REVISTA FACTO
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Out-Dez 2013 • ANO VII • ISSN 2623-1177
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//Editorial

O REAL SIGNIFICADO DA PROPRIEDADE INTELECTUAL

“A lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização (…) tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país”

Não existe um direito natural à propriedade intelectual. E bens intangíveis – como o conhecimento – têm características distintas de bens materiais. Na sua origem, no século XVI, a proteção à propriedade intelectual visava incentivar inventores a colocar produtos inovadores no mercado para melhor satisfazer as necessidades sociais de um determinado país. Tratava-se, pois, de um mecanismo político objetivando a proteção aos inventores para acelerar o desenvolvimento via colocação no mercado de novos produtos. Essa visão, adotada pela maioria dos países, foi incorporada ao único tratado internacional que tratava da matéria até o final do século passado – a Convenção da União de Paris (CUP). Essa Convenção valia-se do tratamento nacional, em que os países signatários eram livres para oferecer aos inventores as condições de proteção que julgassem convenientes, embora não pudessem discriminar quanto à origem dos inventores – nacionais ou estrangeiros.

Os Estados Unidos seguiram uma filosofia diferente, aproximando a proteção concedida aos bens intangíveis daquela ofertada a bens materiais, ou seja, para eles o fundamental era a proteção aos direitos do inventor. O conflito entre estas duas visões persiste até hoje e esteve subjacente a todas as revisões feitas na CUP

No inicio dos anos 70, a administração da CUP passou para a Organização Mundial da Propriedade Industrial (OMPI), criada para esse fim no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). Os Estados Unidos continuaram pressionando para que a OMPI adotasse regras harmonizadas para conceder patentes a que todos os países deveriam obedecer, mas sem sucesso diante da resistência oferecida por países em desenvolvimento. Diante disso, mudaram a estratégia procurando associar proteção à propriedade intelectual como uma possível barreira ao crescimento do livre comércio internacional, levando as discussões sobre propriedade intelectual da OMPI para uma organização relacionada ao comércio.

Após a segunda guerra mundial, o Conselho Econômico e Social da ONU sugeriu a criação de uma Organização Internacional do Comércio (OIC), destinada a regular o comércio entre nações, sendo em decorrência assinado em 1948 um Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), ao qual aderiram 23 países, sendo dez em desenvolvimento – incluso o Brasil. O GATT seria um acordo provisório até que a OIC fosse organizada, mas ficou permanente, pois a OIC nunca foi aprovada porque os Estados Unidos temiam que um órgão internacional pudesse ameaçar sua liderança nos fluxos internacionais de comércio.

Com o fracasso na criação da OIC, a atuação do GATT ficou até meados da década de 1980 restrita às negociações sobre tarifas. Em 1986 foi lançada a 8ª rodada de negociações do GATT – Rodada Uruguai, tendo os EUA finalmente anuído com a criação de uma Organização Mundial do Comércio (OMC), desde que essa organização envolvesse não apenas o comércio de bens (GATT), mas também serviços (GATS), investimentos (TRIMS) e propriedade intelectual (TRIPS), além de outros acordos específicos para regulamentar solução de controvérsias, medidas antidumping etc. Caberia, então, à OMC garantir a aplicação dos citados acordos.

Sob forte pressão de mega empresas da área farmacêutica, de entretenimento e de comunicação, os Estados Unidos e alguns países desenvolvidos da Europa e o Japão procuraram incluir no acordo TRIPS regras harmonizadas bastante rígidas, estendendo os conceitos de patentabilidade, duração da proteção, extinção da caducidade e licenças compulsórias, entre outros. A reação dos países em desenvolvimento foi bastante forte e o acordo final alcançado, por inspiração de Arthur Dunkell, então diretor geral do GATT, incluiu no texto de TRIPS flexibilidades destinadas a preservar a possibilidade de desenvolvimento de países retardatários.

Na Carta Constitucional de 1988, no tocante à Propriedade Industrial, foi estabelecido pelo Art. 5º, alínea XXIX, que “a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização (…) tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País”. Noutras palavras, a propriedade intelectual, na forma definida pela Constituição brasileira, nada mais é do que um instrumento de política pública dedicada ao desenvolvimento econômico e social do País, sendo mantido o Código da Propriedade Industrial vigente no país desde 1971.

A internalização desse acordo TRIPS na legislação brasileira ocorreu pela edição da Lei 9.279/1966 que, no entanto, não usou integralmente daquele acordo internacional.

As seguintes matérias foram colocadas na nova Lei de Patentes brasileira, sem encontrar abrigo no acordo TRIPS: possibilidade de ampliação produtos farmacêuticos ou agroquímicos.

Ainda não satisfeita, a Big Pharma a partir de 1996, levou o governo dos Estados Unidos a defender, no âmbito do Acordo de Livre Comércio pelos Estados Unidos nessa área.

Devido às reações por parte dos países em desenvolvimento no âmbito da OMC, os norte-americanos abandonaram as negociações multilaterais. qual têm aderido alguns países dessa área geográfica.

Nesse contexto, alguns países em desenvolvimento, como Argentina, Índia, Tailândia e Malásia, adotaram uma estratégia radicalmente oposta, discussão dessa matéria.

Nesse cenário, a primeira reivindicação de TRIPS Plus está relacionada ao que é patenteável (artigos 10 e 18 da lei brasileira). adiantados reconhecem integralmente.

O segundo objetivo diz respeito às condições de patenteabilidade, em que se aplicam critérios fracos de análise, especialmente restringida, bloqueando o lançamento de produtos genéricos.

A terceira demanda TRIPS Plus está relacionada à possibilidade de extensão do prazo da patente em função da demora em conceder por parte Judiciário nacional.

Dados proprietários são geralmente tratados no mundo por legislação independente e não interferem nas legislações de patentes. As recomendações de TRIPS são vagas quanto a essa matéria, pois apenas é recomendado que tais dados sejam protegidos. Nessa área, os EUA fixaram os prazos de proteção e estabeleceram o chamado linkage, atribuindo à agência responsável pela liberação do comércio de produtos farmacêuticos e agrícolas (FDA) também a tarefa de examinar se o produto submetido ao registro sanitário estaria infringindo algum direito patentário, caso em que o registro não seria concedido. Aí se insere mais uma medida tipicamente TRIPS Plus.

Pelo cenário acima apresentado verifica-se que pairam sérias ameaças ao sistema patentário, como é definido pela Constituição brasileira: instrumento para o desenvolvimento econômico e social do País. Se por um lado a correta aplicação do sistema constitui importante instrumento de política para o desenvolvimento, o desvirtuamento do mesmo pode resultar em um grande impedimento ao soberano processo de crescimento econômico e social do País.

Marcos Oliveira
Marcos Oliveira
Membro do Conselho Consultivo da ABIFINA.
Nelson Brasil de Oliveira
Nelson Brasil de Oliveira
Vice-presidente de Planejamento Estratégico da ABIFINA.
Reinaldo Guimarães
Reinaldo Guimarães
2º vice-presidente da ABIFINA.
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