REVISTA FACTO
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Jan-Mar 2017 • ANO XI • ISSN 2623-1177
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Desafios para tornar a indústria nacional competitiva internacionalmente
//Artigo

Desafios para tornar a indústria nacional competitiva internacionalmente

Há muitos anos, o empresariado do setor farmoquímico faz críticas sobre as dificuldades com as quais se depara. Contudo, por serem críticas repetitivas, pode parecer que os representantes do setor estão constantemente reclamando apenas para terem algum tipo de vantagem. Porém, os números da indústria como um todo no Brasil não param de cair e mostram que vamos continuar amargando resultados ruins, caso nada seja feito, principalmente ao comparar a nossa realidade com outras economias no mundo. Se quisermos construir uma indústria forte, não só para atender e proteger nosso mercado interno, como também para competir e ganhar mercado lá fora, precisamos, como nunca, criar um ambiente favorável para fazer negócio no País. Para isso, precisamos debater uma série de desafios que encontramos todos os dias.

Para começar a operar, por exemplo, uma empresa farmoquímica no Brasil, mais especificamente no estado de São Paulo, encontra vários desafios. O primeiro deles refere-se à abertura da empresa. Só para obter a Inscrição Estadual e o CNPJ, o tempo médio é de três meses, sem considerar atrasos causados por situações extraordinárias, como greves. As demais licenças, como do Ibama, da Cetesb, da Anvisa/Sivisa, além das autorizações das Polícias Federal e Civil e do Exército, para o caso de produtos controlados, e da Receita Federal, para operar com comércio exterior, o tempo médio é de quatro meses.

Diante desse cenário, a empresa estaria apta a operar em aproximadamente sete meses, sem contar que as tratativas são realizadas com inúmeros órgãos separadamente, com pouca ou nenhuma integração entre eles. Para poder ilustrar o processo moroso que enfrentamos, a seguir há um exemplo de fluxograma de licenças, a partir da concessão do CNPJ e Inscrição Estadual.

Além disso, aqui no Brasil pode parecer que as licenças e documentos fazem parte somente do processo de abertura da empresa. Entretanto, as licenças mencionadas acima precisam de renovação e são atualizadas durante toda a vida de uma empresa, o que resulta em tempo e custos elevados ao longo de sua operação. A meu ver, um dos caminhos para evitar todo esse desgaste é centralizar os controles e licenças em um único órgão, no município ou estado em que a empresa opera, para que o órgão seja o responsável por coordenar, junto a todos os demais órgãos intervenientes, o processo de abertura e acompanhamento da empresa.

Quando comparamos com os Estados Unidos, por exemplo, observo que as exigências lá são iguais ou até maiores que no Brasil, dependendo do estado. Contudo, as tratativas são centralizadas e coordenadas pelo governo de cada estado. O objetivo do estado é atrair empresas para o território local, gerando mais empregos e maior riqueza em sua região. Com essa visão, o estado atua como um facilitador e não como um complicador. Os órgãos trabalham de forma integrada. Para muitas licenças, há um órgão central que interage com a empresa, bem diferente do caso brasileiro, em que há a necessidade de se falar com diversos órgãos separadamente. Para se conseguir nos Estados Unidos um Tax ID number, que equivale ao nosso CNPJ e Inscrição Estadual no Brasil, o tempo médio é de até 30 dias, prazo bem menor que o de São Paulo, que pode chegar a três meses.

Mas os entraves não param por aí. Na medida em que iniciamos a operação, vários outros desafios vão aparecendo. Mesmo com instrumentos financeiros diferenciados para investimentos, como em equipamentos, instalações, construções prediais e desenvolvimentos de novos produtos, o custo financeiro em termos gerais no Brasil ainda é bastante elevado, quando comparado a outras economias. E esse custo prejudica e muito nossa competitividade e inibe o investimento em novos projetos, afetando a geração de inovação no País, além de empregos e o desenvolvimento de novos produtos e tecnologias.

