REVISTA FACTO
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Jan-Fev 2008 • ANO II • ISSN 2623-1177
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//Artigo

A integração da química

Uma visão de entidades empresariais sobre a integração da química de base com a química fina – oportunidades que poderiam ser oferecidas à indústria de química fina nacional pela futura Refinaria Petroquímica de Itaguaí.

Luiz Guedes, presidente da ABIFINA.

A refinaria petroquímica de Itaguaí certamente poderá criar excelentes oportunidades para indústrias agroquímicas e fármacos. Como fármacos consomem pequeno volume de intermediários químicos – embora de alto valor estratégico, na verdade o grande cliente de um empreendimento como o de Itaguaí seria o setor agroquímico, por consumir grandes volumes de matérias-primas dessa origem. Uma expressiva parceria entre os entes públicos e privados poderia se dar a partir da determinação das demandas do mercado agroquímico e das empresas que se concentram hoje no Brasil com unidades de formulação nessa área visando não somente intermediários químicos – produtos técnicos por elas demandados, mas também solventes com especificações especiais que consomem em elevados volumes. Essa parceria deveria começar a ser buscada com a determinação de possíveis demandas e, também, pelo esforço de pesquisa e desenvolvimento que seria requerido.

A Petrobras nos últimos anos tem estado muito voltada para a área de energia, mas agora há uma retomada de interesse pelo setor químico, a partir da refinaria petroquímica. Poder-se-ia, então, discutir a oportunidade desse projeto abrigar algumas unidades de processo para atender a demandas de empresas instaladas no Brasil. A partir da avaliação dessas demandas, a Petrobras poderia ter um projeto para atender à química fina, obviamente aliando especificações técnicas de produtos, qualidade, prazos de entregas e preços.

Hoje o mercado doméstico é abastecido, basicamente, pela China – nossos grandes fornecedores com imensas vantagens competitivas em termos de custo. Porém, num determinado momento no futuro o empresário chinês vai deixar de ser tão competitivo devido ao movimento internacional irreversível para levá-lo a regulamentar questões sanitárias, ambientais e trabalhistas no país. O chinês vai ter que, mais cedo ou mais tarde, contemplar custos industriais que ele não tem hoje. O custo ambiental, a mão-de-obra sem qualquer sistema de segurança, e outras questões desse tipo que oneram a produção com padrão internacional de qualidade. Mão-de-obra nem é o maior problema para a competitividade da química fina com os chineses, pois o setor industrial tem alta densidade tecnológica e emprega pouca gente. As questões ambientais, sim, são importantes no custo final dos produtos. O mundo hoje está exigindo qualificação e então as indústrias chinesas, para vender para o Brasil, vão ter que estar cada vez mais qualificadas. Isso certamente vai acontecer tão logo o Brasil comece a fazer fiscalizações sanitárias lá fora, que hoje não acontecem e que criam uma situação de concorrência desigual. Hoje nós já temos no Brasil empresas que fabricam produtos que já competem com o produto chinês em preços colocados em terceiros mercados. Em mercados regulados, empresas brasileiras competem com o produto chinês e ganham. Nossos produtos são fabricados segundo práticas muito rigorosas, sendo competitivos em preço sempre que comparados em igualdade de condições.

A fiscalização ambiental no Brasil é muito rigorosa. Uma empresa para obter uma licença ambiental tem que passar por um processo demorado e é necessário atualizar constantemente as certificações, qualquer ampliação de planta é demorada e, mesmo assim, nós temos produtos competitivos. O chinês, que apresenta hoje algumas vantagens imediatas relacionadas a preços, em médio prazo deve perder essa posição confortável. Então devemos nos preparar para mantermo-nos competitivos em relação a terceiros mercados, assegurando localmente a oferta de matérias-primas indispensáveis para a produção de intermediários químicos, solventes, produtos técnicos etc. Não se pretende que ela vá abastecer integralmente o mercado local, mas sim atender a demandas estratégicas de produtos – de grande volume e disponibilidades de acesso limitadas, ainda que temporárias, onde a garantia do abastecimento seja crucial.

