REVISTA FACTO
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Set-Dez 2021 • ANO XV • ISSN 2623-1177
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A busca por um Brasil gigante
//Entrevista

A busca por um Brasil gigante

O economista Paulo Nogueira Batista Jr., ex-diretor-executivo no Fundo Monetário Internacional (FMI), sustenta a tese de que o Brasil pode estar à frente das grandes mudanças mundiais, articulando-se com as mais diversas nações para isso. Na entrevista a seguir, ele explica que o País é um gigante em território, população e economia. Mas o Brasil precisa de um governo que lidere uma virada, usando instrumentos econômicos para incentivar a indústria nacional. Para se desenvolver, o Brasil deve aumentar a participação da indústria na pauta de exportações. E para isso, precisa largar a ideia ultrapassada de que seria preciso fazer uma abertura irrestrita e mal planejada da economia, substituindo indiscriminadamente os produtos nacionais pelos importados. Ex-vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS (grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Batista comenta ainda os motivos desta iniciativa – de grande potencial para ajudar financeiramente os países – não ter deslanchado.

O Brasil está há anos em processo de desindustrialização. Como reverter essa realidade?

Primeiro, é preciso conscientizar a sociedade, a academia, a opinião pública e os partidos políticos quanto à importância para o País de reindustrializar a economia, de aumentar o peso do setor industrial no PIB. É preciso criar consciência da importância de uma indústria diversificada, que produza não só bens de consumo, mas também bens intermediários e bens de capital. E fazer esse debate de forma ampla e profissional. Não é concebível que uma nação continental e fortemente urbanizada possa depender apenas da agropecuária e dos serviços, deixando o seu setor industrial minguar.

A indústria e suas associações deveriam tentar deixar claro que não se trata de uma luta corporativa, setorial, mas de algo que interessa ao Brasil como um todo. A pandemia deixou evidente como é importante não depender em excesso de cadeias produtivas globalizadas. Todos os países que se prezam tiraram essa conclusão óbvia e estão redescobrindo, ou enfatizando mais, o made in no próprio país, a internalização das cadeias produtivas sempre que possível e conveniente.

Aqui no Brasil persiste, entretanto, uma visão atrasada. Não se percebe que a integração internacional não pode se dar com uma abertura irrestrita da economia, mal preparada, e permitindo a substituição indiscriminada da produção industrial doméstica por importações.

Qual é a importância da indústria de química fina, em especial os segmentos da saúde e do agronegócio, para o desenvolvimento econômico brasileiro?

A indústria de química fina é um setor estratégico, que merece atenção especial. Por exemplo, na pandemia ficou claro que a maioria dos países latino-americanos havia perdido nas décadas recentes a capacidade de produzir insumos médicos essenciais, o que criou uma vulnerabilidade importante. É preciso tirar as consequências disso e voltar a praticar políticas industriais modernas, mobilizando inclusive o BNDES e outros bancos públicos para apoiar a indústria que opera, produz e gera empregos em território nacional.

Quais são as perspectivas para a indústria nacional, considerando um cenário ainda nebuloso frente à pandemia?

Enquanto não houver governo em Brasília, pouco se poderá fazer. O que se pode esperar é que, a partir de 2023, volte a existir um governo comprometido com a defesa do interesse nacional brasileiro. É importante fazer esse debate em 2022, para que, nas campanhas eleitorais, os candidatos deem a devida atenção à temática industrial. Temos os instrumentos para retomar a defesa e a promoção da indústria nacional. Mas não os utilizaremos enquanto não tivermos clareza, como sociedade, dos nossos objetivos de longo prazo.

Não vamos nos enganar, pensando que podemos contar apenas com a exportação de commodities para tirar o País do atoleiro. Uma economia do porte da brasileira não será puxada somente por exportações de produtos primários. Agro pode até ser “pop”, mas não resolve tudo.

Agropecuária e mineração continuarão a ter peso decisivo na pauta de exportações e no PIB (Produto Interno Bruto), mas o setor urbano-industrial precisa ser recomposto, apoiado e dinamizado. Isso depende de um plano de ação do Governo Federal.

O incentivo governamental a práticas sustentáveis pela indústria pode contribuir com a recuperação econômica do País?

A sustentabilidade é um tema inescapável para a indústria e todos os setores da atividade econômica. Deve ser vista, no meu entender, como uma oportunidade e não como um fator limitador.

Ou seja, os industriais devem se perguntar, e já estão se perguntando com certeza: quais são as oportunidades de inovação e investimento que as preocupações climáticas – como aquecimento global e poluição do ar, da água, da terra – estão trazendo para o setor? Como os governos do Brasil e dos nossos principais parceiros comerciais estão atuando em termos de incentivos e outras políticas que possam afetar os planos da indústria?

Os setores da economia que mostrarem liderança e capacidade de contribuir para essa discussão ganharão peso político automaticamente.

O senhor defende que o Brasil pode liderar um novo destino global, juntando-se a outros países da América Latina, Ásia e Europa. Como fazer isso e por onde começar?

O Brasil é um dos gigantes do mundo, em termos territoriais, populacionais e econômicos. Tem características históricas que nos dão uma visão naturalmente global. O País já é global na sua origem. Para cá vieram povos de quase todos os cantos do planeta. Por isso, acredito que o Brasil tem condições de atuar junto com outros países, próximos e distantes, ricos e pobres, grandes e pequenos, para enfrentar os enormes desafios – climáticos, de saúde, econômicos e sociais – com que a humanidade se defronta. Desafios que não poderão ser superados apenas no âmbito nacional e mesmo regional.

O senhor comenta que o Novo Banco de Desenvolvimento do BRICS foi bem-sucedido em captação de recursos, mas não teve a mesma sorte em obter novos membros e em incentivar projetos. Por que isso aconteceu?

Tratei desse tema em certo detalhe no meu livro mais recente, “O Brasil não cabe no quintal de ninguém”, especialmente na segunda edição que saiu em 2021. O Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) foi criado pelo BRICS para ser um banco de alcance global, com membros em todas as áreas do mundo. Por diversas razões, organizacionais e políticas, macro e micro, o NBD não avançou quase nada em termos de ingresso de novos países membros desde que começou a operar em Xangai em 2015. Só agora, em 2021, entraram três países novos.

O NBD tem pouca presença mesmo nos cinco países que o fundaram. Os projetos são aprovados na Diretoria do Banco, porém a implementação é demorada. Mas o NBD está lá, tem expressivo capital próprio, foi bem-sucedido na emissão de títulos, formou a sua equipe técnica e pode ser dinamizado, se houver vontade política. Conta com o apoio do país-sede [China], o que é muito importante. Para que o Brasil possa contribuir para o desenvolvimento do Banco, de novo, precisa de um governo em Brasília. Veremos se será possível mudar esse quadro a partir de 2023.

Paulo Nogueira Batista Jr.
Paulo Nogueira Batista Jr.
Economista Paulo Nogueira Batista Jr., ex-diretor-executivo no Fundo Monetário Internacional (FMI).
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