REVISTA FACTO
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Abr-Jun 2013 • ANO VII • ISSN 2623-1177
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FALTA UM PROJETO NACIONAL CONSISTENTE
//Editorial

FALTA UM PROJETO NACIONAL CONSISTENTE

A despeito da crise internacional, o Brasil hoje mantém taxa de pleno emprego de dar inveja aos demais países emergentes e até mesmo ao primeiro mundo, e vem crescendo seu produto interno bruto, ainda que a níveis pouco expressivos tanto em termos de valor como de qualidade – visto que não vem ocorrendo uma desejável agregação de valor ao produto fabricado localmente.

Antes da crise financeira de 2008, analistas econômicos adeptos do Consenso de Washington, endeusados pela mídia, diziam que para se desenvolver o Brasil não poderia perseguir políticas focadas na industrialização pois esse espaço estaria irreversivelmente ocupado pelos países com mão de obra barata e custos reduzidos devido ao descompromisso com regulamentação trabalhista, sanitária e ambiental, como é verificado em alguns países asiáticos. Em vez da crítica e o combate a essa nociva prática asiática, marcantemente desumana e antiética, com arrogância esses arautos do mercado totalmente livre indicavam que o caminho para o desenvolvimento do brasileiro deveria ser o do agronegócio e o da prestação de serviços – como no período colonial sob o mandato de D. Maria I, a Louca, que proibiu qualquer atividade manufatureira no Brasil.

A história econômica, no entanto, veio a mostrar o enorme equívoco incorrido nessa forma de pensamento econômico. Se a queda do muro de Berlim em 1989 mostrou que, para o desenvolvimento econômico e social, era requerido o pleno exercício da democracia, a crise financeira internacional ocorrida 20 anos após demonstrou ser irreal pensar que o mercado livre definido pelo Consenso de Washington – totalmente liberto de amarras regulatórias e estímulos do Estado – gerariam pleno emprego e estabilidade econômica das nações.

Se por um lado um Estado não democrático – autoritário e intervencionista – retrai investimentos privados pela insegurança jurídica daí decorrente, por outro lado a total liberdade do mercado – “autorregulável ” como enunciado pelos neoliberais – resulta no descontrole e no caos financeirobem conhecido pelo mundo desde 2008. Certamente a virtude se encontra no meio termo entre esses dois extremos, constituindo-se numa incessante busca desse equilíbrio a mais desejável forma de atuação dos governantes.

O próprio presidente Barack Obama não seguiu os mandamentos do Consenso de Washington ao intervir recentemente na economia do mercado dito livre, seguindo drásticos procedimentos que não eram usados desde os anos 70 pelos Estados Unidos. Assim, os bancos foram literalmente forçados a conceder empréstimos e a paralisar ações judiciais para a cobrança de hipotecas, bem como as fábricas de automóveis foram “induzidas” a produzir veículos que usassem tecnologias mais avançadas e econômicas. Bilhões de dólares do erário público foram canalizados para apoiar o desenvolvimento de novas tecnologias pela indústria, em especial a geração de fontes alternativas de energia, sendo, em contrapartida, severamente tributadas as indústrias poluentes como a carbonífera.

Assessores econômicos de Obama hoje tratam abertamente de política industrial como um relevante instrumento para aquele país superar a atual crise econômica. Inexoravelmente pode-se afirmar que a intervenção estatal norte-americana na economia de mercado atingiu de vez o cerne do capitalismo de mercado mundial. Para ilustrar esse fato, cabe lembrar que Jared Bernstein, Membro Senior do Centro de Orçamento e Políticas Prioritárias do presidente norte-americano, diz claramente que o país está utilizando uma política industrial de caráter emergencial para “corrigir falhas do mercado”.

Nesse novo cenário de pensamento econômico, parece bem claro que o caminho natural a ser perseguido pelos países em desenvolvimento, muito especialmente pelo Brasil – devido à abundância de recursos naturais, favorável relação população/área territorial e base industrial instalada – reside na formação de sólidas parcerias entre o ente público e o privado, na forma de um planejamento estratégico governamental.

No Brasil, baseadas em legislação do ano 2004, parcerias público-privadas (PPP) voltadas para a realização de investimentos em infraestrutura começaram a ser implantadas. Por intermédio de PPPs, a União, os Estados ou os Municípios passaram a selecionar e contratar empresas privadas que ficaram responsáveis pela prestação de serviços de interesse público por prazo determinado.