Deve-se partir de uma análise da pauta de importações, aliada a consultas objetivas ao setor industrial brasileiro para que eles informem quais seriam os intermediários químicos de seu interesse para que a Petrobras colocasse na sua pauta de desenvolvimento – evidentemente sob acordo de sigilo, empresa por empresa, para estudar a possibilidade de produzir tais produtos no Brasil. As indústrias que produzem conhecem o processo de síntese, ou parte dele, podendo ajudar a Petrobras com seu know-how. O importante de momento é que ocorra uma decisão da Petrobras no sentido de focar o negócio visando sua importância estratégica para o país.

Já foi feito um estudo preliminar pela Petroquisa que buscou identificar oportunidades, o qual deverá ser aprofundado com maior audiência e participação do setor privado. Assim como a Petrobras prioriza a busca de novas alternativas de energia, seja no gás, seja no petróleo, em parcerias mundiais, faz sentido também fazer isso na área de matérias-primas para a indústria da química fina. Além de farmoquímicos e agroquímicos, que são o foco maior da atuação da ABIFINA, poderiam ser buscados outros setores industriais que poderiam se interessar em parcerias com a Petrobras.

Uma questão primordial seria o desenvolvimento tecnológico, mas para tanto hoje já temos empresas bem qualificadas na produção e pesquisa, com competência para ajudar nesse desenvolvimento.

O segmento agroquímico é importador de grande volume de produtos finais e intermediários. Ter fornecedores locais leva a algumas vantagens, como não sofrer ameaça cambial, garantir uma logística facilitada e outros. Isso porque o mercado agroquímico sofre com paralisações temporárias nos portos, seja de fiscais agropecuários, seja de fiscais sanitários e, assim, poder-se-ia fazer uma programação que adequasse melhor as necessidades financeiras com as necessidades de produtos. Hoje, fazemos compras grandes para deixar um bom nível de armazenagem no Brasil porque somos obrigados a estocar e despender capital de giro. Isso é uma questão que não pode ser ignorada frente ao potencial agrícola do país. Imagine-se que uma empresa de defensivos agrícolas sofra uma crise de abastecimento: conseqüências que poderiam comprometer toda uma safra agrícola. Um problema portuário que não permita o abastecimento do mercado é algo muito sério. No ano passado tivemos alguns problemas de atendimento que, se não chegaram a ser muito graves, foi porque as empresas tinham antecipado em suas compras e o mercado estava muito bom. Mas precisamos estar atentos, porque são fatos que podem causar danos irreparáveis.

A Petrobras não pode ver isso apenas do ponto de vista do negócio, mas olhar como um investimento estratégico para desenvolver o Brasil. Já que a Petrobras desenvolve tantas ações como decisão de governo, ela deveria analisar esta perspectiva de fomentar e fortalecer a indústria da química fina nacional, assegurando ao Brasil a liderança no agronegócio internacional via competência industrial e domínio tecnológico, ou seja, segurança de uma cadeia produtiva atuante mesmo face às crises internacionais.

A Petrobras poderia, à jusante da sua refinaria petroquímica de Itaguaí, projetar uma planta dedicada à química fina, em unidades de processos que permitissem o desenvolvimento e a fabricação de produtos do interesse de empresas no Brasil. Ela poderia colocar no seu foco de negócios defender o mercado local para justificar os investimentos necessários nessa linha. O BNDES já demonstrou interesse em participar e fortalecer a chamada cadeia de negócios do setor de química. É uma idéia muito útil, válida e bem recebida pelo segmento industrial privado. Se a Petrobras tomar a iniciativa de se tornar uma liderança proativa na convocação do segmento empresarial para esta discussão, eu tenho certeza de que o setor vai responder afirmativamente à convocação.

Seria um fato novo e relevante que daria à Petrobras uma liderança expressiva diante desse mundo tão conturbado do petróleo. É só se ver como está o balanço comercial brasileiro, gerando um superávit de mais de R$ 40 bilhões/ano em função do agronegócio. A questão central é a Petrobras tomar uma decisão de gestão colocando esse assunto na pauta de negócios como algo importante, ela se voltar à área química visando o abastecimento do mercado interno, com demandas bem definidas. Não precisa ser 100%, nunca vai atingir isso, mas que seja uma demonstração de que está disposta a participar desse esforço industrial e para gerar o desenvolvimento de algumas demandas bem específicas e estratégicas para o país. Atuando nessa área, a Petrobras também terá condições de mudar a crítica situação em que se encontra a indústria farmoquímica no país, segmento com valor estratégico para o desenvolvimento econômico e social do Brasil.

Fernando Sandroni, presidente do Conselho de Tecnologia da Firjan.

É bastante claro que se a Petrobras fizer a refinaria petroquímica em Itaguaí, as oportunidades aparecem de uma forma muito nítida para todo o país, e de forma particular para o Estado do Rio de Janeiro pela criação de empresas, desenvolvimento da indústria petroquímica e, também, da indústria de refino. Mas também haverá benefícios pelas matérias-primas para a química fina que poderão ser oferecidas e a oportunidade de transformá-las em desenvolvimentos ligados ao empreendimento.

Deve ser ressaltado que articular o desenvolvimento de uma cadeia produtiva para a química fina não é algo óbvio. O empreendimento da forma como foi idealizado pela Petrobras visa ser uma refinaria, cujo investimento é mais focado em energia e combustíveis líquidos. Há o craqueamento de óleo pesado do qual resultam matérias-primas petroquímicas que ainda estão distantes do que é necessário para uma cadeia química para medicamentos e agroquímicos, além de outros segmentos que poderiam também ser beneficiados.

Tudo começa com a vontade política de se fazer o que não é um movimento trivial, visto que exige uma compreensão muito técnica e comercial das condições do mercado internacional. Não é um empreendimento que deva ser feito visando exclusivamente o mercado brasileiro. Deve haver uma articulação para se conhecer outros mercados, as vocações brasileiras e as oportunidades. A partir deste conhecimento é que seria possível extrair, então, o que chamamos de fábricas dos intermediários de síntese – que é um termo cunhado para se designar o que os americanos chamam de building blocks – blocos de onde saem outras fabricações que vão permitir a síntese de produtos para vários mercados, com maior relevância para a indústria farmoquímica, uma das principais demandadoras dessa matéria-prima. Aqui existe uma grande e real oportunidade no mercado brasileiro, que é razoavelmente grande e maduro. Mas se trata de um mercado que está concentrado em poucas empresas no mundo – sofreu um processo de concentração nos últimos 20 anos, o que lhe dá uma característica especial. Sem essa compreensão, fica difícil encontrarmos uma abordagem competitiva. É necessário, portanto, ter clareza de propósitos, baseada na definição política da Petrobras sobre a necessidade de executar esta ação junto com a iniciativa privada, encarando como uma abordagem estratégica com soluções de mercado, de forma a tornar o Brasil realmente competitivo nesta área. Quero dizer visão estratégica de mercado e de produção competitiva internacionalmente.

É preciso, também, ter a compreensão de que os mercados da Índia e da China se lançaram nessa área com algumas “facilidades” que o Brasil não têm hoje. Por exemplo, se a indústria química asiática é poluidora, os governantes não se importam. Já no Brasil, já há uma legislação ambiental forte, que leva à necessidade de um investimento mais alto. Deve haver , então, um entendimento maior não apenas do governo federal e da Petrobras, também um posicionamento de Estado Nacional. Determinadas condições de contorno desfavoráveis precisam ser superadas de alguma forma. O que os chineses e indianos fizeram? Decidiram permitir a poluição até certo limite para crescer, para depois cuidar da ecologia. Primeiro, eles decidiram produzir. Para o Brasil, essa política não serve mais, já estamos em um estágio maduro de desenvolvimento econômico-industrial. A verdade é que a indústria européia deslocou para a China todas as produções químicas altamente poluidoras, mas nós temos que encontrar uma outra abordagem, este caminho não nos serve mais para nós. A refinaria pode criar uma real oportunidade, mas esse programa terá que ser montado com uma equipe completamente diferente daquela dedicada ao projeto principal. Precisa haver um projeto especial. É uma oportunidade que está aí e que a Petrobras deveria chamar para si. Mas não é trivial e ela não poderia fazer isso sozinha. Deve ocorrer uma articulação bem costurada com a iniciativa privada. Não tenho a menor dúvida que a refinaria cria um fato favorável. É importante entender, então, as condições de mercado no cenário internacional que, apesar de desfavorável de uma maneira geral, apresentam oportunidades relevantes porque o mercado cresceu muito nos últimos anos. Existe demanda por qualidade e o Brasil pode produzir com qualidade sem agredir ao meio ambiente. Nossa indústria está madura para exportar com determinados padrões que alguns países exigem. Agora é importante lembrar que o produto final da refinaria está dentro do escopo de trabalho da Petrobras, nisso ela é especialista . Para avançar em novas oportunidades, a Petrobras precisaria reunir pessoal e empresários que entendam do assunto, se organizando e preparando seus quadros para enfrentar esse empreendimento.

