REVISTA FACTO
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Abr-Jun 2014 • ANO VIII • ISSN 2623-1177
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OS AVANÇOS NA POLÍTICA INDUSTRIAL E TECNOLÓGICA DO BRASIL
//Entrevista Luiz Antonio Elias

OS AVANÇOS NA POLÍTICA INDUSTRIAL E TECNOLÓGICA DO BRASIL

Luiz Antonio Elias acompanhou a formulação da atual política tecnológica e industrial brasileira. Secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em 2006 e secretário-executivo da pasta de 2007 a 2014, é com grande experiência que Elias concedeu esta entrevista à Factona primeira quinzena de abril, na qual avalia a evolução dos incentivos governamentais à indústria nacional. Hoje pesquisador titular do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), ele considera que a indústria de transformação vem respondendo aos estímulos. O especialista destaca os desembolsos de R$ 7 bilhões do BNDES para incentivar a inovação nas empresas. A atenção para a formação de recursos humanos, a construção de uma estrutura de desenvolvimento biotecnológico e as Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) são outros pontos estruturais, como aponta o entrevistado a seguir.

Luiz Antonio Elias acompanhou a formulação da atual política tecnológica e industrial brasileira. Secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em 2006 e secretário-executivo da pasta de 2007 a 2014, é com grande experiência que Elias concedeu esta entrevista à Factona primeira quinzena de abril, na qual avalia a evolução dos incentivos governamentais à indústria nacional. Hoje pesquisador titular do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), ele considera que a indústria de transformação vem respondendo aos estímulos. O especialista destaca os desembolsos de R$ 7 bilhões do BNDES para incentivar a inovação nas empresas. A atenção para a formação de recursos humanos, a construção de uma estrutura de desenvolvimento biotecnológico e as Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) são outros pontos estruturais, como aponta o entrevistado a seguir.

Como o senhor, que é um ator político relevante na área, percebe nos últimos dez anos o avanço da ciência, tecnologia e inovação no sentido de se tornarem política de Estado?

Os governos do presidente Lula e o atual, da presidenta Dilma Roussef, implementaram uma estratégia de desenvolvimento socioeconômico de longo prazo, de forma consistente e bem-sucedida. Os avanços obtidos pelo sucesso das políticas implementadas permitiram a redução da nossa vulnerabilidade externa e da fragilidade fiscal. A relação dívida líquida/PIB em 2013 girou em torno de 35%. E o fortalecimento do mercado interno o tornou vetor dinâmico do crescimento – mais de 40 milhões de pessoas retiradas da condição de pobreza nos últimos anos. Tais fatores foram decisivos para superarmos a crise internacional de 2008.

No período mencionado, nossas reservas internacionais saíram de US$ 37,8 bilhões para cerca de US$ 373 bilhões em 2013, sendo que o Investimento Externo Direto (IED) saltou de US$ 16,6 bilhões para cerca de US$ 65 bilhões, tornando o Brasil no quinto País em termos de fluxo a nível global. Soma-se a isso o fortalecimento de instrumentos de planejamento e regulação econômica do Estado brasileiro. Inaugurou-se, portanto, um novo ciclo de desenvolvimento com crescimento e distribuição de renda.

A diretriz estratégica para as próximas décadas é combinar cada vez mais educação universal de qualidade, pesquisa científica e ampliação da infraestrutura laboratorial, com inovação e inclusão social. Nesse sentido, os avanços obtidos são significativos: expansão da liderança brasileira na economia do conhecimento natural; ampliação das bases para uma economia de baixo carbono; incremento da formação de recursos humanos com a expansão das universidades federais; ampliação da rede de ciber infraestrutura; criação de 123 Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCTs); implementação do programa Ciência Sem Fronteiras, com a meta de 101 mil bolsas de estudo no exterior; apoio à inovação com a criação da Embrapii e o programa Inova Empresa, com a meta de investir R$ 32,9 bilhões até dezembro de 2014.

Portanto, o fortalecimento do Sistema Nacional de C,T&I é um dos pilares de uma política de competitividade sistêmica. Tanto o setor público quanto as empresas desempenham papel-chave no fortalecimento desse sistema.

Um dos fatos mais marcantes a partir de 2004 foi a elaboração e revisão periódica de políticas industriais explícitas. Como avalia o desempenho das mais recentes, que são as PDPs e o Plano Brasil Maior?

Três fatores foram importantes como motores do investimento no País: crescimento com distribuição, via produção e consumo de massa – o que proporcionou um forte impacto nas cadeias produtivas internas; a expansão da matriz centrada em infraestrutura e em petróleo; e o incremento do uso dos recursos naturais, com mais intensidade tecnológica, tanto na via de utilização dos insumos como na dos implementos agrícolas.

Como menciona o pesquisador da UFRJ R. Bielschowsky, aliou-se, com as políticas implementadas, dois “turbinadores” aos três vetores que mencionei: inovação, educação e um processo dinâmico de encadeamento, com intensidade em média e alta tecnologia nas cadeias produtivas tradicionais, visando gerar maior valor agregado ao produto final. Adicionalmente duas outras dimensões críticas foram tratadas nos objetivos das políticas públicas (em especial, no Plano Brasil Maior e na ENCTI), que são a integração territorial e a sustentabilidade ambiental.

Assim, o fortalecimento dos investimentos, aliado a um sistema nacional de C,T&I mais robusto com a participação decisiva das Fundações de Amparo à Pesquisa dos Estados da Federação (FAPs), permitiu estreitar os vínculos entre o setor produtivo e o aparato universitário de ciência e tecnologia, as agências de fomento, e os laboratórios públicos e privados de P&D. Isto de modo a não somente corrigir nossas assimetrias, como também ampliar o financiamento no longo prazo de projetos inovadores.

