REVISTA FACTO
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Mai-Ago 2020 • ANO XIV • ISSN 2623-1177
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//Artigo

PERSPECTIVAS SOBRE BOAS PRÁTICAS DE PLANTAS MEDICINAIS E AROMÁTICAS

O emprego de plantas medicinais e aromáticas em medicamentos tem despertado o interesse de indústrias e, com isso, a necessidade de adequar-se para que a droga vegetal seja fornecida de forma contínua, segura e com qualidade. A tendência por uma agricultura sustentável que considere não só a qualidade da droga vegetal e a sua produção, mas também as condições dos trabalhadores e o respeito pelo meio ambiente através das técnicas de manejo tem influenciado diversas diretrizes de boas práticas na agricultura.

As boas práticas de plantas medicinais e aromáticas envolvem diretrizes de práticas agrícolas e de coleta, diferenciando-se pelo modo como as plantas estão inseridas no meio ambiente. As práticas agrícolas são utilizadas para plantas cultivadas, e as práticas de coleta, para plantas oriundas do extrativismo ou coletadas no seu habitat. As plantas cultivadas sofrem a interferência do homem durante as fases de crescimento e desenvolvimento, da semente ao ponto de colheita. Já as plantas coletadas, muitas vezes, são acompanhadas e as partes de interesse somente são retiradas no período de produção.

A sustentabilidade da produção de plantas medicinais e aromáticas se dá pela implementação e acompanhamento das boas práticas de produção agrícola. Essas orientações consideram o manejo e conservação do solo, o controle de pragas priorizando o Manejo Integrado de Pragas (MIP), a saúde e segurança dos trabalhadores, o uso de fertilizantes com registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e sempre baseado em análise química do solo, o manejo do uso da água, a rotação de culturas, o controle de plantas espontâneas preferencialmente por métodos de menor impacto ao meio ambiente, a rastreabilidade da produção e as técnicas de colheita e pós-colheita que apresentem boa relação entre custo e benefício aos elos da cadeia produtiva e ao meio ambiente. Para garantir rastreabilidade, algumas destas informações devem ser anotadas na ficha de informações agronômicas para o Insumo Farmacêutico Ativo Vegetal (IFAV).

Outra forma de obtenção destas plantas é por meio do extrativismo vegetal, permitido no Brasil conforme a Lei nº 12651/2012. Os apêndices da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagens em Perigo de Extinção (CITES) são utilizados para consultar as espécies em perigo de extinção.

No Brasil, a maioria das espécies utilizadas como produtos florestais não-madeireiros não possuem plano de manejo definido e normas técnicas específicas. No entanto, planos de manejo florestais e inventários são ferramentas fundamentais quando se trabalha com plantas extraídas diretamente da natureza. Eles não só permitem conhecer a distribuição das espécies nos seus habitats, como também estimulam o extrativismo sustentável e consciente.

Em 2003, União Europeia, China e Japão estabeleceram diretrizes de boas práticas agrícolas e de coleta (GACP, na sigla em inglês) para plantas medicinais. Essas indicações foram aprovadas pela Organização Mundial de Saúde. O Brasil, porém, não possui diretrizes uniformizadas como em alguns países europeus e asiáticos e procura se adequar às normas já existentes. 

A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 26/2014 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) prevê avaliações de resíduos de agrotóxicos conforme a “Lista de agrotóxicos selecionados para análise” publicada pelo órgão na RDC nº 105/2016, juntamente com as listas das Farmacopeias Brasileira, Europeia e Americana, para espécies nativas. No caso das espécies exóticas, são usadas somente as listas das Farmacopeias citadas. No entanto, estas avaliações devem ser feitas na droga vegetal e apresentam custos elevados, por volta de R$ 10 mil por amostra. Esse custo é muito representativo quando se considera que a indústria recebe diferentes lotes de drogas vegetais, o que exige inúmeras análises. 

No caso de produção orgânica de plantas medicinais e aromáticas, quando há comprovação do manejo orgânico por meio de certificação, a RDC nº 105/2016 isenta a droga da exigência de análises de resíduos de agrotóxicos. Todavia, considerando-se o não uso de agrotóxico como requisito para a isenção das análises, há opções além da produção orgânica que poderiam ser consideradas. Por exemplo, seria possível liberar da análise o cultivo com adubação convencional e sem uso de agrotóxicos. Isso descaracterizaria do sistema orgânico, mas poderia ser considerado uma norma técnica para o cultivo de plantas medicinais aplicando diretrizes próprias de boas práticas. 

Há também outras certificações, como as boas práticas agrícolas de âmbito internacional (GlobalGap), para plantas medicinais e aromáticas. O MAPA lançou normas técnicas específicas para algumas culturas mais tradicionais, como o abacaxi, arroz, banana, caju, flores e plantas ornamentais, entre outras. Essas regras são acompanhadas por órgão competente e permitem obter um selo próprio. Essa produção integrada é válida para todas as cadeias do agronegócio e não há até o momento definição de normas técnicas específicas para plantas medicinais e aromáticas.

O detalhamento das práticas de cultivo ou de coleta de espécies medicinais e aromáticas oriundas da biodiversidade brasileira sofre de uma carência enorme. No geral, há poucas informações disponíveis sobre a produção destas espécies tanto para a quantidade de massa quanto para o teor do princípio ativo, considerando a interação com as condições edafoclimáticas, características físico-químicas do solo, necessidade de água e luz, pragas e doenças, interações ecológicas, métodos de colheita, pós-colheita e beneficiamento, entre outros fatores. 

O cultivo orgânico se mostra o método mais seguro na produção de plantas medicinais e aromáticas, sendo vantajoso também economicamente devido à isenção para análises de agrotóxicos nas drogas vegetais. Paralelo a isso, outro caminho possível seria a elaboração de normas técnicas específicas de produção integrada de plantas medicinais e aromáticas no MAPA, considerando princípios de boas práticas, a não utilização de agrotóxicos listados na RDC 105/2016, a utilização de insumos agrícolas registrados no MAPA e fertilizantes convencionais e orgânicos. 

Desta forma, com os avanços da produção de plantas medicinais e aromáticas no Brasil, a integração entre a indústria, os órgãos reguladores e as instituições de pesquisa e extensão rural torna-se fundamental para alavancar a produção integrada e regulamentada da agricultura sustentável nestas cadeias produtivas.

Douglas Francisco
Douglas Francisco
Engenheiro agrônomo, mestre em Horticultura pela Unesp.
Raquel P. Silveira Capaz
Raquel P. Silveira Capaz
Bióloga, mestre em Horticultura pela Unesp Ambos atuam em pesquisa e cadeias produtivas de plantas medicinais e aromáticas junto à empresa Brazbio.
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