A última Facto deste ano aborda uma agenda de mudanças. São temas que merecem ser integrados às políticas públicas, que esperamos ser delineadas a partir de 2020. A inovação incremental, em geral pouco valorizada diante da expectativa de altos retornos das inovações radicais, precisa estar no foco de governos e empresas, como é abordado na cobertura do Seminário Internacional Patentes, Inovação e Desenvolvimento (SIPID). Promover melhorias em produtos existentes também exige esforço e inteligência. Também resulta em ganhos de eficiência e competividade. Porém demanda menor risco, investimento e tempo, sendo alavanca para o desenvolvimento posterior de inovações de maior porte. É um ponto de partida estratégico para indústrias que pretendem se estruturar e crescer a partir da inovação.
O SIPID completou dez anos e manteve a tradição de reunir palestrantes de renome para discutir temas de ponta como esse, expondo seus diversos e complexos aspectos. Assim, vimos como a inovação incremental tem um papel importante na descoberta de novas drogas em classes já conhecidas e como pode ser estimulada, inclusive por políticas de propriedade intelectual (PI). Esse foi um dos aspectos tratados pelo conferencista ido SIPID Ryan Abbott, professor da University of Surrey, do Reino Unido. Para ele, a inovação incremental é mais segura e ainda pode ser altamente lucrativa.
No Brasil, a participação das empresas instaladas no País nas inovações ainda é pequena. Conforme mostrou Núbia Gabriela Chedid, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), é baixo o número de pedidos de patentes de inventores nacionais.
Quanto à velha questão da demora no exame de patentes, a aposta do INPI é no Plano de Combate ao Backlog, com medidas administrativas que prometem reduzir a fila. Conforme a diretora de Patentes Liane Lage mostrou no SIPID, mais de 20 mil pedidos de exame foram decididos ou arquivados desde o início do programa, em agosto. A ABIFINA apoia e aguarda mais resultados do Plano para sanar o urgente problema do atraso, que provoca enormes prejuízos ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Esse tema é abordado na presente edição da Facto em entrevista com Júlia Paranhos, economista e pesquisadora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Dados de um estudo inédito, que será publicado em uma revista científica, revelam o impacto do backlog. Na estimativa realizada, o SUS poderia economizar de R$ 1,1 bilhão a R$ 3,8 bilhões com nove medicamentos, caso pudessem ser comprados os genéricos e biossimilares. Porém, isso não é possível, pois suas patentes terão validade estendida em decorrência da demora no exame do INPI. É máxima a urgência de se solucionar a questão.
Ainda na área de saúde, Facto aborda os avanços na reformulação do marco regulatório de insumos farmacêuticos ativos (IFAs). Acreditamos que em 2020 mudanças sejam implementadas, o que irá contribuir para a qualificação dos fornecedores nacionais e o fortalecimento da cadeia produtiva no País. Tanto que um dos pontos principais da revisão do marco regulatório é a harmonização das normas sanitárias com os padrões internacionais, o que passa segurança para os compradores de IFAs e coloca a indústria brasileira em pé de igualdade com competidores internacionais.
Com o novo marco legal, a aprovação do processo na Anvisa funcionará como espécie de chancela, de atestado de qualidade, elevando o padrão de exigência para todo o conjunto de IFAs do mercado. Além disso, instituirá condições isonômicas para as indústrias nacionais e estrangeiras. A questão do pós-registro desses insumos também avança, com regras claras para a formalização de mudanças junto à Anvisa. De forma geral, espera-se que o novo marco legal reduza o custo operacional tanto da agência como do setor regulado.
Diante desse e de tantos outros avanços que a Anvisa vem obtendo ao longo dos anos, a ABIFINA é fortemente contra projetos de lei que tramitam na Câmara dos Deputados propondo o registro automático de medicamentos já registrados no exterior. A medida só enfraquece a indústria nacional e a própria Anvisa, que atua com padrão técnico de alto nível, hoje comparável ao das agências dos principais países desenvolvidos.
Em paralelo à pauta setorial, a matéria política desta edição analisa a Reforma Tributária, que pode ser considerada a principal agenda macroeconômica, por apresentar impacto mais direto e imediato na atividade produtiva do que as Reformas Trabalhista e da Previdência. São mudanças que mexem na oferta e na demanda – no bolso do empresário e do cidadão.
Talvez seja a primeira vez que exista um esforço real de articulação entre o Executivo e o Legislativo para buscar consenso e colocar em prática a Reforma Tributária. Estão na mesa pontos como transferir a tributação do consumo para a renda, instituir um sistema menos regressivo, simplificar impostos e, ainda assim, aumentar a arrecadação. Certamente o debate será longo e difícil, mas essencial para que o Brasil consiga destravar a economia e distribuir renda.
Enquanto isso, as empresas brasileiras brigam para se manter no mercado e, por vezes, ainda conseguem se internacionalizar. É o caso do laboratório Aché. Artigo de sua presidente, Vânia Nogueira de Alcantara Machado, conta que a farmacêutica busca soluções inovadoras para necessidades médicas não atendidas por meio da prospecção de parceiros internacionais e de uma estratégia de licenciamento de produtos desenvolvidos no Brasil. Já são 32 produtos exportados para mais de 26 países.
A produção de tecnologias agrícolas é outra área em que o Brasil vem se destacando, de acordo com outro artigo desta edição, assinado pelo professor Edivaldo Domingues Velini, da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista (Unesp). Segundo ele, o Brasil é o único país que alia tecnologias para a produção agrícola e pecuária, e grandes áreas cultiváveis sem necessidade de desmatamento. Esse conjunto de oportunidades pode e deve ser aproveitado pela indústria nacional de química fina.
Muitos dos temas desta Facto serão retomados ao longo de 2020 pela ABIFINA em diversas atividades. Uma delas será o Ciclo de Palestras, lançado em novembro deste ano com o tema “Pesquisa e produção de medicamentos a partir da biodiversidade”. O objetivo da iniciativa é colocar em evidência temas que afligem a indústria de química fina, de forma a articular o setor para um processo de mudança. A ABIFINA espera que seja uma contribuição para a transformação de que o Brasil precisa.