REVISTA FACTO
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Set-Dez 2020 • ANO XIV • ISSN 2623-1177
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//Artigo

ANVISA, REGULAÇÃO E AS INSPEÇÕES INTERNACIONAIS

A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica a inspeção sanitária como parte importante de um sistema global cujo propósito é garantir que a população tenha acesso a medicamentos com qualidade apropriada, requerida para a comercialização. O cumprimento dos requisitos de Boas Práticas de Fabricação (BPF) pelas empresas fabricantes é essencial para se alcançar esse propósito. Autoridades reguladoras mundiais promovem inspeções nacionais e internacionais em estabelecimentos com o objetivo de avaliar a adequabilidade das instalações e determinar o cumprimento das leis e regulamentos aplicáveis.

No que tange às boas práticas, estas abrangem um conjunto de medidas que devem ser adotadas pela indústria, não apenas para minimizar os riscos inerentes ao processo de fabricação, mas também para garantir a qualidade, segurança e eficácia dos produtos, de acordo com os seus respectivos regulamentos técnicos. No Brasil, a título de exemplificação, temos, por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 301/2019, que regulamenta as Boas Práticas para medicamentos, e as RDCs 69/2014, 359/2020, 361/2020 e 362/2020, especificamente para Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs), representando o que há de mais atualizado no Brasil no campo regulatório.

Ainda assim, mesmo com uma regulamentação recém-publicada, o presente momento é o mais desafiador, tanto no Brasil como no mundo. A pandemia de covid-19 trouxe um esforço maior no âmbito de suas competências e expertises para o enfrentamento das adversidades e expôs as fragilidades de muitos países.

Inspeções

Pensando justamente nos pontos de vulnerabilidade, além do uso eficiente de recursos públicos e melhorias no desempenho das inspeções, foi publicado recentemente pela instituição de auditoria do governo dos Estados Unidos – Government Accountability Office (GAO) – um relatório que tem por objetivo avaliar as atividades de inspeção realizadas pela agência reguladora americana, Food and Drug Administration (FDA). Essa publicação é feita de forma regular e tem o objetivo de mensurar a capacidade de supervisionamento da cadeia farmacêutica americana.

Já no Brasil, a Anvisa publicou recentemente um relatório cujo objetivo foi ilustrar as primeiras incursões de inspeções internacionais realizadas pela Agência, desde a primeira regulamentação de IFAs, e divulgar todo o cenário dos insumos comercializados no mercado brasileiro. Em se tratando do panorama brasileiro de insumos, as normativas foram aprimoradas ao longo dos anos, historicamente começando em 2005 com o lançamento do Programa de Insumos por meio da RDC 250/2004 e culminando com o início das atividades de inspeção internacional em 2009. Anos mais tarde, por meio da RDC 39/2013, foi possível instituir de fato o programa de inspeção internacional de IFAs.

Em seu primeiro relatório de inspeções internacionais, a Anvisa destacou que 78% das instalações produtivas de insumos no exterior que exportavam para o Brasil localizavam-se na China e na Índia (dado de 2009). O mesmo apontamento pode ser observado nos dados do FDA dez anos depois, que mostram um número elevado de inspeções concentradas nos mesmos países, de 43%. À época das visitas iniciais, as atividades de inspeção na Anvisa se concentravam em um número reduzido de insumos classificados como prioritários, que foram elencados graças à criação de um cadastro com informações sobre os insumos que circulavam no Brasil entre 2009 e 2010, além do lançamento da RDC 57/2009, que estabelecia o registro de insumos no País e suas instruções normativas.

Assim, o Brasil seguia no ritmo acelerado de visitas, atingindo o ápice nos anos de 2011, 2014 e 2015, por conta do universo de petições protocoladas para concessão de certificados de insumos, mas em 2017 houve uma brusca queda das visitações de 35%, na comparação ao ano anterior. Em 2018, houve um equilíbrio entre a quantidade de inspeções em empresas de insumos brasileiras e estrangeiras, contabilizando 44% e 55%, respectivamente. Esse panorama se modifica de forma considerável se olharmos o setor de medicamentos, com 82% das inspeções realizadas internacionalmente contra apenas 17% em empresas nacionais.

