REVISTA FACTO
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Set-Out 2008 • ANO II • ISSN 2623-1177
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Um depoimento histórico: das origens da Petrobras à pesquisa sobre a produção de enzimas no Brasil
//Entrevista Kurt Politzer

Um depoimento histórico: das origens da Petrobras à pesquisa sobre a produção de enzimas no Brasil

Conversar com Kurt Politzer, 86 anos, graduado em Química Industrial pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e Mestre em Química Orgânica pelo Lowell Technological Institute de Massachusetts, EUA, professor aposentado da UFRJ e um dos mais importantes personagens da história da Química no Brasil, confirma que o brilho intelectual em uma extensa trajetória de sucesso não envolve uma atitude de superioridade. Gestos suaves, olhar doce e fala mansa, Kurt recebeu a equipe de reportagem da revista FACTO em seu home office de onde ainda se dedica à orientação de pesquisas de ponta sobre enzimas industriais.

O seu extenso currículo enumera trabalhos acadêmicos e publicações do homem público, profissional, empresário, professor e pesquisador devotado ao desenvolvimento da indústria química nacional. Testemunha de uma época que misturava nacionalismo e poder militar, Kurt foi recrutado de sua missão de profissional da química para o papel de homem público ao ingressar no recém criado Conselho Nacional de Petróleo, em 1948, a convite de Leopoldo Miguez de Mello. Juntos, no Conselho Nacional do Petróleo conduzido por um militar, durante o governo do presidente Getúlio Vargas, os dois jovens profissionais da química brasileira atuaram como catalisadores do processo histórico que levou à criação da Petrobras, reconhecidamente até hoje um patrimônio nacional inigualável.

Seu currículo impressiona pela quantidade de trabalhos científicos e publicações para um homem que esteve tanto tempo à frente da iniciativa privada, que na maior parte das vezes é marcada pelo empreendedorismo e por visão mais pragmática e imediatista. O professor acabou por se impor ao executivo ou a vocação de pesquisa é inerente ao profissional de química fina? Aliás, a escolha da carreira na área de química orgânica não era uma opção incomum em sua época?

Creio que a vocação para a pesquisa e o desenvolvimento é a principal característica do profissional que se interessa por química, mesmo quando ele se deixa tornar um empresário com inúmeras funções de gestão. Por isso, talvez, eu cultive até hoje o enorme interesse pela investigação, seja de caráter científico, mercadológico ou político. Isso justifica, com certeza, as publicações que você encontrou com meu nome. Quando iniciei meus estudos, freqüentei a Escola Alemã, porque a formação européia era a que predominava na época, no entanto, acabei sendo levado a fazer doutorado nos Estados Unidos. Cursei os quatro anos da Escola de Química no Brasil gratuitamente, porque passei em primeiro lugar no vestibular e, ao concluir o curso, ganhei uma bolsa por desempenho para fazer uma pós-graduação em universidade norte-americana. Era uma proposta irrecusável, mas foi também um episódio decepcionante na minha vida acadêmica, a ponto de eu ter que reclamar com a coordenação da universidade, porque não estava realmente satisfeito com o curso e fiz várias críticas e sugestões ao currículo e ao conteúdo do que era ensinado. Foi uma situação constrangedora, mas necessária, pois eu não podia desperdiçar a oportunidade que me foi dada de estudar no exterior. Na época, a universidade reconheceu que minhas críticas procediam e, não só isso, agradeceu minha contribuição à avaliação do currículo e do corpo docente, oferecendo-me a oportunidade de visitar diversos cursos no país até encontrar aquele que considerasse adequado ao meu desenvolvimento científico.

Foi uma postura muito correta que acabou por me levar à Lowells University em Massachusetts, altamente credenciada, onde tive a sorte de conhecer o professor Panagiotakos, um homem com conhecimento de química extraordinário que tinha tido um importante papel profissional durante a Primeira Guerra Mundial e, depois, havia decidido lecionar. Panagiotakos pesquisava a síntese de produtos de interesse militar no MIT em Boston, que sempre foi e continua sendo uma das universidades de maior projeção nos Estados Unidos. Foi o orientador da minha tese de mestrado e, além de ter uma conhecimento acima do comum, estava sempre disponível para tirar dúvidas. Muitas vezes freqüentei sua casa à noite ou mesmo de madrugada para discutir assuntos da tese que não me deixavam dormir. É para mim um exemplo de mestre até hoje.

Como foi seu retorno ao Brasil, uma vez que na década de 40 a maior parte das atividades de química fina estavam concentradas em industrias familiares voltadas à produção mineral e sua formação era em química orgânica?

Ao finalizar minha tese de mestrado, recebi convite para trabalhar em uma indústria têxtil na cidade de Brusque, em Santa Catarina. Na verdade, condicionei o aceite desta proposta à minha liberação da obrigação assumida de atuar como professor universitário no retorno ao Brasil em troca da bolsa de estudos no exterior. Como eles conseguiram me liberar desta obrigação, argumentando a ausência de mão-de-obra especializada para o seu segmento no país, retornei direto para a produção. Tratava-se de uma empresa líder no segmento, que existe até hoje e continua tendo uma parcela significativa de mercado. Tinham duas fábricas de tecido, trabalhavam com teares e produziam, além de produtos químicos para sua própria indústria têxtil, também para outros segmentos. Fiquei alguns anos trabalhando com motivação no aperfeiçoamento dos processos fabris. Consegui, por exemplo, aumentar a permanência da fiação nos teares, pois as freqüentes rupturas tinham grande impacto no desempenho da produção naquela época. Consegui alcançar excelentes avanços em produtividade e sei que, por eles, teria ficado lá por toda a vida. Introduzi modificações profundas em duas unidades industriais e fui encarregado de construir uma nova fábrica a partir do zero. Foi um período muito produtivo, compramos equipamento de ponta e alcançamos um nível de qualidade muito superior. A empresa também produzia amido de mandioca, outro segmento no qual me envolvi bastante. Sem dúvida, foi uma experiência interessante tanto na área têxtil como na modernização de amido de mandioca e seus derivados, que passaram a ser matéria-prima para uma série de produtos. Havia muito trabalho, mas chegou o momento em que me senti muito isolado do mundo – você sabe, não eram tempos de Internet como agora em que estamos todos conectados. O conhecimento se concentrava nos grandes centros e lá eu não tinha com quem conversar e aprender mais. Os empresários sempre foram muito cordatos e interessados em novas idéias, permitindo até que eu organizasse um laboratório de pesquisa na fábrica, uma coisa pouco usual no período. Mas meu compromisso com o futuro não permitiu que me acomodasse e voltei para o Rio de Janeiro.

É neste momento que recebe o convite do professor Leopoldo Américo Miguez de Melo para participar do Conselho Nacional de Petróleo?

Foi. Na verdade, eu tinha a possibilidade de trabalhar em uma multinacional americana que queria se instalar no Brasil, mas o Leopoldo me convenceu que o grande desafio estava no petróleo. O Leopoldo tinha sido o meu professor na Escola de Química da UFRJ e, quando ele soube que eu tinha voltado ao Rio de Janeiro, logo me procurou. Eu expliquei a ele que eu estava muito isolado lá no sul, que não tinha queixas mas era uma situação que em poucos anos me deixaria muito distante de outros mercados. Então ele disse: “você vem trabalhar com a gente no CNP, nós estamos crescendo muito, precisamos de profissionais como você”. Ele estava com uma série de projetos em andamento e absolutamente convicto de que seriam muito importantes para o país. Contou que já tinham contratado um projeto completo de uma refinaria que estava sendo montada na Bahia e que fariam outra na cidade de Cubatão em São Paulo, assim precisavam da pessoa certa para liderar o projeto. Eu não queria, porque tinha muito receio de estar submetido a um general que chefiava o Conselho. Sabia que o Leopoldo tinha a autonomia do conhecimento e uma enorme capacidade de gestão e negociação, mas no final das contas quem mandava era o general. Naquela época, tinha militar em todo lugar, é verdade, e essa idéia me incomodava. Inclusive depois, quando fui liderar a instalação do projeto de Cubatão, muitos militares trabalhavam no processo, e eram as pessoas que estavam disponíveis. O curioso é que Leopoldo propôs que eu decidisse sobre o convite após ter uma reunião com o General. Então, ainda muito receoso, aceitei e ele marcou a reunião. Quando cheguei, o General se apresentou e disse “sou militar, mas sou civilizado, venha trabalhar conosco”. Assim, com sinceridade e objetividade, me conquistou.

Então, você foi contratado para um determinado projeto?

