REVISTA FACTO
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Jul-Ago 2009 • ANO III • ISSN 2623-1177
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//Artigo

Inovação, invenção e...confusão

Poucas ideias alcançaram um nível de aceitação e difusão tão generalizado na sociedade brasileira quanto a ideia de inovação e sua importância no processo de desenvolvimento. O tema vem sendo explorado, com pompa e circunstância, pelo governo, setor privado e academia, em todos os seus níveis. Organizações não governamentais foram criadas para promover a inovação e associações empresariais, institutos de estudo e pesquisa, núcleos acadêmicos etc. trataram rapidamente de incluir o tema em suas agendas de trabalho.

Não há semana em que não aconteça um evento, seminário, oficina de trabalho ou que não se publique uma resenha, artigo ou coluna de opinião tratando de inovação. Pelo andar da carruagem não me espantaria ver a inovação como tema de “rap” ou enredo de escola de samba na Sapucaí.

No exterior a febre não é menor; a inovação já ganhou até status de nova disciplina econômica: a economia da inovação.

Em pouco menos de dez anos, inovação ganhou entre nós definição, classificação, adjetivação, legislação, mobilização e, como não poderia deixar de ser, um pouco de confusão, sobretudo com o conceito de invenção.

Nada contra a inovação, é claro, ela é sem dúvida um fator de crucial importância para alcançar maiores níveis de competitividade e sucesso no mercado, mas é preciso um pouco de cuidado para evitar confusões conceituais que possam afetar o esforço de inovação e servir de pretexto para a defesa de interesses estabelecidos.
Inovação e invenção são conceitos que se interpenetram, mas não se confundem. A invenção se situa no plano das ideias enquanto a inovação só acontece no plano do real. Inovar pode ser entendido como transformar ideias em valor, e daí vem a sua ligação com a invenção. A geração de ideias novas tem seu lócus preferencial na academia enquanto a inovação acontece na empresa.

É através da inovação que se atinge a novos produtos e serviços e que se consegue o aumento da produtividade em uma sociedade. O crescimento encontra no investimento em capacidade instalada a sua força motriz principal, mas crescimento é apenas mais do mesmo. É através da inovação que se incorpora uma vertente qualitativa ao crescimento, atingindo-se o desenvolvimento. Através da inovação é que empresas e países conseguem se diferenciar, conquistar mercados, competir com vantagens.

Dada sua importância para o desenvolvimento e competitividade a nível internacional, países vem estabelecendo políticas de incentivo à inovação e empresas, há muito tempo, já adotam estratégias de competição baseadas na aceleração de seus processos internos de inovação.

Estabelecer políticas e estratégias de sucesso para fomentar a inovação leva ao problema de identificar as variáveis importantes a incentivar e escolher indicadores com que avaliar o avanço do processo. É aí nesta seleção de indicadores que a confusão inovação- invenção ganha terreno fértil para se instalar: alguns dos indicadores mais usados para avaliar o grau de inovação de uma economia, inclusive para estabelecer comparações entre países, são exatamente indicadores de patentes, isto é, de invenções e não de inovações.

Uma invenção só se torna uma inovação quando é realizada na prática e passa a alterar a realidade, o que nem sempre acontece. Na verdade, se analisarmos o subconjunto das invenções patenteáveis – porque nem todas o são – veremos que apenas uma pequena fração delas chega ao estágio da inovação. Um estudo recente feito a partir das estatísticas do Escritório Europeu de Patentes – EPO mostrou que mais da metade delas não chega ao décimo ano de vigência, abandonadas por seus titulares por não terem encontrado uma aplicação prática viável, ou por terem sido ultrapassadas tecnologicamente.

Além disso, há um grande número de invenções que não atendem aos critérios legais de patenteabilidade, especialmente o de atividade inventiva e, portanto, não recebem patentes, muito embora venham a se tornar inovações. Ainda mais, há um grande número de setores industriais para os quais patentes não são a forma mais importante de proteger suas inovações e não se preocupam em trilhar o trabalhoso e caro caminho do patenteamento. Se não bastassem esses fatores para reduzir a representatividade da contagem de patentes como indicador da inovação, é preciso aduzir que há sensíveis diferenças no modo pelo qual os países concedem patentes e que empresas utilizam estratégias de patentear diferentes aspectos de uma mesma invenção contribuindo para reduzir o significado do número de patentes como indicador de inovação.

Apenas alguns poucos setores da economia têm na proteção por patentes o meio mais eficaz para proteger suas inovações e seus mercados. São, em geral, setores tecnologicamente sofisticados, mas de baixas barreiras à entrada de competidores e em que a cópia é fácil. Dependendo fundamentalmente de direitos de propriedade intelectual para proteger seus mercados, tais setores se empenham em difundir idéias do tipo “sem patentes não há inovação” e similares. Na verdade, apesar da farta literatura sobre o assunto, não há evidência teórica nem empírica que tenha estabelecido um nexo causal entre patentes e inovação, embora se possam estabelecer correlações plausíveis entre elas.

Há certamente vários índices que podem ser usados pelos países como indicadores de sua propensão a inovar e do estágio em que se encontram em relação a outros países. Um dos mais úteis é a relação entre as importações e exportações de produtos de alta tecnologia e média-alta tecnologia que utiliza a classificação de produtos por intensidade tecnológica desenvolvida pela Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico – OCDE, e nessa fotografia o Brasil aparece mal.

Em produtos de maior intensidade tecnológica o Brasil vem importando o dobro do que exporta. Quando a economia desacelera a relação cai um pouco, mas com a retomada do crescimento o índice volta rapidamente a subir numa sinalização clara de nossa extrema vulnerabilidade na produção de bens de maior conteúdo tecnológico, como produtos das indústrias químicas, farmacêutica, máquinas e equipamentos e eletro-eletrônica, em especial.

A inovação é muitas vezes associada aos esforços de pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico, não sem certa dose de razão, pois pesquisa é geradora de novas ideias e o desenvolvimento tecnológico se dedica a transformar tais ideias em produtos e serviços, isto é, em inovações. Assim, os dispêndios em P&D dos países e das empresas são frequentemente usados como indicadores da propensão a inovar.

A relação entre os dispêndios globais em C&T em relação ao PIB é outro indicador usual do esforço inovador e por este critério o País também não se destaca, estamos investindo apenas cerca de 1,3% do PIB quando outros países de nível de desenvolvimento semelhante ao nosso já estão investindo mais que o dobro disto.
A inovação é um processo complexo que ainda aguarda o estabelecimento de um sistema satisfatório de aferição que, quando alcançado, certamente envolverá diversos indicadores e não apenas um.

As empresas que se preocupam com inovação já têm um elenco de indicadores para aferir seu desempenho, os mais usuais sendo:

» Número de novos  produtos lançados pela empresa;
» Percentagem das vendas derivadas de produtos lançados nos últimos 5 anos;
» Número de empregados dedicados a P&D;
» Gastos de P&D como percentual de vendas;
» Número de patentes depositadas, rejeitadas e concedidas.

O fundamental neste momento, seja nas indústrias seja no plano mais geral do País, é evitar que confusões conceituais e interesses localizados distorçam as iniciativas para alavancar o esforço inovador de que tanto precisamos.

Marcos Oliveira
Marcos Oliveira
Membro do Conselho Consultivo da ABIFINA.
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