diria que primeiro é preciso reforçar as universidades públicas brasileiras, especialmente as federais, e aumentar o contingente de docentes, porque as universidades estão envelhecendo por falta de concursos. É preciso, ainda, ampliar a interface com as empresas, especialmente reforçando modelos tipo Embrapii, no qual as instituições de ciência e tecnologia e as universidades colaboram com empresas no desenvolvimento de produtos e processos inovadores. Além disso, é necessário um suporte às atividades de novas startups, que representam uma das formas mais eficientes de inovação na economia. 

A Embrapii é um modelo bem-sucedido?

Legalmente, ela é uma organização social, o que lhe permite ser uma entidade sem fins lucrativos, privada, mas com contrato de gestão com órgãos da esfera federal para receber recursos. É uma forma muito eficiente de operação. Ela usa recursos públicos, mas tem gestão privada. É um modelo que está se provando de muito sucesso. É o mesmo que se usa, por exemplo, no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) e no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM).

Na pauta da digitalização, em que estágio nossa indústria está hoje e para onde precisa ir?

As empresas estão em estágios muito desiguais. Há setores com indústrias extremamente modernas, atualizadas tecnologicamente, que já estão alterando seus processos produtivos rumo à sustentabilidade, mas que convivem com segmentos muito mais atrasados, especialmente empresas pequenas e médias. 

Vejo que há um trabalho do Governo no que tange à difusão tecnológica: levar os conhecimentos já existentes e disponíveis num sistema de ciência e tecnologia fortalecido às pequenas e médias empresas brasileiras. 

O Sistema S teve um papel importante nesse caminho. O Governo Federal já fez alguns experimentos, como o programa Brasil Mais Produtivo, de excelente resultado. É preciso um esforço do Sistema S e do governo brasileiro para a difusão dessas tecnologias conhecidas. 

Qual setor é líder na transformação digital?

Em todos os setores, há indústrias muito atualizadas tecnologicamente. Há exemplos de empresas extremamente competitivas em nível mundial, como nas áreas química, farmacêutica, mecânica, metalúrgica, de celulose e papel, e de autopeças.

Nesses setores, já há investimentos importantes na indústria 4.0?

Sem dúvida. Estou genericamente falando em digitalização para incluir a atualização tecnológica digital das fábricas, um conjunto de medidas que se chama de indústria 4.0.

Pedro Wongtschowski
Pedro Wongtschowski
Doutor em engenharia, conselheiro de diversas instituições e membro do Conselho Consultivo da ABIFINA.
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