Fonte: Globo Rural
25/06/25

Por Rafael Walendorff — São Paulo

24/06/2025 10h04

Parlamentares da bancada ruralista querem sustar os efeitos da portaria 805/2025 do Ministério da Agricultura, publicada no início de junho, que instituiu o Programa Nacional de Rastreabilidade de Agrotóxicos e Afins (PNRA). A indústria de pesticidas demonstrou descontentamento com a norma.

A avaliação do setor é que o modelo de rastreamento criado pela Pasta do ministro Carlos Fávaro será “pouco eficaz” e vai gerar custos adicionais à cadeia, com restrições à aplicação de outras tecnologias no processo de controle e acompanhamento dos produtos. Haverá reuniões com o ministério nos próximos dias para propor alterações e aperfeiçoamentos na regra.

O senador Marcos Rogério (PL-RO) e o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), apresentaram dois projetos de decretos legislativos para barrar a norma. Ainda não há previsão de votação das propostas.

A portaria do Ministério da Agricultura prevê a criação de uma plataforma tecnológica, chamada de Brasil-ID/Rastro-ID, que acompanhará a movimentação dos produtos, desde a saída das fábricas até o consumo e a etapa de logística reversa, e que rastreará sua localização.

De acordo com a Pasta, a criação do sistema de rastreabilidade tem como objetivo coibir o comércio ilegal de agrotóxicos e roubo de cargas. De 2019 a 2024, a Polícia Federal (PF) já apreendeu 273 toneladas de agrotóxicos irregulares, segundo levantamento do portal R7. A ferramenta também deve acompanhar se o consumo dos produtos ocorre dentro do prazo de validade.

A indústria de agrotóxicos, no entanto, diz que foi “pega de surpresa” com a publicação da portaria. Um grupo de trabalho criado pelo ministério no ano passado, com a participação de representantes do setor privado, ainda estava em vigor e não havia concluído as análises sobre o modelo de rastreabilidade a ser adotado.

O Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg) disse que é a favor da instituição de um mecanismo de rastreabilidade que seja “eficaz e viável”. A entidade diz que continua aberta ao diálogo na busca de “soluções factíveis” para a questão.

“O grupo de trabalho constituído pelo Ministério da Agricultura ainda não havia finalizado a discussão e foi pego de surpresa com a normativa publicada”, disse, em nota.

Falta de clareza

A CropLife Brasil, que representa empresas produtoras de agrotóxicos, disse que quer entender melhor a proposta feita pelo ministério. Representantes da entidade estiveram recentemente com Fávaro e pontuaram as dúvidas e críticas ao modelo criado.

“Muitos pontos não ficaram claros. Há receio de que haja aumento de custo sem que o modelo seja plenamente eficaz. Marcamos reuniões para os próximos dias junto com demais elos da cadeia. Se necessário, vamos propor aperfeiçoamentos”, disse Eduardo Leão, presidente da entidade.

“A ideia é contribuir para ter uma política eficaz sem que isso se traduza em custos adicionais aos produtores rurais e que não haja impacto sobre produtos de alimentação”, completou.

Impactos

Nos projetos apresentados ao Congresso para tentar sustar a norma, a bancada ruralista alega que a portaria foi feita de maneira apressada e precipitada, sem a avaliação de impacto regulatório necessária e sem a realização de consulta pública.

Na sua justificativa, o senador Marcos Rogério diz que estudos preliminares apontam para a estimativa de um custo adicional de R$ 0,30 por embalagem de defensivo agrícola com a exigência da inclusão da tecnologia específica de rastreabilidade, além de custos logísticos de transporte, armazenamento e leitura.

“Esse valor, inevitavelmente repassado ao produtor rural, representa um impacto econômico desproporcional, principalmente sobre pequenos e médios produtores, sem qualquer garantia de retorno efetivo em termos de segurança, autenticidade ou eficácia no combate ao comércio ilegal de defensivos”, diz o senador.

Uma fonte explicou que a portaria obriga o uso de etiquetas ‘Radio Frequency Identification (RFID)’, uma tecnologia supostamente “cara e desnecessária”, o que pode gerar gastos excessivos e injustificados à cadeia. Ela questiona os motivos para se criar uma “restrição tecnológica” no programa de rastreabilidade, sem a opção de aplicação de outras alternativas tidas como “viáveis” e já testadas globalmente, como QR Code, blockchain e plataformas em nuvem.

Outra fonte do setor disse que a forma como o programa foi proposto parece “pouco eficaz para cumprir os objetivos”, como a garantia de qualidade e origem do produto. “Foi atropelado. A portaria foi editada sem avançar nas discussões e acabou sendo de cima para baixo”, disse.

“O modelo é ineficaz e traz custo adicional, sem garantia. A rastreabilidade é um instrumento relevante em várias cadeias. O problema é que precisaríamos pensar em outros modelos, e não nesse selo”, completou.

O deputado Pedro Lupion diz que a derrubada da portaria é imperativa. “A decisão ministerial não apenas atropelou o processo de diálogo e construção de consenso, mas também ignorou as conclusões técnicas e o posicionamento do grupo que o próprio Ministério havia instituído para tal fim”, afirma no projeto.

“O cenário é de clara desarmonia entre o ato regulatório e os princípios essenciais que devem nortear a Administração Pública (…) A norma representa um retrocesso no diálogo com o setor produtivo e impõe ônus desnecessários e desproporcionais, sem a garantia de que os objetivos de rastreabilidade e combate ao comércio ilegal serão efetivamente alcançados”, completa o texto.

Questionado, o Ministério da Agricultura não respondeu.

Matéria completa

Anterior

Medicamentos veterinários falsos podem comprometer a saúde do seu pet. Saiba como identificá-los

Próxima

Ação integrada apreende galões de agrotóxicos vencidos e descartados de forma irregular