Durante sua palestra o senhor. falou sobre uma “reconceitualização” em curso no INPI. Quais são os rumos desse trabalho e os novos conceitos em jogo?
O INPI sempre reviu suas diretrizes, seus procedimentos normativos. O que estamos fazendo é um trabalho mais intensivo, mais sistemático de revisão, de maneira a garantir uma participação maior de todos os públicos interessados nessa questão. A direção é da política brasileira de desenvolvimento tecnológico, industrial e de comércio interior. Vamos tentar fazer com que se torne mais atrativo para os brasileiros investir em inovação, para as empresas detentoras de tecnologia de outros países fazer acordos de cooperação tecnológica com o Brasil, para as universidades brasileiras depositar patentes, e para os brasileiros levar suas patentes a outros mercados. A reconceitualização é no sentido de promover maior inclusão das empresas e dos cidadãos brasileiros no sistema de inovação internacional.
De que forma está sendo organizada a participação da sociedade nesse processo?
Temos feito reuniões com segmentos selecionados pelo próprio corpo técnico do INPI, por convite. Isto deve gerar um rascunho de propostas de diferentes campos. Num segundo momento, vamos colocar esse material na Internet e organizar seminários mais amplos visando a construção de alguns consensos, ainda que parciais e provisórios. É claro que, na falta de consenso, algumas escolhas terão que ser feitas e elas também podem ser revistas em ocasiões posteriores. Temos hoje uma motivação formal para a revisão, que é a política nacional de desenvolvimento da biotecnologia, aprovada recentemente. Entre as observações dessa política, uma diz respeito a rediscutir os critérios de patenteabilidade, diretrizes e limitações no campo da biotecnologia, entre eles a questão da patenteabilidade de matéria viva, de genes.
A palestrante Xuan Li destacou que a flexibilidade do sistema de patentes é interessante para os países emergentes. Esta flexibilidade conflitaria com aspectos de segurança jurídica e melhoria da qualidade das patentes defendidos pelo senhor?
A flexibilidade realmente implica uma certa imprevisibilidade. Se for entendida como algo que me permite adaptar minha lei a cada momento às minhas necessidades, aí não há conflito. Mas se for entendida como montar uma lei que tolera todo tipo de exceção a qualquer momento, então eu reduzo a previsibilidade. Um exemplo claro disso é o caso da licença compulsória, um mecanismo legítimo para os países utilizarem em caso de necessidade, de forma cautelosa e justificada. Se o uso desse mecanismo for aleatório, imprevisível ou para atender qualquer interesse localizado, compromete-se a qualidade do sistema como um todo. No sistema de propriedade intelectual, a palavra-chave é o balanceamento, a calibragem do uso dos dispositivos. Isto requer uma institucionalidade finamente construída.
O senhor foi o único palestrante a defender a harmonização do sistema internacional de patentes nos moldes colocados atualmente. Comente este fato, por favor.
Não cheguei a ser o único, porque a prof. Margareth também afirmou que se fosse possível uma harmonização no plano internacional que garanta maior qualidade das patentes, estaríamos de alguma maneira favorecendo o desenvolvimento. Acredito, de fato, que não seja uma boa estratégia para o Brasil deixar de participar dessas discussões, o que não significa que devamos nos engajar na proposta da OMPI. Os países desenvolvidos têm dois argumentos para rechaçar a extensa pauta de assuntos propostos pelos países em desenvolvimento: um é que a pauta fica muito grande e para discutir tudo tem que pôr em ordem. É um argumento aceitável. O outro – mais duro, mas acho que verdadeiro – é que a pauta mínima reúne os aspectoschaves do sistema de patenteabilidade. Se entendermos que o SPLT deve servir para aumentar a segurança jurídica, para diminuir custos de transação, para tornar mais simples a negociação envolvendo cooperação tecnológica e o comércio de produtos de conhecimento, é verdade. Os critérios de patenteabilidade constituem um ponto crucial da agenda. As patentes de má qualidade representam barreiras ao comércio, excluindo atores de mercado de maneira indevida. Entendo que o SPLT não deve ser olhado simplesmente como TRIPS Plus, porque ao impor certos padrões de qualidade ele poderá limitar por cima aquilo que pode ser protegido pelo sistema de propriedade intelectual. O TRIPs estabeleceu um piso; o SPLT, devidamente negociado, pode representar sob alguns aspectos um teto. E com isso, estabelecer um domínio do que é razoável. Uma patente mal definida, mal limitada, gera uma faixa muito larga de proteção.
Faça uma breve avaliação deste encontro.
É uma felicidade ver um auditório cheio de pessoas interessadas, que vêm estudando e tendo uma concepção mais ampla do problema da propriedade intelectual. Parabéns à ABIFINA!