Sim. Fui enviado aos EUA para acompanhar a encomenda de equipamentos de produção para a Refinaria de Cubatão, que foi a primeira unidade de porte a trabalhar com petróleo no país – no caso ainda o importado porque a produção nacional era muito pequena e estava situada na Bahia, para onde já se tinha comprado uma unidade processadora de petróleo muito pequena, mais simbólica do que produtiva efetivamente. A Refinaria Presidente Bernardes foi a primeira unidade de tamanho competitivo em âmbito internacional, instalada sob uma base de muito bom nível. Um exemplo do que era possível fazer no país. Na ocasião, o Brasil procurou um financiamento americano e não conseguiu, os Estados Unidos não estavam interessados em proporcionar ao país a possibilidade de ter instalações modernas de processamento de petróleo. Porém, houve financiamento francês e alemão com algumas negociações que eu conduzi pessoalmente na época, pois havia aspectos técnicos em que a Alemanha estava na frente. Foi depois da guerra e a Alemanha estava ainda muito abalada, no entanto, consegui um bom acordo. Conseguimos também financiamento de um banco francês para compra de equipamentos. Eu dirigia o projeto de Nova Iorque, mas tínhamos também uma pequena operação na França, dirigida por um militar. Após este período de negociações e do acompanhamento da compra dos equipamentos, voltei ao Brasil e acompanhei toda a montagem das instalações. Eu tinha aprendido sobre como os projetos deveriam ser conduzidos e trouxe esta experiência para a montagem da fábrica no Brasil, o que para mim foi muito interessante, uma experiência magnífica e rara. Afinal, Leopoldo tinha razão, estávamos desenvolvendo um trabalho extremamente relevante e pioneiro no país. Eu me orgulhava e hoje me orgulho ainda mais disso, quando vejo aonde chegamos.

Então, a importância histórica da refinaria de Cubatão é imensa, na medida em que foi a primeira de grande escala, posicionando o Brasil ao nível do mercado internacional, mesmo que a partir do petróleo importado? E o Conselho Nacional de Petróleo foi na verdade o embrião da Petrobras, que se tornou a primeira empresa pública nacional. Imagino que nos anos 40 conceber uma empresa pública voltada para o lucro não fosse tarefa tão fácil, pois não existia este modelo. Qual a importância de Leopoldo Miguez para o início do projeto Petrobras?

Você tem razão. Era um momento decisivo. Na época, havia uma grande discussão em torno do tema, que dividia opiniões e humores: o Conselho Nacional do Petróleo deveria continuar como órgão regulador que tratasse dos assuntos petrolíferos no país ou deveria se criar uma outra organização, mais empresarial? Isso porque o CNP se comportava exatamente como um Conselho, ou seja, ele tinha representantes de diversas instâncias do governo que se reuniam para tomar as decisões. A grande dúvida era se, no caso de se criar uma empresa de petróleo no Brasil se ela deveria ser governamental ou privada. É lógico que houve uma pressão muito grande no sentido de que não fosse governamental, porque o governo era criticado, como normalmente todo governo é, e tinha suas falhas, como todo governo tem. O espírito nacionalista e a competência técnica e diplomática de Leopoldo foram fundamentais para articular uma decisão favorável ao caminho estatal. Enquanto existiu o CNP, Leopoldo era realmente a liderança de todos os processos, o general pouco opinava e o fato de ser um militar de prestígio até ajudou muito na concretização dos projetos.  O fato de ter um general como chefe, levava ao comparecimento do ministro da Guerra às reuniões do CNP, o que na época significava um apoio muito importante. Arriscaria dizer que o Leopoldo é o pai da Petrobras, pois foi ele quem defendeu arduamente essa idéia em inúmeras reuniões e congressos. Era uma personalidade muito respeitada e sempre tinha a tese no centro da cena, nunca o ego. Exerceu um papel fundamental para o país, sem interesses pessoais. Foi também extremamente importante como professor na Escola de Química da UFRJ, onde formou excelentes profissionais até hoje no mercado e imbuídos de espírito nacional. Ele era a favor de um Brasil, acima de qualquer governo. Sua atuação foi decisiva para a opção de se criar uma estrutura governamental e, assim, nasceu a Petrobras que está aí. O CNP perdeu aos poucos a razão para existir, mesmo como órgão regulador, já que a empresa era estatal. O interessante é que não havia um modelo para a criação desta empresa, mesmo a CSN não era parâmetro para o que se estava criando, nem em termos jurídicos, técnicos ou de organização. Porém, a idéia e a oportunidade se impuseram à história.

Como ocorreu a transição do CNP para a concepção de empresa pública estatal?

