REVISTA FACTO
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Jan-Mar 2017 • ANO XI • ISSN 2623-1177
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//Artigo

SITUAÇÃO ATUAL E PERSPECTIVAS DA INDÚSTRIA DE DEFENSIVOS AGRÍCOLAS NACIONAL

Defensivos agrícolas1 são substâncias ou misturas de substâncias químicas utilizadas para prevenir, destruir, repelir ou inibir a ocorrência ou efeitos de organismos vivos capazes de prejudicar as lavouras agrícolas (National Research Council, 2000). Os principais tipos de defensivos obtidos por processos químicos são: herbicidas, inseticidas, fungicidas e acaricidas.

O aumento da população mundial, a elevação no consumo de calorias per capita, a diminuição das terras aráveis e a necessidade de melhorar a produtividade das culturas agrícolas são os principais fatores que impulsionam os mercados da indústria. Estima-se que o mercado global dos defensivos alcançou uma receita de US$ 52 bilhões em 2015 e que seu crescimento até 2020 será de aproximadamente 4% a.a.

Na indústria mundial, há muitos competidores, mas apenas parte deles possui uma parcela significativa do mercado. Em 2010, as seis maiores empresas, Syngenta, Bayer, Basf, Dow, Monsanto e Dupont, detinham 67% das vendas. Em 2016, a aquisição da Monsanto pela Bayer e a fusão entre a Dow e a Dupont indicam que cerca de 2/3 do mercado mundial deverá pertencer às quatro maiores empresas do setor a partir de 2018. Em 2016, a anunciada aquisição da empresa suíça Syngenta pela chinesa ChemChina, por US$ 43 bilhões, marcou a entrada da primeira empresa chinesa no segmento de produtos com patentes2.

No Brasil, as vendas da indústria alcançaram aproximadamente US$ 9,4 bilhões em 2016. Apesar de constituir de 15% a 20% do mercado mundial nos últimos 10 anos, disputando continuamente a liderança global com os Estados Unidos, a indústria local tem apresentado expressivos déficits comerciais.

Vendas, importações, exportações e saldo comercial de defensivos no Brasil (US$ bilhões)

Fonte: Sindicato Nacional da Indústria de Produtos
para Defesa Vegetal (Sindiveg), elaboração própria.

Ao longo dos últimos 20 anos, além dos desafios comuns a outras cadeias produtivas locais, os investimentos na indústria brasileira se reduziram por duas razões principais:

– A Lei 9.430/1996, que, ao regular os preços de transferência, reduziu os incentivos à produção em diversas cadeias produtivas locais ao arbitrar margens máximas de lucro ou preços máximos de aquisição. A situação perdurou até 2012, quando a Instrução Normativa RFB nº 1.312 estabeleceu parâmetros mais favoráveis aos investidores internacionais.

– O processo de concessão de registros de produtos.

No Brasil, o Decreto 24.114, de 1934, constituiu o marco regulatório inicial dos defensivos agrícolas, posteriormente substituído pela Lei 7.802/1989, regulamentado pelo Decreto 4.074/2002 e que definiu a estrutura de autoridade para a concessão de registros, compartilhada entre a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama), e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A Anvisa verifica as questões de segurança toxicológica; o Ibama, os aspectos da segurança ambiental; e o Mapa avalia a efetividade agrícola do produto e concede o registro após manifestação favorável dos outros dois órgãos.

As oportunidades de mercado no Brasil incentivaram o aumento de solicitações de registros de produtos por empresas de diversas naturezas: brasileiras, estrangeiras, fabricantes ou importadoras. Tal elevação originou uma longa lista de espera para obtenção de registros de comercialização.

Uma proposta para solução da questão foi formulada pela empresa Bain (2014), durante o Estudo da Diversificação da Indústria Química, financiando pelo BNDES. Para atrair investimentos e desenvolver a indústria, seria necessária uma decisão de governo definindo critérios de priorização das análises pelos órgãos anuentes.

Em 11 de agosto de 2015, o Mapa emitiu a Portaria 163, elencando como critérios de priorização as análises de produtos que, em resumo, se associem a:

(i) Controle dos maiores riscos com pragas;
(ii) Manejo integrado3;
(iii) Menores custos agrícolas;
(iv) Produção local.

A proposta do Mapa veio ao encontro do objetivo de estímulo à fabricação de produtos no parque industrial brasileiro e ao desenvolvimento de tecnologias locais, contribuindo para uma melhor coordenação das políticas e processos dos três órgãos anuentes.

Os primeiros resultados são promissores. Segundo o Mapa, em 2016 foram registrados 277 novos agroquímicos no Ministério, comparados a 139 novos produtos em 2015, batendo o recorde histórico de 203 novos produtos registrados em 2007 (Mapa, 2017).

Adicionalmente, os participantes da indústria reconhecem melhorias nos processos internos e os esforços dos técnicos dos órgãos reguladores, assim como observam a busca contínua de uma maior harmonização dos sistemas científicos locais aos dos órgãos reguladores mais avançados no mundo.