A Firjan entende essa questão pelo ponto de vista mais amplo e entende a refinaria como uma grande oportunidade de negócios para o Rio de Janeiro. O empreendimento vai obviamente gerar empregos, renda e desenvolvimento – somente para ilustrar como as perspectivas são animadoras, lembro que o Pólo Petroquímico de Camaçari, por exemplo, quando foi contruído rapidamente passou a representar 30% dos impostos que o Estado recolhia.

Já a segunda vertente, da indústria de química fina, constitui uma grande necessidade e uma grande oportunidade para o país. Eu evitaria falar em soberania porque este discurso é muito questionado, as pessoas não entendem bem o que é e muitas vezes julgam um valor ultrapassado frente ao mundo globalizado. Como estamos vivendo o ideal do mercado global, não adianta insistir porque este tipo de argumento não vai atingir o objetivo de trazer simpatia à causa. Agora, que se trata de uma questão de soberania, não tenho dúvida. Vários países já fizeram este caminho. O melhor exemplo talvez seja francês. No passado recente, o capital alemão, através da Bolsa de Valores, assumiu o controle acionário de uma grande empresa farmacêutica francesa. Em uma semana, o governo francês fez aprovar uma lei para inviabilizar o negócio. Em seguida, a França instruiu a empresa estatal de petróleo Elf-Aquitaine para agir, pois a soberania do país estava sendo atacada. Os tempos são diferentes, mas o problema é o mesmo. É claro que há nuances históricas e, naquela época, esta atitude era permitida. Também ninguém espera que a Petrobrás se transforme em uma indústria farmacêutica. Ela não é do ramo, mas pode auxiliar e isso pode ser feito de forma mais sutil.

O que eu gostaria de ressaltar, falando diretamente do projeto original da refinaria, é que nada disso vai dar certo se o governo do estado não fizer a parte dele. Um empreendimento dessa natureza exigirá uma enorme quantidade de trabalhadores de todas as áreas. O ambiente da cidade, portanto, precisa ser preparado para receber essas pessoas. Caso contrário, haverá uma significativa proliferação de favelas. A parte de infra-estrutura precisa ser garantida pelo governo do estado, com eficiência e compreensão, porque a região hoje não é boa do ponto de vista do desenvolvimento humano. Se de repente um contingente de trabalhadores for recrutado para atender a nova demanda local e a região não tiver uma programação urbanística para absorver isso, pode haver milhares de famílias se instalando sem suporte. Já que há um tempo para esse empreendimento se instalar, que este prazo sirva ao planejamento devido também sob este aspecto a meu ver prioritário.

Isaac Plachta, presidente do Siquirj – Sindicato da Indústria de Produtos Químicos para Fins Industriais do Estado do RJ.

A instalação da refinaria petroquímica no Rio de Janeiro é um marco extremamente importante para o estado e vale destacar que hoje há um relacionamento muito positivo entre as secretarias do estado do Rio de Janeiro e as entidades sindicais e associações, como Firjan, ABIFINA e Siquirj, o que faz com que se facilitem os canais de comunicação. Para ilustrar lembro reunião do dia 22 de janeiro com o secretário Júlio Bueno na qual temas relevantes, como a interação da química fina com a refinaria foram tratados.

A Refinaria Petroquímica de Itaguaí significa, em relação à química fina, a possibilidade de se discutir uma efetiva medida de política industrial para o setor de química fina no Rio de Janeiro, que decorre da aproximação entre dirigentes do estado e de entidades empresariais com o devotado interesse de fazer crescer o nosso estado – que como se sabe abriga a operação de várias indústrias farmacêuticas. A química fina precisa ter uma fonte de matérias-primas, que pode se encontrar em disponibilidade em produtos provenientes de refinarias. A nova refinaria tem, por trás dela, um fator técnico relevante que é o processamento do petróleo pesado, favorecendo o conceito de refinaria petroquímica, cujo objetivo é produzir matérias-primas para a petroquímica – eteno, propeno, e butadieno, não sendo seu foco a produção de matérias-primas para a química fina. Mas com estudo e criatividade pode-se identificar os nichos de oportunidade nesse sentido. O fato político relevante é que a instalação da nova refinaria abre uma janela para se discutir uma efetiva possibilidade para a implantação da política nacional para a química fina. Então, é preciso que alguém abrace essa bandeira – é o que a ABIFINA está, inteligentemente, fazendo ao promover debates como este. É insustentável continuarmos importando fármacos e defensivos em grandes volumes, como ocorre atualmente, sem termos um planejamento de ação efetivo para a química fina. E a situação se agravará porque tais importações tenderão a aumentar muito já que o agronegócio – principal consumidor dos produtos importados – é um dos pilares de sustentação do crescimento da economia brasileira. Vale ressaltar que isso significa uma fragilidade estratégica para o país, pois depender totalmente do exterior para se abastecer de certos produtos da química fina – essenciais para se promover o suprimento de alimentos e remédios para a população – não parece muito inteligente.

