A crescente participação de produtos e serviços biotecnológicos na economia global levou diversos países a implementar estratégias, planos de ação e políticas de incentivo a pesquisa e desenvolvimento, tendo em vista conquistar posições nesse promissor mercado. Entre os setores industriais em que a biotecnologia encontra maior variedade de aplicações destaca-se a química fina, principalmente nos segmentos farmacêutico e agroquímico.
A política de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs), articulada com medidas de regulação sanitária e programas de financiamento do BNDES e da Finep, formou um sólido arcabouço para o desenvolvimento da biotecnologia no Brasil, em especial na área da saúde. Para que essa conquista não se perca e o País continue avançando, não só na produção de biossimilares como também em pesquisa e desenvolvimento de novos bioprodutos, é preciso vontade política e coordenação por parte dos entes governamentais envolvidos, além de disponibilidade efetiva dos recursos públicos destinados a programas de incentivo à inovação.
A evolução das PDP
A estratégia brasileira de desenvolvimento industrial da biotecnologia na área da saúde se estruturou principalmente a partir da política de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs), na primeira década dos anos 2000. Ainda nesse período, recorda João Paulo Pieroni, chefe do Departamento do Complexo Industrial e de Serviços de Saúde do BNDES, “um conjunto de empresas farmacêuticas brasileiras havia avançado na incorporação de competências em atividades de P&D relacionadas ao desenvolvimento de medicamentos genéricos de síntese química, com algumas experiências bem sucedidas em inovações incrementais”.
Desde 2004 o BNDES já contava com um programa de financiamento destinado à cadeia farmacêutica, o Profarma. Adaptado e moldado conforme a evolução da indústria farmacêutica brasileira, em 2013 ele se desdobrou num subprograma específico voltado ao financiamento da biotecnologia no complexo industrial da saúde, o Profarma Biotecnologia. Entre 2013 e 2016, foram contratados financiamentos para apoio aos principais projetos fabris e de desenvolvimento de produtos associados às PDPs de biológicos. Como resultado, a participação da biotecnologia farmacêutica no fomento do BNDES à indústria da saúde cresceu, passando de 4% em 2007 para 22% em 2018.
A Finep e o BNDES são instituições que desempenham papéis complementares no financiamento à inovação, observa Rodrigo Secioso de Sá, superintendente da área de inovação 3 da Finep. “Com seus respectivos instrumentos, são capazes de compatibilizar o longo prazo de maturação dos investimentos na área biofarmacêutica com seus prazos de retorno. É fundamental compreender que o objetivo da política pública implementada através do Programa Inova Saúde, de 2013, criado pela Finep, em parceria com MCTI e Ministério da Saúde, CNPq e BNDES, é tornar o País mais independente tecnologicamente. Nesse sentido foi dado um grande estímulo à indústria nacional, com geração de novas capacidades de produção locais e ampliação dos investimentos em P&D viabilizados na área. Decorrente desse apoio, já possuímos anticorpos monoclonais produzidos integralmente no Brasil”.
Os resultados desse conjunto de políticas são expressivos. Segundo a professora Leda Castilho, do laboratório de engenharia de cultivos celulares da Coppe/UFRJ, “hoje caminhamos para produzir no Brasil ingredientes farmacêuticos ativos justamente nesse segmento em que as tecnologias são mais complexas e os produtos são mais sofisticados, enquanto que na área de medicamentos sintéticos, em que a complexidade é menor, os insumos são importados”.
A vertente biotecnológica das PDPs produziu grandes avanços no desenvolvimento de vacinas e outros produtos imunobiológicos, e o laboratório Bio-Manguinhos/Fiocruz tem presença marcante nesse segmento. Segundo Akira Homma, assessor científico sênior do laboratório, “o êxito das PDPs é enorme, tendo já envolvido mais de noventa empresas privadas nacionais e doze laboratórios públicos. Já foram contratados para nacionalização da produção mais de cinquenta bioprodutos importantes para a saúde pública.”