Outro fator que também desestimula o investimento, que afeta igualmente a competitividade do setor produtivo, é a apreciação e a oscilação excessiva do câmbio. Uma oscilação excessiva gera uma imprevisibilidade enorme, causando insegurança no planejamento futuro e, em muitas situações, paralisia nos projetos de investimento. Quando comparamos com a moeda da Índia, por exemplo, além de vermos um câmbio bastante depreciado, vemos uma oscilação menor e mais linear, comparada à oscilação que acontece no Brasil.

Para exemplificar, adiante segue uma comparação das oscilações do Real (Brasil) e da Rupia (Índia) entre os períodos de 1995 a 2016.

A carga e a complexidade tributária são também fatores críticos relacionados à competitividade no Brasil. O País possui uma das cargas tributárias mais altas do mundo, hoje cerca de 35% do PIB, enquanto na China e na Índia ela é de 18% e 15%, respectivamente. Por aqui são vários os impostos: ICMS, IPI, PIS, Cofins, CSLL, IOF, FGTS, INSS, IR, entre outros. Todos com suas especificidades, como: data de recolhimento, método de apuração e base de cálculo. São necessárias grandes equipes para administrar toda essa engenharia tributária, para que seja possível honrar os pagamentos junto ao governo. Dentro deste tema existe um potencial enorme de melhorias, quando o viés for gerar condições para aumentar a competitividade da indústria brasileira no mundo.

O custo da mão de obra no Brasil também está diretamente relacionado aos tributos. A carga tributária e os benefícios incidentes sobre a folha salarial chegam a mais que dobrar o custo do colaborador para a empresa. Ouvimos constantemente a necessidade de uma reforma tributária, mas na prática o que ocorre é um aumento da carga dos tributos.

Um fator importante relacionado à deterioração mais acentuada dos preços no mercado brasileiro tem sido a abertura indiscriminada para matérias-primas de diferentes procedências. As agências norte-americana Food and Drug Administration (FDA) e a europeia European Medicines Agency (EMA) aceitavam, no passado, documentos rígidos e inspeções agendadas para comprovar as boas práticas. Foi, porém, somente com a abertura de escritórios do FDA nas regiões de origem desses produtos que passou a existir um monitoramento frequente e foi possível constatar de fato as empresas que seguiam as regras à risca. E a partir desse processo, várias companhias foram desqualificadas por não conformidade com os requisitos obrigatórios de boas práticas.

O Brasil também deveria praticar um sistema de qualificação técnica como ocorre em outros mercados, como no Japão e nos Estados Unidos. Na China, por exemplo, existem barreiras técnicas que avaliam as matérias-primas para os produtos farmacêuticos, sendo necessário o registro da matéria-prima no órgão regulatório local, o que leva até três anos para que o produto esteja aprovado e apto para poder ser comercializado. No Brasil, já tivemos iniciativas relevantes, como a criação de regras específicas para o registro de alguns Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs). Como próximo passo, a sugestão é expandir a relação de produtos que devem ser registrados no País e somente permitir o ingresso de insumos que atenderem aos critérios de exigência solicitados pela agência reguladora brasileira, a Anvisa. A iniciativa, além de ser fundamental até por uma questão de saúde pública, irá proporcionar maior qualidade e segurança aos produtos farmacêuticos.

E por fim, porém não menos importante, a questão dos Acordos Internacionais de Livre Comércio. A retirada do Brasil do grupo de países que se beneficiavam do SGP Europeu (Sistema Geral de Preferências) foi um retrocesso à indústria brasileira. Nossos produtos passaram a ser tributados na Europa em mais de 6%. Em outras palavras, nosso produto passou a custar mais caro para o cliente europeu, o que resultou em perda de competitividade e de mercado. Sem dúvida, se estivéssemos inseridos e mais integrados à economia mundial, mediante acordos de livre comércio com outros países, nossa saída para a crise atual poderia ser facilitada via exploração do mercado externo, já que a economia local não tem tido fôlego para sair sozinha da crise, dado todos os fatores negativos, como: crise fiscal e falta de recurso para investimento, desemprego alto, crédito caro e escasso, e queda na renda.

Sergio Frangioni
Sergio Frangioni
Presidente do Conselho Administrativo da ABIFINA.
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