Outro aspecto a destacar, associado à importação de defensivos e fármacos, é que a Anvisa é rígida no controle das indústrias brasileiras – nacionais e multinacionais – fiscaliza e toma conta da produção nacional como deve ser, mas em contrapartida os produtos importados entram no país sem que ninguém saiba onde foram fabricados – o lote vem de uma única fábrica ou de várias instalações? Ninguém sabe como são fabricados e com quais níveis de controles de qualidade. A importação é favorecida, ainda que involuntariamente, pelas autoridades brasileiras que controlam nosso processo produtivo, mas não defendem o consumidor brasileiro dos produtos importados de qualidade duvidosa. Neste contexto, precisam aparecer novas bandeiras, tipo buy Brazilian products, ou seja, comprem produtos brasileiros. É evidente que a produção nacional tem que ser competitiva, não é para se produzir de qualquer jeito, a qualquer preço – repetindo as falhas dos importados – é preciso que haja competitividade em qualidade e preço, confiabilidade no fornecimento etc. Entretanto, é urgente colocar em condição de igualdade os importados e a produção nacional – adotando critérios equânimes. Também é necessário equanimidade fiscal. Se aqui se paga uma carga tributária alta e lá na China ou em outros países o empresário ganha prêmios para exportar, então fica inviável fomentar a química fina brasileira. Entretanto se, em condições de igualdade, o nosso produto não tiver qualidade e preço competitivos, aí sim, somos a favor de importar. Mas o cenário atual não é esse e as autoridades responsáveis têm que tomar medidas para mudar esta situação.

Também merece atenção governamental a questão da salvaguarda comercial na fase inicial de colocação de um produto no mercado. É natural que o produtor busque alguma proteção no período em faz aportes em novas instalações. È muito correto e natural pedir salvaguarda quando se faz investimentos de porte.
O projeto da refinaria com uma central petroquímica produzindo – através sistema catalítico específico – eteno, propeno e aromáticos, além de outras correntes de hidrocarbonetos, encontra potenciais nichos de mercado a serem explorados na química fina.

Para o fortalecimento da química fina no país, o que a ABIFINA almeja em nome do empresariado nacional do setor é que a Petrobras lidere esse processo, agregue empresários privados, busque o suporte do BNDES, e, evidentemente, conte com o apoio efetivo das diversas agências e órgãos de governo. Trata-se de um grande desafio, mas é um magnífico projeto. O Siquirj apóia firmemente essa proposta de que o governo participe dessa iniciativa, investindo na nova refinaria do ERJ e disponibilizando recursos, através da Petrobras, para a implantação da unidade industrial de processos para a química fina.

Além disso, é necessário examinar como chineses e indianos competem no mercado externo – como conseguem ter matérias-primas e produtos finais com preços tão competitivos. Lá fora os governos dão subsídios e uma série de vantagens para que eles exportem. Além disso, a qualidade dos produtos chineses vem sendo muito questionada, embora venham melhorando porque os empresários têm sido pressionados em relação a aspectos ambientais. Então, eles começam a ter preocupações semelhantes às nossas, que elevarão seus custos para atender requisitos de primeiro mundo, aos quais eles terão forçosamente que se adaptar.