Ocorreu muito rapidamente. O conselho praticamente desapareceu, ficando muito limitado a tarefas burocráticas.  Foi neste momento que eu e mais três colegas resolvemos sair do CNP, antes que ele acabasse, para montar nossa própria empresa. Tive, obviamente, a oferta de ir trabalhar na Petrobras, mas nós estávamos decididos a trilhar o caminho empreendedor. Nossa fábrica não tinha nenhuma relação com petróleo inclusive. Eu tive a oferta de trabalhar na Petrobras, mas na época a minha escolha com mais três outros colegas que trabalhavam lá foi fazer a nossa fábrica que não tenha nada a ver com petróleo, seria uma fábrica química, mas não necessariamente de petróleo.

Então vamos falar sobre o seu lado empreendedor. Com três colegas do CNP, você fundou a Getec, que mais recentemente foi adquirida por uma multinacional, não é isso?

Foi um período muito entusiasta da minha vida profissional. Saímos de uma estrutura governamental e hierarquizada para montar nosso próprio negócio, apostando em algo realmente novo, que nada tinha a ver com petróleo e nos dedicamos a fabricar produtos que não eram fabricados no Brasil. Foi ousado e deu certo. Empresa química totalmente nacional que sobreviveu por muito tempo e somente foi vendida frente aos desafios impostos pela globalização. De certa forma, ela ainda existe na operação industrial dessa multinacional. Foi um período em que muitas iniciativas desse gênero aconteceram, pois começavam os investimentos em uma indústria química nacional. Na verdade, todos os segmentos industriais começavam no país. Outros empresários também alcançaram sucesso no período. Depois disso, fundei ainda as Indústrias Químicas de Taubaté, que também tem expressão até hoje no segmento em que atua.

A indústria química é capital intensiva e de mão-de-obra altamente especializada. No papel de ex-professor catedrático e também no papel de empresário, como vê a evolução da formação dos profissionais da área no país?

Nesse sentido, só tenho a experiência do Rio de Janeiro, mais precisamente da Escola de Química da UFRJ, que considero ter desempenhado um papel importante na história da química nacional. Até hoje, a Escola tem professores com excelente nível e, a despeito das dificuldades, realiza projetos de pesquisa relevantes. Acredito que a formação da mão-de-obra se mantenha de bom nível, mas afirmo que vamos precisar de um número muito maior de pesquisadores se quisermos realmente ter influência nas inovações tecnológicas na área. O déficit de pesquisadores se deve, principalmente, à falta de recursos financeiros nas universidades federais. Neste cenário qualificado, mas pouco diversificado em termos de linhas de pesquisa, destaco a excelência do esforço desenvolvido pela Professora Elba Pinto da Silva Bonn com a qual trabalhei e pude confirmar minha boa impressão sobre a formação e atualização do corpo docente da universidade. Em 2005, nós trabalhamos juntos em estudo sobre “Enzimas Industriais e Especiais”, destinado ao MDIC/CGEE, trabalho que abrangeu a visão geral sobre o segmento no país, importação e exportação, perfil de empresas comerciais, prospecção do consumo no país e no mercado internacional. 

Até aqui falamos do passado e de uma história de conquistas brasileiras, tanto na esfera pública como na esfera privada. Agora, começamos a abordar o futuro. Já que tão recentemente participou de estudo destinado a avaliar o mercado industrial de enzimas, gostaria de conhecer sua opinião sobre biotecnologia. De fato temos condições de liderar processos em tecnologias tão de ponta?

Esse estudo a que me referi, obviamente, apresenta conclusões e recomendações sobre o tema. Trata-se de um trabalho bem extenso e profundo sobre o assunto, ainda muito atual. A principal conclusão é que o governo deveria investir em grande escala no desenvolvimento de enzimas, porque o Brasil é grande importador de enzimas. Recentemente houve uma reunião que em parte versou sobre este assunto e nós da Abifina tivemos a oportunidade de defender esse ponto de vista. Acho que eu e Elba influímos positivamente para uma reflexão sobre o assunto, mas que ainda não chegou ao lugar de importância que gostaríamos. O que se produz de enzimas no Brasil é uma parcela muito pequena do total necessário e do que precisaremos em um futuro próximo para garantir competitividade e soberania. Além disso, o Brasil tem enorme potencial para ser um importante exportador de enzimas. No entanto, há uma série de pesquisas em desenvolvimento no mundo sobre enzimas que o Brasil não acompanha. Nosso trabalho foi apresentado ao MIDIC na gestão anterior à atual, dois volumes com mais de 300 páginas, que não despertaram ainda o interesse que esperávamos. Mas continuaremos atentos sobre a matéria que, sem dúvida, precisa evoluir para acompanhar os avanços mundiais e os novos desafios impostos pela biotecnologia que, afinal, parece estar entre as prioridades do atual governo. A Elba fez um importante levantamento sobre o que o Brasil importa e reexporta, porque há uma exportação de enzimas importadas, que resulta na falsa impressão de que há uma forte produção local. Na verdade, há uma produção externa que entra no país e, parte dessa produção, é exportada pelas companhias estrangeiras que dominam o setor no país. Apenas uma pequena parcela é produzida para fins locais. Procuramos, portanto, chamar a atenção do MDIC para o fato de que é preciso achar mecanismos de incentivo à produção local.