Ao menos no suprimento de vacinas e outros imunobiológicos para o SUS, o atual quadro de elevada dependência nacional de importações de produtos e tecnologia poderá ser parcialmente revertido em médio prazo. Está prevista para 2023 a inauguração do Complexo Industrial de Biotecnologia em Saúde (CIBS) da Fiocruz, o maior do gênero na América Latina. Ao todo serão nove prédios em 580 mil metros quadrados, constituindo um gigantesco polo de desenvolvimento tecnológico com capacidade de produção de 120 milhões de frascos de vacinas e biofármacos por ano.
Homma assinala que o desenvolvimento de vacinas, kits para diagnóstico e biofármacos “destaca-se pela sua importância estratégica para o desenvolvimento sustentável e para redução da exclusão social e da pobreza no País, por impactar de forma expressiva os mais diversos setores da vida econômica e social. A busca de alternativas biotecnológicas inovadoras permitirá identificar novas oportunidades para aperfeiçoamento das políticas públicas nos seus diferentes níveis e novas formas de contribuição para a retomada do crescimento nacional”.
Frente ao atual cenário de dificuldades econômicas e sociais, agravadas pela crise sanitária, Homma entende que o Brasil precisa “definir medidas de curto, médio e longo prazos que assegurem os necessários incentivos e a não interrupção do fluxo de recursos para o estímulo a inovações em setores estratégicos, como a biotecnologia. A perda da continuidade desses investimentos em PD&I pode significar um retrocesso ainda mais grave, com drásticas consequências para o futuro”.
Entre as empresas privadas cresce a apreensão quanto ao rumo que será dado à política de parcerias na área da saúde. Ricardo Pacheco, diretor geral do laboratório Cristália, lamenta a perda de apoio político dentro do Ministério da Saúde para a continuidade das PDPs. “Hoje aparentemente se considera o preço dos medicamentos mais importante do que a construção de um parque produtivo e tecnológico que dê segurança quanto ao abastecimento das necessidades do País”.
De acordo com Peter Andersen, presidente do Grupo Centroflora, o aumento da competitividade da indústria nacional permanece como um dos principais desafios da política de PDPs. “Precisamos olhar além e lutar por uma indústria forte e competitiva no País, que não dependa de compras governamentais. O Estado deveria assumir mais o papel estruturante e estratégico no que tange a políticas públicas de fortalecimento do setor”. A diretora de Inovação do Grupo, Cristina Ropke, lembra que existem recursos para dar suporte a essas políticas. “Uma vez exposta a grande dependência estratégica do País, é imprescindível que o fortalecimento da farmoquímica nacional se torne um projeto de Estado. O descontingenciamento dos recursos do FNDCT deveria servir para isto. Temos a maior biodiversidade do planeta e lançar mão desse recurso pode ser um excelente ponto de partida para diminuir nossa dependência estratégica”.
Biodiversidade, uma vantagem competitiva
O Ministério do Meio Ambiente divulga que o Brasil detém cerca de 15% de todas as espécies de plantas e mais de 20% do número total de espécies vivas do planeta. Durante quase duas décadas, o aproveitamento dessa riqueza por empresas e instituições de pesquisa nacionais ficou prejudicado por uma legislação anacrônica de acesso à biodiversidade, que gerou insegurança jurídica no desenvolvimento de inovações em bioprodutos. “As constantes mudanças regulatórias na legislação sanitária também acabaram funcionando como um desestímulo” – comenta Cristina Ropke. “Hoje, considero que amadurecemos nesse quesito e o arcabouço regulatório brasileiro é moderno tanto no que se refere à legislação sanitária quanto à legislação de acesso e repartição de benefícios”.
