Especialistas debateram ações de compartilhamento regulatório em evento da ABIFINA
A adoção de práticas colaborativas e de confiança regulatória, também conhecidas como reliance, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) pode ser benéfica ao Brasil, mas traz desafios que precisam ser enfrentados pelas autoridades e pelo setor regulado. Esse é o entendimento dos especialistas que se apresentaram no webinar “Práticas Colaborativas em Regulação – Experiência com o Reliance no Brasil”, que a ABIFINA realizou no dia 30 de maio, como parte de sua agenda estratégica de 2023.
Durante o evento, a fundadora da Vita Regulatory Affairs Consulting Lorena Pereira traçou um panorama das iniciativas da Anvisa voltadas ao reliance no setor de medicamentos. Segundo ela, são marcos importantes a RDC 741/2022, que estabeleceu as diretrizes para que a agência possa considerar em seus processos de vigilância sanitária a análise realizada por autoridades estrangeiras; a RDC 750/2022, que criou um procedimento temporário para avaliação otimizada dos dossiês produzidos por outras autoridades regulatórias no registro de medicamentos, de produtos biológicos e de insumos farmacêuticos ativos (IFAs); e a Consulta Pública 1108/2022, que trouxe uma discussão mais detalhada e específica relativa à admissão de documentação técnica de outras agências no processo de registro de medicamentos e encontra-se m vias de ser transformada em regulamentação permanente.
Para Lorena, o compartilhamento de documentos já analisados previamente por outras agências otimiza e acelera o processo de aprovação de medicamentos no Brasil, sem no entanto tirar da autoridade nacional a decisão final. “Quando a gente fala de reliance, a gente fala de confiança entre países, mas não de reconhecimento direto de certificado de registro de produtos em outro país. A Anvisa mantém sua avaliação de forma detalhada, com possiblidade de avaliar os comentários de outra agência na tomada de decisão”, garante.
O desafio, segundo ela, tem sido a baixa adesão do setor regulado aos protocolos de reliance no Brasil. No seu entendimento, entre os motivos para esse fenômeno pode estar a incerteza das empresas sobre o impacto positivo ou não do compartilhamento de documentos na aprovação do registro de seus produtos.
Lorena mostrou também um panorama mundial das iniciativas e práticas de reliance voltadas ao setor de medicamentos, em agências como a Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, a European Medicines Agency (EMA), na União Europeia, e a Swissmedic, Suíça. De acordo com ela, a convergência regulatória impõe desafios a todas as autoridades regulatórias no mundo.
Na sequência, o chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Leonardo Dutra Rosa, defendeu a importância de a Anvisa adotar procedimentos em convergência e confiança regulatória. Ele lembrou que a agência tem uma atuação relevante nos foros internacionais relativos ao tema, sendo membro do Comitê Gestor do Conselho Internacional de Harmonização de Requisitos Técnicos para Produtos Farmacêuticos de Uso Humano (International Council for Harmonisation of Technical Requirements for Pharmaceuticals for Human Use – ICH) e da Agência ao Esquema de Cooperação em Inspeção Farmacêutica (PIC/S, do inglês Pharmaceutical Inspection Co-operation Scheme). A meta agora é o reconhecimento do sistema regulatório em saúde brasileiro como um sistema de excelência pela Organização Mundial de Saúde (OMS), para que a Anvisa seja listada como autoridade regulatória de referência pela OMS.
A Assessoria de Assuntos Internacionais teve atuação relevante na elaboração da RDC 741. O objetivo, segundo Leonardo, foi consolidar as iniciativas de confiança regulatória já desenvolvidas pela agência. “Quisemos criar um guarda-chuva único, uma estrutura coesa para iniciativas de convergência e reliance desempenhadas pela Anvisa”, afirmou.
No caso de registro de medicamentos, a preocupação é garantir a aprovação de medicamentos em conformidade com os interesses nacionais, além de estimular a adesão aos protocolos de reliance. “Queremos, e não estamos dispostos abrir mão, de um processo regulatório no qual a Anvisa tenha a palavra final na entrega de um produto no mercado brasileiro. A Anvisa tenta incentivar o uso dessas ferramentas e explicar pra todas as partes interessadas que a agência quer entender o racional da decisão da outra autoridade reguladora. A RDC 750 foi construída com essa preocupação”, assegurou.
Para a especialista em Assuntos Regulatórios da ABIFINA, Marina Moreira, que moderou o evento, o debate trouxe contribuições importantes. “É uma pauta desafiadora para abordar em pouco tempo, mas foi um rico debate. Tivemos mais de 90 interessados hoje, o que mostra que o tema segue vivo e despertando interesse”, celebrou.
Assista ao webinar: