REVISTA FACTO
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Jul-Ago 2007 • ANO II • ISSN 2623-1177
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//Entrevista Pedro Barbosa

O Instituto Continuation in Part

O presente artigo tem como escopo o instituto do continuation in part do direito de patentes americano, suas implicações jurídicas, bem como sua perspectiva jurisprudencial no Brasil.

Conceito e problema

Podemos conceituar esta modalidade como uma espécie de pedido que fosse depositado durante o processamento de outro, pretérito, repetindo-o parcialmente, ou em sua totalidade, e adicionando matéria ainda não reivindicada1.

Desta forma, verifica-se uma enorme semelhança com a faculdade disposta no artigo 32 da LPI, segundo a qual o quadro reivindicatório pode ser adicionado desde que não exceda a matéria revelada no relatório descritivo, observado o prazo legal pertinente2.

Dentro desta similitude, temos que a matéria acrescida não constitui efetivamente um novo depósito, não implica o abandono do depósito originário, ou gera patente distinta.

Contudo, o próprio USPTO, por razões burocráticas, estipula que cada adição continuation in part será dotada de um novo número de depósito, incidindo num “suposto” abandono daquele originário3.

Este procedimento, por sua vez, tem gerado grandes confusões face ao ordenamento jurídico pátrio, e, combinado com o instituto pipeline, vem alimentando o Judiciário federal com centenas de ações de extensão do prazo de patentes4.

Os autores destas demandas, como regra, sempre visam que a contagem a quo do termo patentário seja oriunda do último depósito, e nunca do primeiro.

Do suposto abandono

No entanto, não nos parece haver real abandono do primeiro depósito, mesmo na égide do instituto norte-americano.

Stephen Ladas, grande tratadista norte-americano elucida esta aparente divergência:

Thus, a continuation-in-part application in the United States cannot claim a right of priority with regard to the application originally filed, because a continuation application does not involve abandonment of the original application5. (grifos nossos)

Neste sentido, vale destacar julgamento unânime da 2ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da Segunda Região:

no caso da continuação em parte, porém, a patente originária se tornou eficaz, atuando plenamente no mundo jurídico, tanto é assim que foi desenvolvida a ponto de gerar uma outra, que nada mais é que um desdobramento daquela (…) No caso ora em exame, o primeiro pedido efetuado junto ao órgão patentário norte-americano – US 77366 – não pode ser considerado como abandonado…6. (grifos nossos)

Contudo, ainda que – hipóteticamente – houvesse real abandono do primeiro depósito, o artigo 4º da Convenção da União de Paris (versão Estocolmo) resolveria a questão:

Deve ser considerado como primeiro pedido, cuja data de apresentação marcará o início do prazo de prioridade, pedido ulterior que tenha o mesmo objeto de um primeiro pedido anterior, nos termos do parágrafo 2), apresentado no mesmo país da União, desde que na data do pedido posterior, o pedido anterior tenha sido retirado, abandonado ou recusado, sem ter sido submetido a inspeção pública e sem deixar subsistir direitos e que não tenham ainda servido de base para reivindicação do direito de prioridade. O pedido anterior então não poderá mais servir de base para reivindicação do direito de prioridade7. (grifos nossos)

Portanto pode ler-se desse último dispositivo que o depósito continuation in part, ulterior, não pode ser considerado como “primeiro pedido”, pois este deixou importantes direitos, como o direito de prioridade.

Neste sentido, vale citar texto institucional da Universidade de Yale:

Devido às mudanças recentes na lei da patente, entretanto, há agora uma razão muito importante para não rotineiramente arquivar uma aplicação como uma aplicação do CIP. Porque o termo de uma patente é calculado como estendendo de sua data de depósito até vinte anos após, assim, o arquivamento uma aplicação de patente como uma continuação ou como resultados de um CIP diminui o tempo de vida da patente. Conseqüentemente, só faz sentido arquivar uma aplicação como uma continuação-em-parte se a data da prioridade de uma aplicação mais antiga possa ser obtida. (grifos nossos)

Seguindo o mandamento da Convenção União de Paris, o United States Code em seu título 35, §119, “c”8, também condiciona que um depósito “posterior” só será contado como o “inicial”, se o pedido pretérito tiver sido retirado, abandonado, sem que tenha tido acesso ao público; sem que haja deixado qualquer outro resquício de direitos; e que não tenha sido usado para garantir o direito de prioridade a outro pedido.

