A ABIFINA é uma entidade empresarial de caráter nacional, fundada em 1986 na cidade de São Paulo, tendo inicialmente por objetivo a representação de indústrias de caráter estratégico para o País, dedicadas à fabricação de insumos farmacêuticos, sob os estímulos criados pelo Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI).
Em 1991 a sede da ABIFINA foi transferida para o Rio de Janeiro, sendo nessa ocasião transformada numa entidade com atuação bem mais abrangente, cobrindo não somente os fabricantes de princípios ativos para medicamentos, mas também de princípios ativos e as respectivas especialidades finais de todo o complexo industrial da química fina, como sejam, cadeias farmacêuticas, defensivos agrícolas, aditivos, catalisadores etc.
Desde o início de suas atividades, a ABIFINA teve uma atuação reconhecidamente muito relevante no trato de políticas visando à industrialização do País – com destaque aos temas propriedade intelectual, desenvolvimento tecnológico e comércio exterior. Assim, em 1989 a ABIFINA participou de uma missão empresarial à Genebra, constituída pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), destinada a debater temas constantes da Rodada do Uruguai do acordo internacional conhecido pela sigla GATT, que resultou na criação da Organização Mundial do Comércio (OMC) em 1994. Nesse cenário a ABIFINA desempenhou marcante atuação nas discussões envolvendo a disciplina propriedade intelectual, tendo contribuído para a aprovação do acordo TRIPS na forma contida no Relatório Dunkell, que foi a base do Acordo GATT.
A internalização desse acordo TRIPS na legislação brasileira constituiu-se numa ação pioneira da ABIFINA realizada através do deputado Luiz Henrique, ao apresentar ao Congresso Nacional em 1990 uma proposta de alteração do Código de Propriedade Industrial que era vigente no Brasil desde 1971. Posteriormente o então presidente da República, Fernando Collor de Mello, enviou para ser apreciada pelo Congresso Nacional, em caráter de urgência urgentíssima, uma proposta pesadamente contrária aos interesses nacionais. A firme posição da ABIFINA contrária a esse projeto, contando com o apoio da Alanac e de alguns deputados da oposição, resultou na rejeição da urgência no exame dessa matéria, levando os debates sobre esse projeto até a transição do poder governamental, ocorrida em 1992. Sob o governo Itamar Franco e contando com seu firme apoio, em memorável decisão por consenso foi aprovado em 1993, na Câmara dos Deputados, um projeto de lei centrado nas sugestões da ABIFINA. No governo FHC implantado em sequência, pressionado pela bigpharma norte-americana, o Senado alterou o PL aprovado pela Câmara dos Deputados, abrigando requisitos TRIPS Plus, ou seja, contendo obrigações adicionais àquelas que havíamos assumido no âmbito desse acordo internacional, constituindo-se em decorrência desse fato um expressivo retrocesso no processo industrializante do Brasil.
Ainda não satisfeita, a bigpharma norte-americana a partir de 1994 levou o governo dos Estados Unidos a defender, no âmbito do acordo de livre comércio para as Américas (Alca), propostas com o objetivo de recuperar posições não alcançadas no âmbito do Acordo GATT, em especial em propriedade intelectual, investimentos e compras governamentais – as duas últimas disciplinas não haviam sido subscritas pelo Brasil. Nesse período a ABIFINA participou intensamente da formulação das posições brasileiras, sendo inclusive portavoz da CNI no tema propriedade intelectual nas reuniões internacionais destinadas à construção do referido acordo, a partir de Belo Horizonte, e passando por Costa Rica, Canadá, Argentina, Equador e Miami. Temos a convicção de que as firmes posições da ABIFINA em defesa dos mais elevados interesses nacionais no trato dessas três disciplinas, em especial em propriedade intelectual, contribuíram decisivamente para arrefecer o ânimo norte-americano na formalização do acordo Alca, o qual foi abandonado em 2005, em decorrência de não serem atingidos tais objetivos perseguidos pelos Estados Unidos.
