É quase consensual a noção de que o maior desafio para uma política de desenvolvimento industrial no Brasil de nossos dias é a profunda distorção nos dois preços básicos da economia – a taxa de juros e o câmbio – em relação aos nossos principais concorrentes no exterior. Com o real extremamente sobrevalorizado em relação ao dólar é muito difícil, senão impossível, estancar o fluxo de importações de produtos industrializados. O reflexo disso é a rápida deterioração da balança comercial do setor de transformação observada nos últimos anos, sobretudo nas cadeias produtivas de maior densidade tecnológica e maior valor agregado. O déficit do setor de transformação no primeiro semestre de 2011 atingiu nada menos que 21 bilhões de dólares, uma expansão de cerca de 50% sobre o mesmo período do ano anterior. Para alcançar ganhos de produtividade capazes de superar a barreira da defasagem cambial seria necessário investir pesadamente, iniciativa que na atual conjuntura esbarra na taxa de juros efetiva mais alta do mundo.
A despeito disso, o governo vem, desde 2004, através do lançamento de sucessivas políticas de desenvolvimento industrial, procurando oferecer condições de melhor competitividade à indústria local. Da análise do conteúdo destas políticas e de seu desdobramento prático evidencia-se que o maior desafio a enfrentar é a falta de eficácia na sua implantação, decorrente basicamente da falta de sinergia entre as diversas instâncias governamentais envolvidas. O desenvolvimento de uma empresa, de uma região ou de uma nação é um processo que requer o engajamento de uma ampla variedade de agentes econômicos e que, para ter sucesso no caso de um país, demanda uma política de desenvolvimento incondicionalmente seguida por todas as instâncias de governo, trabalhando sinergicamente com o mesmo objetivo.
São bem conhecidos os mecanismos clássicos de apoio ao desenvolvimento: subvenção econômica aos investimentos de maior risco, crédito subsidiado, isenções fiscais, proteções tarifárias, exigências de conteúdo local, preferências em compras governamentais e estabelecimento de um marco regulatório adequado. Desde 2004, com o lançamento da PITCE, o governo vem lançando mão destes mecanismos, primeiro com a Lei da Inovação, que criou a subvenção econômica; depois com a Lei do Bem, que instituiu incentivos fiscais no Imposto de Renda para firmas inovadoras; e posteriormente com a Lei 12.349/2010, já no âmbito da Política de Desenvolvimento Produtivo, que criou preferência para produtos locais nas compras governamentais.
Essas iniciativas não chegaram a produzir os efeitos que delas se esperavam, pela timidez com que foram instituídas e, muito especialmente, pela falta de articulação em sua execução. A subvenção econômica foi aplicada com exagerada limitação e concentrou-se mais em invenções do que em inovações propriamente ditas, privilegiando a pesquisa acadêmica em detrimento do desenvolvimento tecnológico realizado pela indústria. Os incentivos fiscais foram severamente restringidos pela regulamentação da Receita Federal, atingindo apenas as grandes empresas que declaram pelo lucro real e deixando de fora as que declaram pelo lucro presumido – mais de 90% do total das empresas, formando um contingente expressivo no processo de inovação. A lei 12.439/2010, que institui a preferência local em compras governamentais, embora anunciada no âmbito do Plano Brasil Maior lançado pela presidenta Dilma Rousseff, ainda não teve sua regulamentação concluída. A diretriz nesse sentido que já havia sido formulada pelo Ministério da Saúde em 2008, através de Portarias que determinavam preferência para a indústria local nas compras governamentais de fármacos e medicamentos, foi solenemente ignorada pelos laboratórios estatais, com exceção de Farmanguinhos, que é diretamente vinculado ao referido ministério. Os demais continuaram a fazer suas aquisições exclusivamente com base no menor preço oferecido em licitações internacionais procedidas sem isonomia tributária nem nos critérios de qualidade.
No campo regulatório, o panorama é o mesmo. O Brasil parece ter esquecido a lição histórica de que a regulação sucede ao desenvolvimento, e não o contrário. Todos os países hoje desenvolvidos alcançaram este estágio num ambiente regulatório muito mais flexível do que aquele estamos tentando estabelecer, por exemplo, na regulação de produtos biológicos. O acesso à biodiversidade por parte das empresas brasileiras vem sendo dificultado pela regulamentação míope e a burocracia da CNTBio. A atuação do INPI segue inteiramente desvinculada dos propósitos da política de desenvolvimento, chegando ao cúmulo de esse órgão desconhecer uma resolução emanada do Grupo Interministerial de Propriedade Industrial – GIPI, criado exatamente para orientar sua atuação.
Há aspectos muito positivos nas recentes medidas do programa Brasil Maior que merecem uma análise mais detalhada, mas colocar todas as instâncias do governo vibrando num mesmo diapasão permanece sendo, indiscutivelmente, o maior desafio a