A crise sanitária enfrentada pelo Brasil ressalta ainda mais a necessidade da produção local de Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs). Para aprofundar o debate, a ABIFINA promoveu no dia 17 de março o webinar “Perspectivas para o fortalecimento da fabricação de IFAs e a vulnerabilidade sanitária do País”. Para oferecer visões complementares sobre o tema, o evento reuniu representantes dos setores farmoquímico e farmacêutico, além de especialistas.
A opinião unânime dos palestrantes foi que o País precisa traçar uma estratégia para a indústria nacional de IFAs, com um pacote de incentivos de longo prazo. Entre as medidas mais recomendadas, está o uso do poder de compra do Estado por meio de encomendas tecnológicas e das licitações públicas para estimular não só a produção, como o desenvolvimento de inovações.
O presidente executivo da ABIFINA, Antonio Bezerra, abriu o seminário, lamentando pelas vítimas da Covid-19 e o colapso sanitário do Brasil. Ele lembrou que a vulnerabilidade do País e o fortalecimento da cadeia produtiva já vinham sendo discutidos, mas o tema ganhou mais força com a pandemia. Porém, pouco se avançou efetivamente. A importância do webinar realizado pela entidade é manter a discussão para que medidas sejam tomadas pelo governo.
COORDENAÇÃO
Antonio Bezerra
Presidente-executivo da ABIFINA.
Os argumentos favoráveis ao impulsionamento da indústria local de IFAs são consistentes. O economista Nelson Marconi, coordenador executivo do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explicou que esse setor é chave para a economia devido ao seu potencial de gerar tecnologias, ativar o encadeamento produtivo e ajudar o País a equilibrar as contas externas. Do ponto de vista da saúde, é essencial para garantir o atendimento à população com uso de recursos domésticos.
VISÃO ECONÔMICA
Nelson Marconi
Coordenador executivo do Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo da Fundação Getúlio Vargas, fará uma análise da conjuntura atual e dos instrumentos de política industrial voltados para a recuperação de setores de média e alta tecnologia, que deveriam ser priorizados pelo governo federal no planejamento das medidas de retomada do crescimento.
O professor ressaltou que, para estimular o crescimento do setor, o governo deve investir em ações que levem a um câmbio adequado, taxas de juros mais competitivas, aumento das exportações, ampliação das atividades de ciência e tecnologia, e melhoria da infraestrutura logística.
O ex-ministro da Saúde, José Gomes Temporão, acrescentou o uso do poder de compra do Estado como medida fundamental. Segundo estudo do Ipea, as compras públicas respondem por 10% do PIB brasileiro, o que mostra a força desse instrumento, que deveria ser usado como alavanca para a inovação. Ele defendeu ainda um maior uso da encomenda tecnológica pelo governo. Esta iniciativa, no passado, capacitou o Instituto Butantan e Bio-Manguinhos, permitindo que o Brasil hoje tenha acesso a vacinas contra a Covid-19.
VISÃO DO ESPECIALISTA
José Gomes Temporão
Ex-ministro da Saúde e membro titular da Academia Brasileira de Medicina, abordará o uso do poder de compra do Estado para desenvolver a produção local de IFAs.
Visão da indústria
A experiência das empresas que sobreviveram no mercado após diversas crises econômicas mostra que apenas uma política pública de longo prazo terá efeito para a reestruturação da cadeia produtiva.
Pelo lado das farmoquímicas, Sergio Frangioni, CEO da Blanver, destacou o tempo necessário para se desenvolver e aprovar um novo IFA. Logo, a indústria precisa de previsibilidade para operar. Marcus Soalheiro, vice-presidente da Nortec, apontou que o Brasil tem uma oportunidade no cenário internacional e deve, desde já, incentivar as exportações e marcar posição nos mercados mais regulados.
Passando a visão da indústria farmacêutica, Gabriela Mallmann, diretora de Qualidade e Assuntos Regulatórios do Aché, afirmou que as empresas deste segmento podem auxiliar as farmoquímicas a definirem um portfólio com necessidades não atendidas no País. Segundo ela, um parque produtivo nacional de IFAs mais sólido levaria a uma redução no tempo de produção, nos custos e no risco regulatório para as farmacêuticas nacionais.
Ogari Pacheco, fundador do Laboratório Cristália, complementou que só vislumbra duas saídas para o setor de IFAs: as farmacêuticas verticalizarem internamente ou o Estado usar seu poder de compra para garantir a demanda. Ele apontou ainda melhorias possíveis nos contratos feitos com o governo.
Jorge Souza Mendonça, diretor do laboratório público Farmanguinhos/Fiocruz, disse que, se o Brasil não aproveitar este momento de esgotamento total do fornecimento da China e da índia para outros países, mais uma vez perderá o bonde da História.
A ABIFINA dará mais detalhes sobre as discussões realizadas no evento na próxima edição da revista FACTO.
Sergio Frangioni, CEO da Blanver (indústria farmoquímica)
Marcus Soalheiro, vice-presidente da Nortec (indústria farmoquímica)
Ogari Pacheco, fundador do Cristália (indústria verticalizada)
Gabriela Mallmann, diretora de Qualidade e Assuntos Regulatórios do Aché (indústria farmacêutica)
Jorge Souza Mendonça, diretor de Farmanguinhos/Fiocruz (laboratório público)