Nesta esteira, o juízo da 37ª Vara Federal do Rio de Janeiro se manifestou:

Quando do depósito do pedido de patente no Brasil em 30/4/1997/, a própria titular indicou como primeiro depósito no exterior a patente US 377.023, datada de 07/7/1989. Tal registro foi posteriormente abandonado em razão de depósito posterior continuation in part US 411.347, de 22/2/1989 (…). Por tal razão, corretamente agiu o INPI ao, deferindo a patente, limitar o seu prazo de validade até 7/7/2009, vinte anos contados a partir da data do primeiro depósito9. (grifos nossos)

Seguindo este entendimento, igual foi a decisão do juízo da 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro:

Do simples exame da documentação acostada, chega-se à conclusão de que o início da contagem do prazo de proteção para as patentes US 5,273,995 e US 5,686,104, é justamente aqueles nos quais foram originariamente depositadas, isto é, em 21/9/1989 e 19/1/1993, respectivamente10. (grifos nossos)

Conclusão

O continuation in part é uma peculiaridade da legislação alienígena que, pertinente às patentes pipeline, não pode ter como cômputo de prazo o último depósito; seja porque não houve abandono do primeiro, ou seja porque mesmo abandonado o primeiro depósito gerou efeitos importantes; sob pena de violarmos o artigo 40 da Lei de Propriedade Industrial.
Destarte, sua aplicação em face do ordenamento jurídico pátrio deve observar os preceitos de ordem pública vigentes, tais como o prazo de vinte anos, a contar da data do depósito, das patentes.

1) Tradução livre de: “A continuation-in-part is an application filed during the lifetime of an earlier nonprovisional application, repeating some substantial portion or all of the earlier nonprovisional application and adding matter not disclosed in the said earlier nonprovisional application.” Disponível em: http://www.uspto.gov/web/offices/pac/mpep/documents/0200_201_08.htm

2) Art. 32. Para melhor esclarecer ou definir o pedido de patente, o depositante poderá efetuar alterações até o requerimento do exame, desde que estas se limitem à matéria inicialmente revelada no pedido.

3) Como exemplo, temos a patente norte-americana US 5547853, geradora da PI 1100443-6, que no site do USPTO consta: “This application is a continuation-in-part of application Ser. No. 07/770,967, filed Oct. 7, 1991, which is a continuation-in-part of prior application Ser. No. 07/667,971, filed Mar. 12, 1991, both now abandoned.” (grifos nossos)

4) A título exemplificativo, destacamos as seguintes demandas todas em curso na seção judiciária federal do Rio de Janeiro: 99.001.9328-8, 2000.51.01.0166905-0, 98.002.5767-5, 99.002.0907-9, 2005.51.01.5007128-0 e 2005.51.01.5075160-0.

5) LADAS, Stephen P. Patents, Trademarks and Related Rights, Massachussetts: Havard University Press, 1973, p. 473.

6) Apelação Cível nº 2005.51.01.500712-8, Relatoria Des. André Fontes, Voto-vista da Des. Liliane Roriz, publicado no D.J. do dia 2/5/2007.

7) Artigo 4º, C, 4, da Convenção União de Paris.

8) “In like manner and subject to the same conditions and requirements, the right provided in this section may be based upon a subsequent regularly filed application in the same foreign country instead of the first filed foreign application, provided that any foreign application filed prior to such subsequent application has been withdrawn, abandoned, or otherwise disposed of, without having been laid open to public inspection and without leaving any rights outstanding, and has not served, nor thereafter shall serve, as a basis for claiming a right of priority;” Disponível em: http://www.yale.edu/ocr/invent_guidelines/continuation.html

9) Processo de nº 2005.51.01.512374-8, 37ª Vara Federal da comarca da capital – Estado do Rio de Janeiro, juíza Márcia Maria Nunes de Barrosa, publicada em 1/9/2006.

10) Processo de nº 98.002.5767-5, 6ª Vara Federal da comarca da capital – Estado do Rio de Janeiro, juíz edward Carlyle Silva, de 26/11/1998. 

Pedro Barbosa
Pedro Barbosa
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