“A biodiversidade brasileira pode representar um importante diferencial competitivo para o setor farmacêutico, caso haja interesse em estreitar parcerias com empresas nacionais que produzem IFAs vegetais com foco na inovação” – acrescenta Ropke. “A revalorização dos compostos naturais como fonte de descoberta de novos medicamentos, associada a métodos modernos de drug discovery, tem potencial para inserir o País no cenário internacional de P&D nessa área”. Peter Andersen adverte, entretanto, que o desenvolvimento de novos medicamentos a partir da biodiversidade exigirá um esforço significativo por parte de todos os atores envolvidos, tendo em vista produzir casos de sucesso em P&D no Brasil. “Faz-se necessário investir no desenvolvimento biotecnológico em escala industrial, com boas práticas de fabricação e estudos clínicos que sigam rigorosamente as normas de pesquisa clínica”.
Rodrigo Secioso vislumbra grandes oportunidades de mercado quando se considera a exploração da biodiversidade brasileira conectada ao movimento pela personalização da medicina. “Com a redução cada vez maior dos custos do mapeamento genético, abre-se a oportunidade da abertura de nichos rentáveis com escalas menores, além de se aumentar a taxa de sucesso no desenvolvimento de medicamentos. Existe uma quantidade de estudos de potencial terapêutico nas ICTs brasileiras que poderia ser o ponto inicial de busca, reduzindo os custos e o tempo da bioprospecção, embora, provavelmente, seja necessário repetir alguns estudos em BPF e realizar investimentos em comunidades locais para obtenção de fornecimento estável e com boas práticas agrícolas”.
Embora reconheça o grande potencial dessas oportunidades de mercado, Pieroni entende que é preciso avançar mais em etapas preliminares até a consolidação de uma cadeia produtiva baseada na biodiversidade brasileira. “Após um longo período de imobilismo gerado por um arcabouço regulatório inadequado, a publicação da nova lei de acesso à biodiversidade (Lei 13.123/2015) começou a abrir os caminhos para essa vertente de pesquisa e desenvolvimento. O interesse das empresas é crescente, mas ainda pequeno diante das possibilidades. Além dos fitoterápicos, também são promissoras as perspectivas de desenvolvimento de moléculas sintéticas a partir das substâncias encontradas na natureza, mas é importante avançar na constituição de bancos de extratos de alta qualidade para qualificação do mercado de fitomedicamentos, como também no melhor aproveitamento das informações disponíveis em bancos de dados de patentes para o desenvolvimento de novos IFAs sintéticos a partir a biodiversidade. Precisamos ainda ampliar as pesquisas sobre o conhecimento das propriedades terapêuticas e características físico-químicas de espécies da biodiversidade brasileira, bem como levar informação aos consumidores sobre perigos do uso de produtos sem comprovação científica”.
Além do farmacêutico, o agroquímico é outro setor da química fina com grande potencial de desenvolvimento de produtos a partir da biodiversidade. Segundo Roberto Teixeira Alves, pesquisador da Embrapa Cerrados, o mercado mundial de controle biológico de pragas na agricultura cresce de 10% a 15% ao ano, ultrapassando a marca dos US$ 3 bilhões em 2019, e deverá chegar a US$ 5 bilhões nos próximos anos.
O controle biológico de pragas agrícolas por meio de seus inimigos naturais (fungos, bactérias, vírus, insetos, nematoides, entre outros) envolve um conjunto de medidas – o Manejo Integrado de Pragas – que leva em conta a preocupação com o meio ambiente e a sustentabilidade, explica Alves. São diversas as vantagens do uso do controle biológico na agricultura, mas “para que o controle biológico seja efetivo, assim como o controle químico, o produtor deve seguir as recomendações dos especialistas quanto ao uso dos biodefensivos mais eficientes e de custo acessível, para que possam ser utilizados em pequena, média e grande escala”.
O imperativo do desenvolvimento sustentável incentiva a pesquisa e o desenvolvimento de bioprodutos para a agricultura, afirma Alves. “Observamos um aumento das pressões internacionais para a oferta de produtos mais saudáveis, oriundos de cultivos que não prejudiquem o meio ambiente e que possam ser rastreados do plantio até a colheita. Esse cenário favorece o investimento em pesquisas e na produção de novos biodefensivos utilizando microrganismos provenientes de nossa biodiversidade. Além disso, o mercado de produtos orgânicos também tem aumentado a cada ano na faixa de 20%, favorecendo a utilização de bioprodutos eficientes e economicamente viáveis”.
