A implantação do Complexo Industrial da Saúde (CIS) é um objetivo de fundamental importância no contexto do PAC da Saúde. O desenvolvimento da cadeia produtiva de medicamentos e equipamentos médico-hospitalares, na forma definida pelo Ministério da Saúde, deve levar o País a desenvolver a competência tecnológica e a capacidade produtiva nessas áreas socialmente estratégicas, a fim de reduzir a vulnerabilidade do Sistema Nacional de Saúde. Entre as metas no curto prazo do CIS destacam-se a redução do déficit comercial do setor para quatro bilhões de dólares e o desenvolvimento de tecnologia para a produção verticalizada no Brasil de vinte produtos prioritários para o SUS até 2013.
Para discutir o andamento do programa e transmitir ao ministro da Saúde, José Temporão, a avaliação da indústria sobre as medidas já implementadas, a ABIFINA realizou em parceria com a Firjan, no dia 1º de fevereiro, o encontro empresarial intitulado “Complexo Industrial da Saúde – Avaliação do Ano 2009 e Perspectivas para 2010”, que contou com a participação das entidades empresariais diretamente envolvidas: Progenéricos, Alanac e Abimo.
A mesa diretora do encontro foi presidida pelo próprio ministro Temporão e contou com as presenças do secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, e do vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, Carlos Gadelha. O 1º vice-presidente da ABIFINA, Nelson Brasil, fez uma apresentação introdutória relembrando eventos históricos dos últimos três anos protagonizados pelo Ministério da Saúde, como a licitação para aquisição de Zidovudina e Lamivudina junto à indústria nacional pelo laboratório público Farmanguinhos, inovando um procedimento que até então privilegiava importações baratas e de qualidade duvidosa, e a decisão de licenciar compulsoriamente a patente do Efavirenz.
Empresas enfrentam barreiras
Para o 1º vice-presidente da ABIFINA ainda falta o Ministério da Saúde sensibilizar os demais laboratórios públicos a usar o novo procedimento licitatório, que já teve suas diretrizes definidas pela Portarias Interministeriais 128 e 3.031, ambas de 2008. “Essa seria a forma mais apropriada para se corrigir o desequilíbrio gerado pelos pregões internacionais que têm, nitidamente, favorecido as importações em detrimento da produção local”. Nelson Brasil destacou, ainda, a importância de temas relacionados à inovação tecnológica focada na empresa; o uso não abusivo do sistema de patentes industriais; a fabricação local de intermediários químicos sob a liderança da Petrobras; o uso do poder de compra do Estado em favor da industrialização local, em vez de incentivar importações como vem ocorrendo; e o mais amplo apoio às parcerias público-privadas construídas no âmbito do CIS. “Já existem medidas definidas pelo Gecis nessas matérias. Agora falta sua implantação que esperamos venha a acontecer ainda em 2010”, arrematou Nelson Brasil
O presidente da Alanac, Alexandre Geyer, expôs as dificuldades que as empresas filiadas têm enfrentado para se adaptarem à avalanche de novas normas expedidas pela Anvisa, sob a forma de RDCs. Segundo ele, “em 2009 tivemos um profundo impacto em relação aos novos regulamentos, dificultando o cumprimento dessas normas e tornando muito difícil o desenvolvimento da indústria farmacêutica”. Outro problema apresentado por Geyer é a falta de agilidade da Anvisa no processo de aprovação de registros de medicamentos: “é extremamente necessário que a Anvisa realize em tempo hábil a publicação de registro e pós-registro”. Além disso, colocou em pauta a questão da carga tributária no Brasil e sua aplicação a medicamentos, dando como sugestão para 2010 a equalização da carga tributária nacional pelo menor valor possível.
Na apresentação de Odnir Finotti, presidente da Progenéricos, foi traduzido em números o avanço na produção de medicamentos genéricos no País. Segundo ele, atualmente já é possível tratar com medicamentos genéricos a maioria das doenças. “O remédio genérico caiu no gosto do brasileiro, prova disso é que em cada cem medicamentos comprados nas farmácias, vinte são genéricos”, afirma Finotti. Uma das expectativas desse segmento para 2010, declara o presidente da Progenéricos, é a aplicação rigorosa da legislação no que tange às patentes que estão expirando, em face do exagero que tem sido observado por parte dos seus detentores no que diz respeito ao uso da via judicial para estender o prazo de proteção.
O diretor da Abimo Márcio Bosio, por sua vez, expôs como plano central da entidade para 2010 lançar uma rede de inovação tecnológica em parceria com a PROTEC, de forma a estimular uma cultura de inovação contínua na indústria de equipamentos médico-hospitalares.
No debate que sucedeu as palestras, o presidente da Cristalia, Ogari Pacheco, reiterou o pleito de Alexandre Geyer de que a Anvisa reduza a demora na publicação de registros, lembrando que se a Agência praticasse efetivamente um fast track nos pleitos estratégicos do setor industrial isto “resultaria em mais matéria-prima e mais medicamentos para o país, gerando mais empregos e reduzindo custos para todo o CIS”. Em seguida falou José Loureiro, presidente do Laboratório ABL, também assinalando que, a despeito da vontade do governo de promover o crescimento tanto na área de medicamentos quanto na de farmoquímicos, “esbarramos nos problemas de impostos, financiamentos e registros”.
O debatedor seguinte foi Jean Peter, diretor superintendente da Globe Química, que enfatizou a importância de todos os lados trabalharem em conjunto e em harmonia, simplesmente buscando atingir os superiores interesses nacionais, para que o País se desenvolva melhor na área de medicamentos. Nicolau Lages, dirigente da Nortec, ponderou que existem dois empecilhos ao desenvolvimento da indústria farmoquímica nacional: “o primeiro é a falta de isonomia regulatória e o segundo é a alta carga tributária, ambos dificultando os investimentos das indústrias”. A seguir o presidente da Libbs, Alcebíades Athayde, sintetizou sua percepção afirmando que, com a pesada carga tributária que incide sobre os medicamentos fica muito difícil competir em nosso próprio país com as indústrias de países emergentes comercialmente agressivos que exportam produtos para cá, como é o caso da China e da Índia.
A diretora da EMS Telma Salles também comentou as enormes dificuldades decorrentes da alta carga tributária imposta às indústrias farmacêuticas e suas conseqüências para a população brasileira: “a taxa elevada de tributos no Brasil para o setor farmacêutico somente dificulta o acesso do brasileiro aos medicamentos”. Como os demais participantes, ela defendeu a importância de o governo priorizar a produção local. O presidente da Laborvida, Lélio Maçaira, preocupado com as dificuldades de gestão que atrasam a implementação do CIS, propôs que, para se alcançar maior eficiência na sua implementação, a Secretaria de Insumos Estratégicos chame a si a tarefa de articular os diversos atores das parcerias, ressaltando que “é preciso coordenar todas essas atividades, bem como implantar efetivamente o que Anvisa prometeu em relação ao fast track”.
Finalizando o debate, o presidente da Microbiológica, Jaime Rabi, comemorou a perspectiva de que a fabricação nacional de farmoquímicos gere um pico de atividades intensivas em conhecimento no País, e conclamou o setor a “intensificar a mobilização do conhecimento disponível, pois ainda não há estímulo suficiente para que todos se engajem na missão de criar aqui uma indústria química de alto nível”.
Ministro reitera compromisso
Após os comentários dos empresários e executivos da indústria de fármacos e medicamentos, foi a vez dos representantes do setor público. O secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, endossou as críticas do setor à elevada carga tributária e afirmou que este é um dos temas mais complicados no que tange ao equacionamento das dificuldades da política industrial.
Em defesa da Anvisa, Guimarães ponderou que “não se pode deixar de lado o bem-estar do cidadão em relação ao consumo dos produtos industriais, e que é preciso ver os dois lados da moeda”. Embora concordando que a Agência deve participar ativamente do esforço de implementação da política industrial, como suas congêneres pelo mundo afora, lembrou que ela precisa equilibrar junto ao Ministério da Saúde interesses eventualmente conflitantes. O diretor adjunto da assessoria técnica da Anvisa, Pedro Ivo, procurou justificar o modo de atuação da Agência afirmando que seu compromisso é “procurar conciliar, promover e proteger a saúde da população, não deixando de cumprir as políticas governamentais e industriais”, e argumentando que, em assuntos já regulamentados e incontroversos, como a rastreabilidade da cadeira produtiva de medicamentos, que atende aos interesses tanto da população quanto do setor produtivo, não haverá alterações e a agilidade da Agência tende a ser maior.
O vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, Carlos Gadelha, observou que a saúde pública no Brasil funciona, hoje, de forma extremamente democrática, pois os órgãos dela incumbidos ouvem e procuram atender a todos os lados; e acrescentou que “é preciso construir uma efetiva parceria público-privada com o objetivo de garantir o acesso universal”. Finalizando o encontro, o ministro Temporão expressou sua satisfação com os debates e admitiu que ainda há muito o que melhorar. “Posso adiantar – afirmou – que estou revendo a regulamentação dada pela Portaria n° 978, que lista os produtos estratégicos no âmbito do SUS, com a finalidade de aperfeiçoá-la e melhor colaborar para o desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde. E irei conversar com a Anvisa para que a Agência passe a privilegiar nos seus procedimentos o trato desses produtos estratégicos para a saúde pública, do ponto de vista de registro e pós-registro”. O ministro também destacou a importância estratégia das PPPs na viabilização da fabricação local de medicamentos excepcionais de alto custo, bem como a necessidade de se trabalhar ainda melhor o poder de compra do Estado em benefício da indústria nacional e da população. O ministro também destacou a importância estratégia das PPPs na viabilização da fabricação local de medicamentos excepcionais de alto custo, bem como a necessidade de se trabalhar ainda mais o poder de compra do Estado em benefício da indústria nacional e da população.