Especialistas discutem impactos da Lei 10.603/2002 e a polêmica possibilidade de estender a proteção de dados de testes para produtos de saúde humana

A mesa “Data Protection: Entre Incentivo à Inovação e Interesse Público” foi mais um dos acontecimentos do terceiro dia do XVI Seminário Internacional Patentes, Inovação e Desenvolvimento (SIPID), realizado em 18 de setembro, em Brasília. O painel discutiu a proteção de dados de testes prevista na Lei 10.603/2002 para produtos farmacêuticos veterinários, fertilizantes, bioinsumos e agrotóxicos, além de avaliar a controversa hipótese de estender essa medida também para medicamentos de uso humano.
Ana Claudia Oliveira, especialista em Propriedade Intelectual, Inovação e Biodiversidade da ABIFINA, relatou a intensa participação da entidade no debate. A associação contribuiu com as cinco consultas públicas realizadas sobre o assunto na área da saúde humana e acompanhou todas as reuniões do Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual (GIPI).

“Chegou-se à conclusão de que não é o momento de internalizar o data protection para a saúde humana”, afirmou.
Entre os problemas apontados por Oliveira estão o aumento de custos para a indústria, o atraso na entrada de genéricos no mercado e a necessidade de refazer testes já disponíveis. Ela também questionou se o conceito de nova entidade química poderia ser considerado inovação, uma vez que a substância já não seria inédita no mundo quando é pleiteado o registro no Brasil. Isto porque o processo avaliativo da Anvisa não contempla registros feitos no exterior, como disse Danielle Christine de Sousa Filadelpho, gerente-geral substituta da Gerência-Geral de Toxicologia (GGTOX) da Anvisa.
A especialista da ABIFINA afirmou: “Esse debate sempre volta, porque, depois da queda do parágrafo único do artigo 40 da Lei da Propriedade Industrial, qualquer tipo de estratégia de prorrogação de monopólio é trazida à tona. Já temos 20 anos de proteção patentária. Por que ter mais monopólio? Por que atrasar mais a entrada de genéricos? Pensar em data protection para uso humano é retroceder e ferir o SUS e a sociedade”, questionou.
José Victor Torres Alves Costa, coordenador-geral de Agrotóxicos e Afins do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), destacou o papel do órgão no registro de agrotóxicos, fertilizantes e bioinsumos — estes dois últimos em responsabilidade compartilhada com a Anvisa e o Ibama.
Segundo ele, o ministério trabalha para reduzir o tempo de análise dos pedidos e planeja contratar novos servidores e implementar um sistema integrado entre os três órgãos.

“O Mapa está elaborando uma nova regulamentação. A ideia é deixar mais claras as regras e dar oportunidade de outras empresas acessarem o registro, preservando o direito de quem procedeu à inovação de ser compensado pelo investimento”, acrescentou.
Danielle Christine de Sousa Filadelpho, gerente-geral substituta na Anvisa, explicou como é feito o exame dos pedidos.

“Diferentemente da avaliação de um medicamento genérico, para analisar um produto agrotóxico equivalente a gente consulta o dossiê de registro do produto técnico de referência indicado. Portanto, a Anvisa não faz a avaliação do equivalente enquanto durar a proteção dos dados de teste”, detalhou.
A legislação assegura sigilo de dez anos para moléculas novas e cinco anos para moléculas não novas a partir do registro ou liberação, além de um ano para novos dados apresentados após o registro. Nos casos em que não há informações técnicas disponíveis para análise pela Anvisa, cabe ao Mapa indicar o início da contagem desse prazo.
Encerrando o painel, o moderador Raul Murad, sócio do escritório DBB Advogados, ressaltou que a própria Lei 10.603/2002 apresenta limitações.

“Por ser curta, ela trabalha com conceitos jurídicos indeterminados que, por isso, precisam ser interpretados pelo aplicador da lei”, comentou, o que revela uma fragilidade do sistema.
Acesse as gravações do XVI SIPID no canal da ABIFINA no YouTube.