Fonte: Globo Rural
18/09/24

Por Carolina Mainardes — Foz do Iguaçu (PR)*

14/09/2024 07h30 Atualizado 14/09/2024

A “pirataria” ou comércio ilegal de sementes está na mira da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem). A entidade acaba de recriar o Comitê de Combate à Pirataria, a fim de inibir ações irregulares de comercialização no setor.

“Comercializar semente ilegal é um crime. Estamos trabalhando junto a vários órgãos com sugestões para aprimorar a legislação, incluindo pena de prisão e multa para quem continuar praticando esse tipo de irregularidade”, afirma Ronaldo Troncha, presidente executivo da Abrasem, em entrevista à Globo Rural durante o Congresso Brasileiro de Sementes, que ocorreu durante a última semana em Foz do Iguaçu (PR).

Papel das sementes na sustentabilidade agrícola é tema de congressoCalor e estiagem afetam produção de sementes de soja para a safra 2024/25Produtor brasileiro gasta 18% mais com tratamento de sementes em 2023/24

Os prejuízos com o comércio ilegal de sementes, segundo estimativa da associação, chegam a R$ 2,5 bilhões ao ano no Brasil, no mercado que movimenta anualmente R$ 20 bilhões somente com a cultura da soja – que concentra a maior parte do percentual de sementes não certificadas. O Rio Grande do Sul é o Estado brasileiro que lidera o uso de sementes não certificadas, com 56%. O percentual está acima da média nacional, que gira em torno de 35%, informa Ronaldo.

Segundo a Abrasem, não há como calcular com exatidão os percentuais de “pirataria”, uma vez que as sementes não certificadas têm várias origens. Elas incluem, por exemplo, aquelas produzidas clandestinamente – sem certificação ou garantia de procedência – e as salvas, aquelas sementes adquiridas comercialmente e reservadas pelo produtor para serem usadas na safra seguinte, conforme permite a legislação brasileira. As sementes salvas não têm autorização para serem comercializadas, mas há casos de venda ilegal.

Além da soja, também registram utilização de sementes não certificadas as culturas de arroz, algodão, feijão e forrageiras temperadas. Por outro lado, estados como Mato Grosso e Paraná registram uma média abaixo de 20% nesse tipo de venda no mercado de sementes.

Semente “pirata”

Considerada uma ameaça à produção agrícola, a semente “pirata” não possui certificação dos órgãos competentes para ser comercializada. Assim, o produto não tem garantia de procedência e não segue as normas de produção do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Os prejuízos financeiros dos materiais destinados à venda clandestina são calculados considerando a perda de tributos e de royalties.

Ronaldo aponta a procura pelo menor preço, pelo produtor, como fator principal para o comércio irregular. “Muitas vezes, ele acha atrativo comprar uma semente mais barata, com um desconto de 5%. Mas, depois, ele deixará de obter em torno de 15% a 20% na produtividade da lavoura, pois deixará de produzir com qualidade, confiança e sanidade vegetal”, alerta.

O presidente da Abrates também lista questões como a cultura em cada região e a presença de fronteiras como fatores que influenciam a “pirataria” no setor. Ele acrescenta que o patamar mais alto do Rio Grande do Sul tem preocupado a entidade: “vamos reforçar a divulgação dos riscos da disseminação de pragas e doenças por sementes não certificadas”.

Mato Grosso e Paraná

Já no Mato Grosso, onde a estimativa da safra de soja 2024/25 é de 44,04 milhões de toneladas – segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) -, Ronaldo destaca que o baixo uso de sementes ilegais reflete a busca pela eficiência e produtividade na lavoura.

“O produtor mato-grossense já enxergou longe e sabe que, até pelas condições climáticas do Estado, precisa ficar atento. Se a semente estiver fora de um armazenamento ideal de temperatura, perde muito no seu vigor. E se não for uma semente de qualidade, em condições adequadas de armazenamento e plantio, pode afetar diretamente a produtividade”, explica o presidente da Abrasem.

No Paraná, não é diferente. De acordo com Jhony Möller, diretor-executivo da Associação Paranaense dos Produtores de Sementes e Mudas (Apasem), a forte presença de cooperativas agrícolas no Estado contribui para o uso de sementes certificadas, com um percentual que varia entre 79% a 89%.

“O perfil do produtor cooperado é aquele que busca a tecnificação da propriedade e o tratamento do solo, entregando qualidade ano a ano. Para isso, é preciso uma semente que germine, que tenha vigor para o desenvolvimento da lavoura e, para isso, é preciso uma semente certificada e de qualidade”, afirma.

A Apasem possui dois laboratórios de análises de sementes (LAS), nos municípios de Toledo e Ponta Grossa – regiões estratégicas da produção de grãos no Estado. Credenciados pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), os LAS analisam, em média, 8 mil amostras por ano – para associados e não associados -, segundo a Apasem.

Riscos

A pirataria de sementes, prática ilegal e sem potencial produtivo certificado pelo Mapa, representa, segundo a Abrasem, riscos ao campo e ao desenvolvimento tecnológico. Na lavoura, estão entre as preocupações a disseminação de pragas e doenças entre regiões e entre propriedades e a introdução de pragas e doenças quarentenárias inexistentes no Brasil, além da perda de rentabilidade e lucratividade nas principais culturas.

Ronaldo destaca a importância de se discutir o papel das sementes na agricultura, considerando que somente o segmento da soja movimentou aproximadamente R$ 300 bilhões no Brasil, na safra 2023/24, o que mostra o potencial e protagonismo da cultura no agronegócio brasileiro.

*A jornalista viajou a convite da Associação Brasileira de Tecnologia de Sementes – Abrates

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