Além da questão dos registros, há desafios com o financiamento para compras de defensivos. A indústria vem desenvolvendo mecanismos de barter e de emissão de Certificados de Recebíveis do Agronegócio, instrumento de captação de recursos destinados a financiar transações no mercado.

Outro desafio que a indústria enfrenta se relaciona aos produtos ilegais, o que inclui casos de roubos, contrabando e falsificações. O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) está finalizando um estudo destinado a quantificar e sugerir alternativas para solução do problema, que vem prejudicando o desenvolvimento da indústria de defensivos e seus clientes.

Os benefícios da atividade industrial no Brasil

Após mapear e analisar 65 segmentos, o Estudo da Diversificação da Indústria Química Brasileira, que foi efetuado pela empresa Bain (2014), destacou a indústria de defensivos agrícolas como aquela que reúne as melhores condições locais da indústria química para desenvolvimento no País.

Durante o estudo, os principais players do mercado acreditavam que o País poderia produzir até 30% das necessidades mundiais localmente, destinando 2/3 desse valor ao mercado local e 1/3 às exportações. No estudo, foram quantificados os benefícios econômicos da expansão de investimentos na indústria local em dois cenários:

– No mais conservador, seriam produzidos localmente 100% do valor dos produtos formulados e 50% dos produtos técnicos, alcançando-se: investimentos de US$ 1,8 bilhão, um impacto de US$ 7 bilhões no saldo comercial, uma contribuição ao PIB de US$ 3,9 bilhões e um aumento da arrecadação de US$ 0,7 bilhão em 2030.

– No segundo, mais otimista, seriam alcançados 30% do valor da produção mundial de defensivos e alcançados: investimentos de US$ 5,4 bilhões, um impacto de US$ 18 bilhões no saldo comercial, uma contribuição ao PIB de US$ 8,7 bilhões e um aumento da arrecadação de US$ 1,5 bilhão em 2030.

Além desses, outros importantes benefícios dos investimentos locais seriam:

– Redução de preços para os agricultores, devido ao aumento da competição.

– Desenvolvimento de produtos mais adequados ao agronegócio local.

– Maior segurança sanitária e ambiental no País, devido ao monitoramento mais próximo dos processos industriais pelos órgãos reguladores.

Conclusão

O principal vetor de crescimento da indústria, o agronegócio brasileiro, segue em seu caminho de ampliação de produção e competitividade.

No curto prazo, além de perspectivas climáticas favoráveis, as informações de janeiro deste ano do Levantamento Sistemático da Produção Agrícola, do IBGE, que acompanha mensalmente a produção esperada das safras dos principais produtos do País, estimam um crescimento de 4,8% no volume de 2017 em relação ao ano anterior.

No médio prazo, uma oportunidade poderá decorrer de possíveis retaliações de alguns países às anunciadas medidas protecionistas dos EUA, um grande exportador de grãos. Assim, o agronegócio local poderia capturar parcelas de mercado que lhe adicionariam expressivos volumes, assim como à indústria de defensivos agrícolas.

No longo prazo, a necessidade de alimentação da população mundial – estimada em 7,3 bilhões de pessoas, das quais cerca de 795 milhões ainda estão em condições de subnutrição, de acordo com a Organização das Nações Unidas em 2016 –, e a escala, produtividade e sofisticação do agronegócio brasileiro, associados ao clima local – que proporciona tanto colheitas múltiplas como desafios para o controle de pragas –, indicam que as perspectivas para a indústria de defensivos agrícolas no Brasil continuarão a ser das melhores para a indústria química no País.

1 Há um amplo número de termos utilizados como sinônimos, nem sempre de maneira precisa, entre eles: agroquímicos, agrotóxicos e pesticidas. Neste artigo, será adotado unicamente o termo “defensivos agrícolas” para designar tais substâncias.

2 Em fevereiro de 2017, a aquisição da Syngenta pela ChemChina ainda dependia da aprovação das autoridades de: Brasil, Canadá, China, EU, Índia, México e EUA (MOREIRA, 2017).

3 O manejo integrado é uma estratégia de controle múltiplo de infestações que tem como objetivo diminuir as chances dos insetos ou doenças de se adaptarem a alguma prática defensiva, por meio de técnicas alternativas ou adicionais ao uso de produtos químicos.

* Este texto reproduz exclusivamente a opinião pessoal do autor

Referências

• Bain. Estudo da Diversificação da Indústria Química. Disponível em: http://www.bndes.gov.br/wps/wcm/connect/site/. Acesso em 29/12/2016, 2014.

• Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Mapa altera registros de agrotóxicos destinados às pragas do trigo e da cevada. Disponível em: http://www.agricultura.gov.br/noticias/mapa-altera-registros-de-agrotoxicos-destinados-as-pragas-do-trigo- -e-da-cevada. Acesso em: 14/2/2017, 2017.

• MOREIRA, A. Uma Ponte Suíça entre Brasil e China. Valor Econômico. 9/2/2017.

• NATIONAL RESEARCH COUNCIL. The future role of pesticides in US agriculture. Washington, D.C., National Academy Press, 2000.

Martim Francisco de Oliveira e Silva
Martim Francisco de Oliveira e Silva
Professor da PUC-Rio e engenheiro do BNDES.
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