E na forma de um marco regulatório definido entre os anos de 2008 e 2012, foram criadas diversas parcerias para o desenvolvimento produtivo (PDP) do Complexo Industrial da Saúde, em associações que reúnem empresas privadas fabricantes de produtos farmoquímicos (insumos farmacêuticos ativos), laboratórios privados e oficiais fabricantes de medicamentos. Tais arranjos produtivos são constituídos através de contratos plurianuais, firmados entre laboratórios oficiais e empresas privadas para fabricar localmente o princípio ativo e o medicamento – definido como estratégico para o SUS. Nesses contratos, são estabelecidas obrigações sobre preços a serem praticados e sobre a inovação tecnológica e a transferência de tecnologia do ente privado para o público no período de vigência contratual.

A utilização do poder de compra do Estado, representado pelas aquisições de produtos fabricados pelas 63 PDPs formalizadas que se encontram em processo de implantação pelo Ministério da Saúde, programadas pelo SUS para o período 2013-2017, deverá atingir R$ 5,9 bilhões/ ano nesse período em compras públicas, correspondendo a uma economia governamental estimada em R$ 2,8 bilhões/ ano e de US$ 2,3 bilhões/ano como economia de divisas.

O modelo das PDPs implantadas pelo Ministério da Saúde é conceitualmente correto em seu desenho, com destaque para o fato de que os produtos objeto de tais PDPs são aqueles definidos pelo SUS como estratégicos para o acesso da população aos medicamentos essenciais à saúde humana. Assim o Brasil poderá realizar um extraordinário programa de desenvolvimento econômico e social em área de relevante valor estratégico para o País, criando uma indústria farmoquímica de ponta em um mercado interno internacionalmente expressivo, e onde atuam grandes empresas nacionais e multinacionais, mas que para investir pesadamente no País ainda carecem da articulação das políticas públicas pelas diversas agências governamentais.

A Presidente da República possui uma excelente visão nacionalista sobre os objetivos governamentais a serem perseguidos com essa área estratégica, tendo mesmo declarado em recente episódio ocorrido em Belo Horizonte que nos avanços verificados nas políticas industriais em curso deverá ser privilegiada a química fina, pela sua relevante importância econômica e social para o País. Verifica-se nitidamente que há uma estratégia nacional embutida nas políticas públicas concebidas pela Presidência da República. Mas essa estratégia ainda não se traduziu na forma de um Projeto Nacional definido claramente – contendo metas e cronogramas, bem como sendo operacionalizado de forma articulada entre as diferentes agências governamentais responsáveis pela sua condução, orientação e fiscalização. A bem da verdade deve ser destacado que, além dessa carência na delegação de competência e na definição de responsabilidades, observa-se nitidamente que ocorre certo temor de parte do agente público por ocasião da tomada de decisões, em virtude do exagerado, ou até mesmo infundado, rigor muitas vezes constatado em ações dos Tribunais de Contas e do Ministério Público. Em decorrência dessa situação real ocorrem postergações de decisões administrativas ou até mesmo inações de parte do ente público, que resultam em sinais ambíguos que certamente levam à retração dos investimentos privados.

“Há uma estratégia embutida nas políticas públicas concebidas pela Presidência da República que ainda não se traduziu em um Projeto Nacional contendo metas e cronogramas, articulada entre as agências governamentais responsáveis pela condução, orientação e fiscalização”

Tais fatos requerem uma adequada correção de rumos que poderá ser alcançada se a máquina administrativa passar a atuar de forma mais coordenada, atenta às metas centrais das políticas públicas abrigadas no Projeto Nacional, com delegações de atribuições e cobranças de responsabilidades pelo não cumprimento de metas e cronogramas.

Acrescente-se a esse cenário que cada servidor público como cidadão brasileiro deve assumir forte compromisso com os superiores objetivos nacionais, colocando-os acima de quaisquer outros interesses – aceitando o fato de que a solução de nossos problemas depende fundamentalmente da atitude que for adotada por cada brasileiro em sua esfera de atuação pessoal.

Por último, mas não menos importante, as posturas dos parlamentares no Congresso Nacional têm que mudar radicalmente por pressão da sociedade, pois hoje elas não condizem com os objetivos de um Projeto Nacional, sendo integralmente dedicadas às pulverizadas ações conhecidas como “emendas parlamentares”. No Congresso Nacional predomina uma visão política focada em interesses cartoriais ou pessoais, até mesmo escusos, certamente tendo natureza totalmente descompromissada com um sério e efetivo Projeto Desenvolvimentista de uma Nação Soberana.

Nelson Brasil de Oliveira
Nelson Brasil de Oliveira
Vice-presidente de Planejamento Estratégico da ABIFINA.
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