CONTEXTO HISTÓRICO

De lama preta a ouro verde e amarelo

A história do petróleo no Brasil começou em 1858, quando o Marquês de Olinda concedeu a José de Barros Pimentel o direito de extrair betume em terrenos situados nas margens do rio Marau, na Bahia.

Em 1930, depois de vários poços perfurados sem sucesso em alguns estados brasileiros, o engenheiro agrônomo Manoel Inácio Bastos tomou conhecimento que os moradores de Lobato, na Bahia, usavam uma “lama preta”, oleosa, para iluminar suas residências. A partir desta informação, realizou várias pesquisas e coletas de amostras da lama oleosa, contudo não obteve êxito em chamar a atenção de pessoas influentes para tal fato. No entanto, Manoel Inácio Bastos não desistiu e, no ano de 1932, foi recebido pelo presidente Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro. Na ocasião, o engenheiro agrônomo entregou ao presidente da Republica um relatório sobre a presença da substância em Lobato, despertando neste momento talvez o interesse de Getúlio por um dos legados mais expressivos que deixou para o país: a empresa estatal de exploração de petróleo. 

Durante a década de 30, a questão da nacionalização dos recursos do subsolo era pauta das principais discussões nacionais indicando uma tendência que viria a ser adotada. Em 1938, toda a atividade petrolífera passou, por lei, a ser obrigatoriamente realizada por brasileiros. Ainda nesse ano, em 29 de abril de 1938, foi criado o Conselho Nacional do Petróleo (CNP), para avaliar os pedidos de pesquisa e lavra de jazidas de petróleo. O decreto que instituiu o CNP também declarou de utilidade pública o abastecimento nacional de petróleo e regulou as atividades de importação, exportação, transporte, distribuição e comércio de petróleo e derivados e o funcionamento da indústria do refino. Mesmo ainda não identificadas e localizadas, as jazidas passaram a ser patrimônio da União. A criação do CNP marca o início de uma nova fase da história do petróleo no Brasil. Incorporado ao Ministério das Minas e Energia, o CNP foi a primeira iniciativa para estruturar e regulamentar a exploração de petróleo no Brasil.

O contexto era a uma disputa entre posições nacionalistas e empresários interessados na exploração do petróleo no país. Na verdade, o CNP dá origem à política nacionalista que culminaria com a futura instalação do monopólio estatal no setor. Em 1939, Oscar Cordeiro e Manoel Inácio Bastos, sob a jurisdição do CNP, descobrem a primeira jazida de petróleo na cidade de Lobato, estado da Bahia. Apesar do seu baixo valor comercial, a descoberta serviu de incentivo para que o CNP continuasse nas suas pesquisas. Em 1941, uma das perfurações dá origem ao campo de Candeias, o primeiro a produzir petróleo no Brasil. Nessa época, paralelamente, iniciava-se, em Cubatão, a fase pré-operacional da Refinaria de Petróleo Presidente Bernardes, visando, numa primeira etapa, processar diariamente 45 mil barris de petróleo importado.

Após as descobertas na Bahia, as perfurações prosseguiam em pequena escala, até que, em 3 de outubro de 1953, depois de uma intensa campanha popular, o presidente Getúlio Vargas assinou a Lei 2004, que instituiu o monopólio estatal da pesquisa e lavra, refino e transporte do petróleo e seus derivados e criou a Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras. Nesse momento, o CNP passa a recém criada Petrobras todo o seu acervo técnico, ficando responsável apenas pela tarefa de fiscalizar o setor petrolífero. No ano de 1963, o monopólio foi ampliado, abrangendo também as atividades de importação e exportação de petróleo e seus derivados.

Kurt Politzer
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