REVISTA FACTO
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Jan-Abr 2020 • ANO XIV • ISSN 2623-1177
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//Especial COVID-19

O PAPEL DA FARMOQUÍMICA NACIONAL NAS GRANDES CRISES

Antonio Carlos F. Teixeira, diretor executivo | CEO da Globe Química e vice-presidente Farmoquímico da ABIFINA

O conceito de nação e soberania deriva essencialmente do fato ou ato de nascer, e de uma identidade socioideológica mais subjetiva, pela qual se congregam comunidades humanas com determinadas características culturais. A partir dessa congregação, países se formam e, algumas vezes, se dividem. Em condições adversas, a natureza humana tende a atuar, como nos descreveu José Saramago no livro Ensaio sobre a cegueira, de forma contrária àquelas constituídas a partir dos pilares da solidariedade e do apoio mútuo e colaborativo. Não estou dizendo que a sociedade como um todo irá fechar-se e negar seu apoio. Contudo, a escassez de recursos nos submete a escolhas e estas, usualmente sombrias, nos levam a perdas.

Em dias normais, a indústria farmoquímica tem como objetivo a produção de insumos farmacêuticos ativos, ou seja, visa produzir o bálsamo que conforta ou produz a cura. Para tal, inúmeros profissionais se congregam em torno de processos, técnicas e materiais, com o objetivo de transformar produtos sem nenhuma atividade farmacológica em medicamentos. Essa indústria, que no passado atuava de forma pujante no Brasil, foi gradativamente desmontada, tal como outras, e seu protagonismo foi transferido para China e Índia, em um movimento voluntário motivado pela globalização.

Em números absolutos, a nossa participação caiu significativamente. Se considerarmos que a demanda do Brasil em 2018 era de 2,9 bilhões de reais (1) em insumos farmacêuticos ativos (IFAs), a produção nacional hoje representa aproximadamente 19% desse total. Ou seja, vivenciamos uma dependência significativa dos produtores internacionais.

De fato, a China – tida como a fábrica do mundo – e a Índia são responsáveis por quase 100% da produção mundial de IFAs, de uma forma direta ou indireta (2). Quando consideramos que a interdependência desse mercado é elevada, temos um cenário em que a escassez de um insumo afeta toda a cadeia produtiva. Conforme o quadro a seguir demonstra, a falta de anilina, produzida na Índia, impactará a produção de paracetamol na China, bem como a falta de citosina irá impactar, entre outros casos, a produção de insumos para o câncer e também da lamivudina.

Assim, em crises como esta provocada pela covid-19, a busca por insumos é uma tarefa desafiadora, principalmente quando esta é acompanhada pelas severas restrições na mobilidade humana. Estamos vivenciando restrições governamentais na exportação de insumos, restrições logísticas severas e, apesar de todo o potencial tecnológico da nação brasileira, nos encontramos prostrados frente às adversidades presentes, por não dispormos de uma infraestrutura capaz de atuar de forma célere ante os desafios impostos.

No momento atual da crise, a indústria nacional está sendo questionada sobre sua capacidade de manter a produção, apesar do fechamento anunciado pela Índia, e de desenvolver e produzir a hidroxicloroquina ou a cloroquina – medicamentos testados no tratamento da covid-19. Nesse ponto é importante destacar que não nos falta capacidade técnica para uma produção cem por cento nacional da cloroquina.

Faltam-nos fábricas, conectividade técnica e produtiva para identificar potenciais produtores de matérias primas no Brasil e uma política de governo que incentive a capacitação fabril, a verticalização produtiva e a integração da cadeia produtiva, prestigiando, assim, conceitos como estratégico, essencial e fundamental para a sociedade tida como nação. A importância desse conceito transcende o limite da segurança sanitária, tendo em vista que essa mesma base fabril é responsável pelos defensivos agrícolas, pelos medicamentos veterinários e por uma parcela significativa de insumos necessários para a manutenção de uma sociedade saudável.

Vivenciamos agora a parcela invisível do custo de não produzir, o preço da inação frente ao processo de concentração fabril, o qual, em prol da redução imediata dos custos, permitiu o desmonte dos parques industriais voltados para a produção nacional de insumos farmacêuticos ativos. Cabe a nós, sociedades de classe, entidades coletivas e agentes políticos, transmudar o status quo atual, incentivando a construção de uma nova politica nacional de desenvolvimento sensível a outros princípios que abarquem os conceitos de essencialidade, fundamentalidade e estratégia, em um patamar equivalente aos conceitos de economicidade e universalidade.

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(1) Fonte: Estatísticas ABIFINA. Disponível em http://www.abifina.org.br/estatisticas_importacoes.php. Acesso em 07/04/2020.

(2) Destacam-se também nesse mercado empresas localizadas em Israel, Itália e Alemanha.

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