De acordo com o pesquisador da Embrapa, o quadro de dependência do Brasil em relação aos ativos agroquímicos importados e as distorções tributárias e regulatórias que inibem a produção nacional são barreiras que podem se converter em oportunidades. Ele enxerga na transição tecnológica “uma brecha para a entrada de bioprodutos na agricultura brasileira. Essa brecha deve ser explorada como um incentivo ao aumento da produção e utilização de inseticidas e fungicidas biológicos, e me parece que isto já está acontecendo”.
Na mesma linha de argumentação, José Eduardo Marcondes de Almeida, diretor da URL Controle Biológico do Instituto Biológico de São Paulo, afirma que a biodiversidade brasileira abre uma via tecnológica importante e viável para o agronegócio, no que concerne à busca por alternativas sustentáveis para o controle de pragas e doenças. Ele lembra que instituições públicas de pesquisa agropecuária, como a Embrapa e universidades, “possuem uma grande diversidade de macro e microrganismos estudados com alta viabilidade e eficiência de aplicação direta ou mesmo indireta, através de substâncias químicas que podem ter efeito no controle de pragas, doenças e plantas daninhas, bem como bioestimulantes”. No intuito de acelerar a disponibilização de bioprodutos para agricultura no mercado, o Instituto Biológico criou o Núcleo de Pesquisa Orientado a Problemas (NPOP) – Bioprodutos, financiado pela FAPESP e empresas, que tem como objetivo desenvolver tecnologia de inovação aberta para, em seguida, cada empresa utilizar e criar seu próprio produto, gerando royalties que revertem para a manutenção do Núcleo.
Por outro lado, em que pesem as perspectivas animadoras, faltam condições para que a biotecnologia nacional dê um salto de qualidade em curto prazo. De acordo com o presidente do grupo Centroflora, “questões econômicas estruturais e o andamento lento das reformas necessárias para o crescimento continuam sendo um fardo para o empresário brasileiro. Outro ponto importante é que a cultura de inovação no País não é de risco. Existe capital privado para investimentos, e bons projetos com transparência, governança e muito empenho começam a atrair esses investimentos, mas ainda é um movimento lento”.
Startups fazem ponte para o mercado
A inovação tecnológica como resultado da integração entre a pesquisa acadêmica e as demandas da indústria permaneceu durante muito tempo, no setor farmacêutico nacional, como um desafio não superado. Mas a consolidação de empresas de base tecnológica nascidas nas universidades e a necessidade de queimar etapas na incorporação de biomedicamentos ao portfólio da indústria vêm contribuindo para eliminar barreiras e facilitar o diálogo entre esses diferentes atores. Resta equacionar o problema do financiamento do scale up, de forma a viabilizar a produção em escala industrial a partir dos testes de bancada realizados nas instituições de pesquisa.
Para Ricardo Pacheco, “o modelo de incubação já é usual no cenário brasileiro de inovação, inclusive na área de biofármacos. Trata-se de uma política fundamental do setor público, pois sem esse apoio estrutural os empreendimentos não sairiam do papel. Aqueles que amadurecem podem, ainda como startups, contar com a participação da iniciativa privada, alavancando projetos”.
Na avaliação de Andrew Simpson, diretor científico da Orygen Biotecnologia, o aproveitamento pela indústria dos projetos gerados nas universidades exige um envolvimento maior do Estado. “Apesar de o governo brasileiro investir em pesquisa e formação acadêmica, existem poucos programas de apoio financeiro para que essas pesquisas tecnológicas sejam transferidas para empresas. Diante da situação econômica nacional, é necessário se chegar a um equilíbrio entre as contribuições dos setores público e privado na inovação, com priorização de programas que busquem diretamente resolver as demandas do sistema de saúde no Brasil, de maneira que os investimentos do governo permitam um retorno direto para a população”.