Portanto, a variedade de mecanismos de apoio e instrumentos criados nos últimos anos elevou sobremaneira a formação de recursos humanos em áreas estratégicas. Também permitiu a ampliação e consolidação de um modelo decisivo para a geração de maior conhecimento no País, com a construção de laboratórios multiusuários. Um exemplo é o projeto do reator multipropósito, com forte impacto na medicina nuclear.

Sob o estímulo das políticas industriais, o Ministério da Saúde incluiu em sua pauta a relação entre saúde e desenvolvimento do País. Como foi a experiência de relacionamento do MCTI com o MS?

O governo federal tem realizado articulações estratégicas entre o setor público e privado, numa parceria exitosa entre o MCTI e o MS para a construção e ampliação de laboratórios no Brasil e formação de RH. Mais recentemente, com o lançamento do Plano Inova Empresa e as PDPs, temos reforçado em muito os investimentos para promover o desenvolvimento tecnológico, inovação e substituição de importação de medicamentos, de modo a reduzir a dependência tecnológica nacional.

A profícua articulação entre o MS e o MCTI tem proporcionado o desenho conjunto de programas e ações de C,T&I desde 2007, das quais podem se destacar a consolidação de redes de pesquisa em áreas prioritárias como a Rede Nacional de Terapia Celular (RNTC), a Rede Malária e a Rede Brasileira de Pesquisa sobre o Câncer, além de projetos de grande porte como o Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA) e o Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (ERICA).

Outra iniciativa importante dessa parceira, no âmbito do Plano Inova Empresa, foi o lançamento dos editais do Inova Saúde para fármacos (biofármacos, farmoquímicos e medicamentos) e para equipamentos médicos (equipamentos, materiais e dispositivos). As chamadas públicas disponibilizaram recursos na ordem de R$ 1,9 bilhão e receberam uma demanda qualificada de R$ 4,7 bilhões para o apoio às atividades de inovação do Complexo da Saúde. Outro passo decisivo na interface MCTI e MS foi a criação de empresas nacionais para atuar em biofármacos, com o apoio do BNDES.

O governo federal tem atuado ainda para utilizar o poder de compra do Estado, construir um arcabouço regulatório moderno e apoiar financeiramente projetos estruturantes. Integrar os diversos “elos” do processo de desenvolvimento e produção de medicamentos é fundamental para dar sustentação, no longo prazo, para a indústria de fármacos e biofármacos no Brasil. Ou seja, investimos em uma estratégia ativa, dirigida a criar, ampliar e manter a competitividade sistêmica.

Como avalia o desempenho da inovação na indústria de transformação brasileira?

O Brasil vem progredindo rapidamente na maturação do processo de inovação industrial. Um exemplo é o volume de recursos para inovação, que cresceram muito fortemente. No BNDES, os desembolsos para inovação passaram de R$ 322 milhões em 2007 para mais de R$ 5 bilhões (R$ 7 bilhões, se considerados os desembolsos para a Finep) em 2013. Destes, mais de R$ 2 bilhões foram aplicados diretamente na indústria de transformação. Outro exemplo importante é o crescimento percentual do conhecimento no valor agregado da indústria de transformação brasileira, em detrimento de uma matriz intensiva em trabalho.

Além disso, observam-se inovações na concepção comercial dessas indústrias. Os serviços relacionados à manufatura, que em 1996 representavam cerca de 36% de todo o valor adicionado, pulou para cerca de 60% em 2011, o que nos coloca em linha com os modelos de produção adotados por indústrias globais maduras. Isto é especialmente importante se considerarmos que vem sendo observado um aumento na produtividade do setor de serviços relacionados à indústria. Outra importante inovação institucional foi a articulação da Política de C,T&I com a Política Industrial, da qual a indústria de transformação foi um importante foco.

Na política atual, o que o senhor destaca referente ao complexo da química fina?

Para o complexo da química fina, além dos grandes laboratórios farmacêuticos implantados, diversos avanços foram observados, sobretudo no tocante à priorização do setor. O Plano Inova Empresa, por meio do Inova Saúde, que conta com recursos da ordem de R$ 1,9 bilhão, contemplou as frentes de farmoquímica e novos materiais. O Inova Agro, com recursos de R$ 1 bilhão, busca estimular, entre outros, os investimentos em inovação na agroquímica. Além disso, estima-se maior financiamento ao setor químico como um todo – um crescimento de 23,8% para o período de 2014 a 2017, quando em comparação com 2009 a 2012.

Caso aprovada pelo Senado e sancionada pela Presidência, que impactos terá na indústria a PEC 290/13, oriunda da proposta do Código de Ciência, Tecnologia e Inovação?

A proposta acolhida e debatida de forma exaustiva pelas instâncias de governo tem forte impacto no setor produtivo e na academia, ao destravar procedimentos e estabelecer diretrizes mais flexíveis para a área. Temas como a revisão da Lei das Fundações (sancionada recentemente), a legislação sobre importação de insumos para a pesquisa, o acesso à biodiversidade e um regime diferenciado de compras são relevantes tanto para o setor produtivo quanto para a academia.

A proposta resultou no PL nº 2.177/2011, na Câmara dos Deputados, e no PLS nº 619/2011, no Senado Federal. A PEC 290/2013 traz importantes aperfeiçoamentos no texto constitucional, em especial: explicita mais claramente as expressões ciência, tecnologia e inovação; explicita mais claramente o papel do Estado no incentivo a essas áreas; estimula a interação entre entes públicos no desenvolvimento tecnológico e inovação; e permite a legislação concorrente entre os entes federativos nessa área, entre outros tópicos relevantes.

Luiz Antonio Elias
Luiz Antonio Elias
Ex-secretário-executivo do MCTI.
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