A indústria farmacêutica brasileira demonstrou rapidez na reação à pandemia gerada pelo novo coronavírus. Institutos de pesquisa científica, laboratórios e empresas se mobilizaram de forma a buscar tratamentos para a covid-19, doença causada pelo patógeno. Para tal, contaram com a colaboração de voluntários, que concordaram em se submeter a tratamentos experimentais.
A EMS, uma das líderes do mercado farmacêutico no Brasil, produz sulfato de hidroxicloroquina para o tratamento de malária e doenças autoimunes e recebeu aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para dois protocolos de pesquisa clínica para uso de hidroxicloroquina em pacientes com covid-19. “Desde o surto de H1N1, verificou-se que a cloroquina possuía propriedades antivirais. Quando a atual pandemia começou, a comunidade científica já tinha dados anteriores sobre a substância e considerou-a como uma alternativa de tratamento”, explica o diretor-médico científico da EMS, Roberto Amazonas.
Ele ressalta que ainda não há comprovação de como a substância atua, mas existem algumas hipóteses. “A hidroxicloroquina pode atuar dentro da célula alterando o pH, a ligação do receptor celular (o que dificulta a entrada do vírus) ou a transcrição de proteínas, interferindo no processo de desenvolvimento viral. Mas somente os testes nos darão uma resposta”, afirma.
Segundo Amazonas, em algumas semanas será possível ter uma análise intermediária, o que indicará a tendência dos resultados. No entanto, a finalização do estudo deverá levar mais de dois meses. “Em termos de testes clínicos, constitui um prazo muito curto, mas só vamos conseguir obtê-lo porque estamos fazendo um esforço grande em função da urgência que o momento exige”.
E se a hidroxicloroquina apresentar bons resultados? “Para atender a uma grande parcela da população, será necessário que outros players do mercado se envolvam na produção do medicamento”.
Não deve faltar colaboração. O Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz) é produtor público de cloroquina, voltado para o tratamento de malária no Sistema Único de Saúde (SUS). “Temos condições de ampliar rapidamente a produção de cloroquina desde que tenhamos acesso ao fornecimento regular do insumo farmacêutico ativo (IFA)”, afirma o diretor de Farmanguinhos, Jorge Mendonça. “Entretanto, esses insumos para nossa produção do difosfato de cloroquina vêm de fora do País. Por isso é tão importante a manutenção da cadeia logística de abastecimento regular pelo fabricante”.
De acordo com Mendonça, será possível atender a todos os casos de covid-19 e ainda manter o abastecimento dos portadores de outras doenças que precisam do medicamento. “Por exemplo, toda a demanda de difosfato de cloroquina para o tratamento da malária em 2020 foi entregue ao Ministério da Saúde, ou seja, a necessidade deste ano já foi garantida”, diz. “Se tivermos suprimento de IFA, conseguiremos atender até mesmo ao mercado internacional, caso seja necessário”.
OUTRAS INICIATIVAS
Institutos de pesquisa e empresas farmacêuticas estão testando outros medicamentos, além da cloroquina, para descobrirem um possível tratamento para a covid-19. O laboratório Aché está doando R$ 5 milhões para iniciativas voltadas ao combate à pandemia, inclusive pesquisas clínicas. Um dos estudos é o primeiro no mundo a investigar o uso da dexametasona em pacientes graves tratados em UTI com Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo causado pela nova doença.
“O Aché destinou 2,5 mil ampolas de dexametasona, além do apoio financeiro para a realização da logística de entrega do medicamento aos mais de 40 centros de pesquisa participantes e para a contratação do seguro para os voluntários, oferecendo assim cobertura e tranquilidade para quaisquer necessidades médicas durante e após o término do estudo”, explica Stevin Zung, diretor médico do Aché.
O estudo, que envolverá 300 participantes, é coordenado pelo Hospital Sírio Libanês e faz parte da força tarefa apoiada pelo Ministério da Saúde chamada de Coalizão Covid-19 Brasil.
Outra empresa que participa do esforço é a farmacêutica brasileira Eurofarma. “Somos parceiros do Instituto de Ciências Biomédicas da USP há alguns anos e tínhamos cedido uma biblioteca com 1,5 mil compostos para ensaios na área de antibióticos. Agora, essas mesmas moléculas serão testadas no contexto da covid-19”, revela a vice-presidente de Inovação da companhia, Martha Penna.
Por Fernando de Moraes.