“A falta de financiamento para pequenas empresas conseguirem amadurecer novas tecnologias ao ponto de serem absorvidas pelas empresas farmacêuticas impacta diretamente a interação entre o sistema de C&T e o setor produtivo” – observa Simpson. “A distância entre as empresas de produção e distribuição e os laboratórios de pesquisa poderá ser reduzida por meio de pequenas empresas de base tecnológica, desde que focadas em um único produto e com recursos suficientes. O papel do setor público deve se concentrar na realização desses investimentos e no acompanhamento dos resultados”.
Rodrigo Secioso considera, da mesma forma, que o crescimento das startups no ecossistema brasileiro ainda não atingiu a dinâmica necessária, cabendo apoio público para que o movimento se traduza em resultados econômicos, multiplicação das parcerias e desenvolvimento de inovações e negócios robustos. “A atuação pública tem sido fundamental para gerar e ampliar esse movimento inicial, em que se destaca a Finep com os Programas Centelha e Finep Startup. Também é possível observar o crescimento do investimento privado em programas de aceleração e incubação, mas ainda são poucos os recursos financeiros efetivamente aplicados. Creio que caberia uma expansão da atuação pública nesse segmento, com recursos adequados à fase dos desenvolvimentos de maior risco, mas aliado a uma maior parceria com o mercado privado. O crescente movimento das empresas pela inovação aberta pode impulsionar esse crescimento e a cooperação. Esperamos que seja criada uma cultura em que empresas do mesmo segmento concorram e cooperem simultaneamente, reduzindo custos e aumentando a velocidade dos desenvolvimentos no custeio de ensaios clínicos, por exemplo, assim como ocorre em outros países”. Esse é o caminho que o Instituto Biológico de São Paulo vem trilhando no intuito de acelerar a incorporação de bioprodutos ao mercado de defensivos agrícolas.
Na avaliação do BNDES, já são consistentes os avanços na articulação entre indústria e instituições de pesquisa na área biotecnológica. “A partir de uma perspectiva temporal, podemos notar uma evolução na integração entre os sistemas produtivo e científico-tecnológico na área de saúde” – observa Pieroni. “Os diagnósticos setoriais do início dos anos 2000 identificavam a ausência de empresas de grande porte que pudessem funcionar como âncoras demandando serviços da cadeia de P&D representada tanto pelas ICTs quanto pelas pequenas empresas de base tecnológica. Hoje é possível observar a presença de um tecido produtivo importante, formado por empresas com capacidade financeira e tecnológica para levar adiante projetos de desenvolvimento e absorção de tecnologia, ainda que limitados a inovações incrementais, mas que podem mobilizar essa cadeia. Por outro lado, as ICTs e pequenas empresas também se qualificaram ao longo dos últimos anos, no sentido de realizar suas pesquisas dentro de boas práticas laboratoriais e de fabricação, compliance regulatório e maior capacidade de proteção da propriedade intelectual gerada. Embora haja muito o que avançar em termos de ambiente regulatório e mecanismos de financiamento adequados aos diferentes estágios de maturação de projetos, o cenário é favorável para o avanço das parcerias em biotecnologia”.