Durante os anos 90, a economia brasileira atravessou um período tutelado pelos ditames do Consenso de Washington, quando se entendia que “a melhor política industrial é não se ter política industrial”. A desindustrialização do País daí resultante, em especial nos setores com alto valor agregado como a química fina, constitui-se em um grande atraso para o nosso desenvolvimento, que ainda não foi revertido. Foram 12 anos de atraso no processo de industrialização do País, posto que somente a partir de 2003, com a posse de Lula na presidência da República, começou o renascimento de políticas públicas dedicadas à reversão do processo desindustrializante do País. Nesse novo cenário foi inicialmente construída uma Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) voltada para os setores de softwares, semicondutores, bens de capital, fármacos e medicamentos, definidos como estratégicos para o desenvolvimento nacional. Para tais setores industriais foram elaborados diagnósticos específicos, tendo a ABIFINA oferecido uma marcante contribuição nesse sentido. Porém, afora o programa Profarma do BNDES, realizações decorrentes dessas políticas públicas surgiram somente durante o segundo mandato do presidente Lula.
No período de 2007 a 2010 o Ministério da Saúde, usando o Poder de Compra do Estado e contando com a articulação empresarial conduzida pela ABIFINA, incentivou os laboratórios oficiais a contratarem a fabricação local de fármacos, em vez da singela aquisição desses produtos via licitações internacionais – sistema em que o produtor brasileiro não podia competir devido à falta de isonomia nessas concorrências. Com base na experiência de sucesso realizada por Farmanguinhos, contando com a ação da ABIFINA articulando empresas nacionais e tendo por guia as parcerias público- -privadas definidas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Ministério da Saúde implantou através de decreto e portarias o sistema de Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) no Complexo Industrial da Saúde (CIS).
No início de 2011 a presidente Dilma Rousse¨ lançou o Plano Brasil Maior, visando aprofundar a PITCE nos setores estratégicos para o desenvolvimento do País. Nesse contexto o governo federal passou a buscar instrumentos legais mais fortes, definindo-se então um novo marco regulatório para o setor através da Lei nº 12.715/2012, ao criar margens de preferência nas compras públicas. Assim também ocorreu através do Projeto de Conversão nº 18/2012, que introduziu uma modi- ficação na Lei de Licitações para permitir a dispensa de licitações na contratação da fabricação nacional quando houver transferência de tecnologia para a fabricação local de produtos estratégicos para o SUS. Para a construção desse novo marco legal a ABIFINA deu uma efetiva contribuição nos duros embates públicos envolvendo a alteração na Lei de Licitações, iniciativa então contestada pelos que se opõem ao desenvolvimento soberano da indústria local através de parcerias entre o agente público e a empresa nacional.
Face à sua história acima sumariamente relatada, entendemos que a ABIFINA possui legitimidade para levar à Presidência da República um Projeto de Desenvolvimento Industrial da Química Fina no Brasil como resposta ao desafio lançado pela presidente em Belo Horizonte, no sentido de privilegiar a química fina no contexto das políticas públicas dedicadas à retomada do processo industrializante do Brasil. Essa declaração presidencial não se constituiu em uma formulação inconsequente, simplesmente como fruto de marketing publicitário – como a mídia costuma atribuir às suas manifestações. Em realidade a presidente da República possui uma excelente e clara visão de caráter nacionalista sobre os objetivos estratégicos a serem perseguidos pelo governo federal na área de política industrial.
Nesse cenário decidiu-se dedicar a presente edição da revista FACTO ABIFINA à apresentação dos objetivos e características do Projeto de Desenvolvimento Industrial da Química Fina no Brasil, na forma que foi encaminhada pela entidade à Presidência da República e, assim, melhor divulgar os propósitos dessa relevante iniciativa. Estamos certos de que a leitura dos depoimentos, da entrevista e dos artigos publicados na presente edição desta revista servirá para uma melhor compreensão da importância do Projeto de Desenvolvimento Industrial da Química Fina para o Brasil.