Independente de a refinaria criar oportunidades, de estabelecer ambiente favorável para a instalação de uma cadeia produtiva sustentada para farmoquímicos e produtos técnicos para agroquímica, ainda é necessário dar segurança aos empresários que investem no Brasil, por que senão ninguém entra nessa aposta. Ninguém investe para perder – o empresário pensa dez vezes antes de correr o risco. Eu tenho a minha empresa, a IQT – lá existe uma área de farmoquímicos que é pequena, mas ela se paga e dá algum retorno. O Rio de Janeiro tem a Nortec e há outras empresas significativas para o país em São Paulo e no Rio Grande do Sul. Mas sem a segurança de medidas efetivas de uma política específica para o setor, este projeto não decola. Essa é a razão pela qual a química fina, no Brasil, está restrita a um pequeno grupo de empresários. Por outro lado, temos, por exemplo, Farmanguinhos hoje dando um tremendo apoio aos produtores de farmoquímicos instalados no Brasil. O instituto está fazendo uma coisa muito inteligente que é a compra de serviços. Eu tenho uma admiração enorme pelo Eduardo Costa, porque ele busca todas as formas alternativas para garantir a produção nacional.

O empresário brasileiro vai responder ao chamado da Petrobras para discutir outros objetivos para a refinaria de forma similar ao que ocorreu na implantação da petroquímica brasileira, na década de 60, quando ninguém acreditava que era possível realizar o que de fato foi feito. Por que isso ocorreu? Porque o governo participou decisivamente do processo via reserva de mercado, financiamento e em tudo mais que foi necessário à implantação da petroquímica brasileira. E é esse tipo de pensamento que tem que prevalecer também na química fina. O governo precisa adotar efetivas medidas de política industrial para o setor, que apóiem a captação de recursos, financiem o capital de giro, auxiliem na formação e treinamento de pessoal, que ofereçam salvaguardas nos períodos iniciais de produção, etc. O empresário não quer privilégios, ele quer a garantia de que terá apoio para ser competitivo. O exemplo da petroquímica está aí e é um estímulo. Nos momentos difíceis, os empresários perdem, em outros ganham. É assim que se fortalece um país. No nosso caso, o mais importante é que o país tem um patrimônio industrial petroquímico robusto operando e potencializando o crescimento econômico. Cria-se um ciclo virtuoso, a economia cresce, o empresário reinveste, e a economia cresce ainda mais. Na indústria de capital intensivo em ativos fixos ou em recursos humanos – como petroquímica e química fina – o empresário tem que reinvestir para sobreviver. Para tanto, o BNDES tem que apoiar, a Finep também. Enfim, o governo tem que fazer a sua parte.

Uma sugestão: garantir a isonomia entre os importados e a produção nacional, seria um bom começo, que pode ser executado no curto prazo. Mas somente o somatório de diversas ações trará resultados efetivos para a química fina, semelhantes aos que já ocorreram na petroquímica brasileira.

Analisando, hoje, as importações brasileiras de produtos químicos, a soma dos montantes relativos ao setor farmacêutico e ao de defensivos agrícolas é de 5,3 bilhões de dólares. Esses dois itens representam uma saída de divisas muito maior do que a relativa à importação de fertilizantes. Importamos princípios ativos para defensivos e os formulados utilizados na agricultura, os princípios ativos para a área farmacêutica e mais os medicamentos acabados. São cinco bilhões de dólares nessas importações. As autoridades têm que fomentar a implantação de indústrias para atenuar a situação insustentável. Com as perspectivas de crescimento da economia brasileira, ainda que somente baseadas na demanda interna – porque o comércio exterior pode ter um fraco desempenho nos próximos dois anos – o volume das importações aumentará, e, repito com ênfase, trata-se de uma fragilidade estratégica nacional depender exclusivamente do suprimento externo dos princípios ativos requeridos para atender às necessidades básicas de alimentos e de medicação para a população.

No caso da refinaria, quem lidera o negócio é a Petrobras e se ela pode sair dos 3,5 bilhões para 8,5 bilhões de dólares, pode também aportar mais um pouco para algumas unidades de processo visando atender demandas da química fina. Estamos precisando de uma política consistente, com medidas sólidas para fomentar a química fina. Esta é a discussão que, inteligentemente, a ABIFINA está provocando. O Brasil achou uma solução para o petróleo pesado que, ao invés de ser exportado barato, será transformado em matéria-prima nobre – o eteno, para suprir à petroquímica. É uma iniciativa extremamente louvável, é uma idéia genial. Sinceramente espero que a refinaria petroquímica da Petrobras também aponte um caminho para a química fina nacional.

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