A convergência entre biotecnologia e nanotecnologia constitui outro importante desafio no processo de integração do setor produtivo com as instituições de pesquisa. De acordo com Helvécio Rocha, chefe do laboratório de Micro e Nanotecnologia de Farmanguinhos/Fiocruz, “a nanotecnologia e a biotecnologia, em separado ou em combinação, são duas áreas de enorme valor e que definem um ‘caminho sem volta’ para o segmento farmacêutico, em virtude do enorme potencial de benefícios ainda não totalmente explorados que elas oferecem. A biotecnologia pode ser muito beneficiada pela incorporação de nanopartículas, uma vez que diversas moléculas de base biotecnológica apresentam problemas biofarmacêuticos que poderiam ser sanados com o uso de sistemas nanométricos. A potencialidade para agregar maior estabilidade e maior especificidade de liberação de ativos em biotecnologia torna A convergência entre biotecnologia e nanotecnologia constitui outro importante desafio no processo de integração do setor produtivo com as instituições de pesquisa. De acordo com Helvécio Rocha, chefe do laboratório de Micro e Nanotecnologia de Farmanguinhos/Fiocruz, “a nanotecnologia e a biotecnologia, em separado ou em combinação, são duas áreas de enorme valor e que definem um ‘caminho sem volta’ para o segmento farmacêutico, em virtude do enorme potencial de benefícios ainda não totalmente explorados que elas oferecem. A biotecnologia pode ser muito beneficiada pela incorporação de nanopartículas, uma vez que diversas moléculas de base biotecnológica apresentam problemas biofarmacêuticos que poderiam ser sanados com o uso de sistemas nanométricos. A potencialidade para agregar maior estabilidade e maior especificidade de liberação de ativos em biotecnologia torna a nanotecnologia uma parceira de primeira hora. Por sua vez, a funcionalização (ou a ‘decoração’) de nanopartículas com biomoléculas pode também beneficiar a liberação de ativos mesmo em casos de fármacos sintéticos simples. A área de terapia do câncer talvez seja aquela que, até o momento, mais conseguiu apresentar resultados práticos e gerar novos produtos”.
Segundo o professor Valtencir Zucolotto, coordenador do Grupo de Nanomedicina e Nanotoxicologia da USP, ainda é longo o caminho a percorrer na articulação com o setor produtivo. “As empresas não sabem o que está sendo produzido dentro dos laboratórios. Nós geramos patentes e a Agência USP de Inovação tem a função de difundir a notícia, levá-la até o setor produtivo, mas ainda há uma barreira a ser vencida. Gostaríamos de ter as empresas mais próximas dos nossos laboratórios e grupos de pesquisa, para dar vazão a todo esse conhecimento gerado na universidade de maneira mais rápida e já direcionada ao setor produtivo”.
Zucolotto destaca o afluxo significativo de recursos para inovação nessa área de ponta da tecnologia. “O número de startups vem aumentando, e elas têm um papel fundamental nesse cenário, daí o grande volume de recursos alocados pela Fapesp e pela Finep. Temos também recursos humanos, pois o Brasil forma um grande número de doutores por ano. As oportunidades estão aí. Cabe criar canais de convergência no nosso País entre a pesquisa e a aplicação, entre a universidade e o setor produtivo”.
“Nós estamos no melhor momento da convergência entre nanotecnologia e biotecnologia, é um casamento que deu certo” – avalia Zucolotto. “E está só começando. Com certeza teremos desenvolvimentos fantásticos ao longo dos próximos anos, especialmente na área que recebeu o nome de nanomedicina. Temos um background enorme de pesquisas sendo produzidas, de altíssimo nível, em instituições brasileiras e do exterior. Percebemos que muitas instituições estão preocupadas com scale up. A maioria dos avanços ainda está no laboratório, mas já ultrapassamos a fase inicial de prova de conceito. Temos vários laboratórios, principalmente no exterior, já em etapas de scale up, com ensaios clínicos na fase III”. Enfatizando ainda mais a importância da convergência entre bio e nanotecnologia, o prof. Zucolotto ressalta os recentes avanços científicos protagonizados pelas vacinas contra a covid-19 produzidas pelas empresas Pfizer/BioNTech e Moderna, que são formuladas à base de mRNA estabilizado em nanopartículas lipídicas. “Além da inovação e do grande impacto que essas vacinas irão gerar para o controle da pandemia, esse fato pode também ser considerado um marco histórico na área de nanomedicina”.
O Brasil tem pela frente um horizonte de oportunidades nessas áreas de ponta da tecnologia aplicada à saúde, afirma a professora Leda Castilho. “O contexto atual mostrou que, havendo vontade política e investimentos, é possível levar produtos inovadores que podem melhorar a vida das pessoas” – assinala a professora. “A biotecnologia é um celeiro de resultados, de desenvolvimento, de conhecimento acumulado pelos pesquisadores da área biomédica básica. E quando o devido investimento é feito, isso pode, num horizonte de tempo bastante rápido, gerar produtos que podem salvar muitas vidas”.