Dependência de insumos importados

O que cabe destacar com esse dado é a situação de dependência de IFAs fabricados no exterior, configurando um risco para a saúde pública brasileira. Dados da Anvisa dos anos de 2018 e 2019 informam que os IFAs provenientes da Índia e da China contabilizavam juntos 60% das petições para certificação. Espanha, Itália e Alemanha aparecem como os maiores fabricantes fora desse eixo. Já os fabricantes nacionais representavam apenas quatro de todos os dossiês de insumos enviados para a Anvisa entre esses mesmos anos.

É interessante destacar que apesar de Índia e China estarem em lugar de destaque de produção de IFAs para o mercado nacional, os dois países não dividem o mesmo patamar. Dados de 2020 apontam que 64% das certificações dos insumos importados pelas distribuidoras são provenientes da China e 30% da Índia, resultando em 94% de todos os insumos constantes da lista da Instrução Normativa (IN) 15/2009.

Todas essas informações refletem o tamanho da complexidade da cadeia e o nível de globalização em que ela se encontra, agravando ainda mais o panorama quando grande parte dos insumos é proveniente de uma determinada região. Essa realidade já era apontada pelos relatórios americanos como o grande problema a ser resolvido, com aumento progressivo e anual do déficit de medicamentos dos Estados Unidos. Dados de 2009 a 2011 já apontavam que 74% dos produtos tinham mais de um relato de indisponibilidade, sendo mais da metade classificada como crítica.

No Brasil, para que situações como essa não sejam uma realidade, há de se ter um esforço mútuo, com participação do governo brasileiro, visando ao aumento do parque industrial de insumos farmacêuticos em território nacional, já que dispomos do sexto maior mercado do mundo, com projeções de ultrapassar a quinta colocada, a França, já em 2023.

A redução da dependência brasileira na importação de insumos se dará pela construção de uma base sólida e de longo prazo para o fortalecimento do parque farmoquímico nacional. Imagina-se que a necessidade de se reduzir essa grande dependência externa deverá impulsionar a busca pela solução de vários gargalos existentes, para que nosso País possa, afinal, atingir um estágio de capacitação industrial local viável na área de insumos farmacêuticos.

Para suprir esses e outros gargalos importantes, também é preciso buscar o fortalecimento do arcabouço regulatório brasileiro, de forma que os riscos inerentes à fabricação de insumos sejam monitorados e mitigados, a partir da realização de inspeções efetivas, constantes, isonômicas e harmonizadas em nível mundial.

Um exemplo recente foi a busca do Brasil para aderir ao Programa de Inspeções Internacionais de Insumos Farmacêuticos Ativos. Essa é uma iniciativa global para garantia de boas práticas entre autoridades reguladoras, com o propósito de promover a confiança mútua por meio de uma melhor comunicação e de troca de informações sobre as inspeções e seus resultados. Por entender que todos os esforços para esse tema precisam ser realizados de forma conjunta, autoridades reguladoras da Europa, da Austrália e dos próprios Estados Unidos criaram, em 2008, o programa, que conta ainda com a participação de Canadá, Dinamarca, França, Itália, Irlanda, Reino Unido e Japão.

Com essas iniciativas, o Brasil caminha rumo ao robustecimento de ações regulatórias e melhores práticas de inspeção, fortalecendo a cadeia completa, garantindo o controle sanitário e contribuindo para um sistema público de saúde sustentável.

Bruna Oliveira
Bruna Oliveira
Trainee da Área Técnica
Marina Moreira
Marina Moreira
Coordenadora do projeto de parceria ABIFINA e Fiocruz e especialista em assuntos regulatórios na ABIFINA
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